A Cidade é Nossa com Raquel Rolnik #42: Adeus, Tobogã do Pacaembu

Nesta semana, começou a ser demolido o Tobogã, uma parte do Estádio do Pacaembu, espaço carregado de memória na cidade. Sua demolição viabilizará a construção de um edifício de 5 andares a ser explorado pela concessionária que ganhou o estádio por 35 anos. Infelizmente, a rentabilidade econômica, e não os valores de uso da cidade, tem fundamentado esta e outras boiadas urbanísticas. É sobre isso que fala o episódio 42 do “A Cidade é Nossa”, produzido por Raquel Rolnik e Mara Matos, da equipe do LabCidade. Para ouvi-lo na sua plataforma de podcast favorita acesse: spotifyapple podcastsgoogle podcasts e overcast.

Liminar impede demolição dos edifícios São Vito e Mercúrio no centro de São Paulo

No final da semana passada, foi anunciado pela imprensa que a demolição dos edifícios São Vito e Mercúrio, no centro de São Paulo, foi impedida pela Justiça através de uma liminar. O argumento utilizado pelo juiz Valter Alexandre Mena é de que a demolição para construção de uma praça e um estacionamento descaracteriza os objetivos da desapropriação dos edifícios pela prefeitura, que eram a implantação de programa habitacional e a revitalização do centro.

Para saber mais, leia o texto que publiquei ano passado sobre este assunto.

Abaixo segue o texto da liminar:

Vistos. A DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, o CENTRO GASPAR GARCIA DE DIREITOS HUMANOS e o INSTITUTO POLIS INSTITUTO DE ESTUDOS, FORMAÇÃO E ASSESSORIA EM POLÍTICAS SOCIAIS ajuizaram a presente ação civil, objetivando sustar a demolição dos Edifícios SÃO VITO e MERCÚRIO, situados na avenida do Estado, ns. 3.179 e 3.163, região do Parque Dom Pedro II, e a anulação da Concorrência Pública nº 013/08/SIURB, instituída com aquela finalidade. Sustentam que referidos edifícios foram desapropriados pela ré por interesse social revitalização do Centro e implantação de programa habitacional, e a demolição caracteriza desvio de finalidade, além de se antecipar ao planejamento urbano, inexistente, precedido de audiência pública. Pediu liminar. Determinada a oitiva da ré sobre o pedido de liminar, informou que a licitação foi anulada pela administração, desaparecendo o interesse de agir dos autores (fls. 63). Os autores insistem no prosseguimento, porque a licitação não foi anulada, mas somente a fase de qualificação dos concorrentes (fls. 88 e 131). Responde a ré que o pedido era apenas de anulação da concorrência, que foi anulada (fls. 138). O Ministério Público opinou pela concessão da liminar (fls. 141/144) É o relatório. Decido. Acolho a bem lançada manifestação da Dra. Joiese F.T. Buffulin Salles, 5ª Promotora de Justiça de Habitação e Urbanismo. Quanto ao pedido, veja-se a orientação do C. Superior Tribunal de Justiça, referido por Theotonio Negrão e outros na Nota 12.a ao artigo 282 do C.P.C. (CPCLPV, 42ª edição): “O pedido é o que se pretende com a instauração da demanda e se extrai da interpretação lógico-sistemática da petição inicial, sendo de levar-se em conta os requerimentos feitos em seu corpo e não só queles constantes em capítulo especial ou sob a rubrica “dos pedidos” (cf. RESP 233.446/RJ, Rel. Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO EIXEIRA, DJ de 07.05.2001). Inocorrência, na espécie, de julgamento extra petita. (AgRg no Ag 594865 / RS (2004/0042628-2), Relator Ministro FERNANDO GONÇALVES, 4ª T., j. 21/10/2004 Evidente que a pretensão posta na inicial é a não-demolição dos edifícios, sendo a licitação mero instrumento para concretizá-la. Também não ocorreu a perda superveniente do interesse de agir. O ato administrativo que declarou prejudicada a concorrência 13/08 não fez cessar a ameaça de demolição, mas apenas a diferiu no tempo, tanto que determinada a abertura de novo certame (fls. 133). Tal ato foi praticado em fevereiro de 2010, depois, portanto, da notificação da ré (24/7/2009), o que poderia até caracterizar fraude processual: extinta esta demanda, outra precisaria ser ajuizada em face de nova licitação com o mesmo objeto. Em face dos fortes argumentos postos na inicial, defiro a liminar, para impedir a demolição dos referidos edifícios. Cite-se para contestar. II A renúncia do patrono (fls. 108) não depende de homologação e deve ser manifestada ao cliente e comprovada em Juízo. Intime-se e oficie-se.

Não será fácil derrubar o São Vito e o Mercúrio

A prefeitura de São Paulo anunciou na semana passada que os edifícios São Vito e Mercúrio, no centro de São Paulo, serão demolidos ainda neste ano. Inclusive divulgou o nome da empresa responsável pela demolição, ArcoEnge, e o custo: 9 milhões e 200 mil reais.

Mas há o risco dessa promessa não sair do papel.

Na gestão da ex-prefeita Marta Suplicy, houve um debate sobre se era melhor demolir o São Vito ou reformá-lo. Acabou prevalecendo a ideia da reforma, e um projeto foi elaborado. Nesse momento, a prefeitura nem ia mexer no Mercúrio.

Na época foi editado um decreto de desapropriação do São Vito, para que ele passasse a ser de propriedade da prefeitura. Porém quando é feita a desapropriação de um imóvel, deve ser declarada a razão pública, e a razão para justificar a desapropriação do São Vito foi produzir habitação de interesse social. A desapropriação demorou a sair, mas foi concluída.

E o que aconteceu? Quando terminou a gestão da Marta e começou a do Serra/Kassab, a prefeitura desistiu de reformar o São Vito e decidiu demoli-lo. E como o São Vito é vizinho do Mercúrio, resolveram demolir também o Mercúrio junto, para fazer uma praça e um estacionamento perto do Mercadão.

O Mercúrio estava em boas condições, não tinha porque ser demolido. As famílias resistiram, conseguiram estender esse prazo, mas acabaram retiradas. Agora a prefeitura concluiu a licitação para contratar a demolição.

Entretanto, a Defensoria Pública de São Paulo, junto com outras entidades, moveu uma ação civil contra a demolição, por duas razões:

1) O Plano Diretor de São Paulo define que aquela é uma Zona Especial de Interesse Social, ou seja, deve se destinada para habitação popular.

2) A desapropriação foi feita com o objetivo de produzir habitação popular. Então, por mais que os edifícios sejam demolidos, isso deve acontecer para construir habitação popular, não para fazer um estacionamento.
Essa história vai render ainda. Não será fácil demoli-los para fazer um estacionamento.

História lamentável

Havia mais de 700 moradias habitadas no São Vito e no Mercúrio. Isso quer dizer que, em termos de pessoas, havia muito mais gente envolvida.

A situação do São Vito era bastante precária, ele requeria uma reforma imediata de qualquer forma. Já o Mercúrio não, era um prédio com uma condição bastante adequada, tranqüila, bem mantido. Mas foi muito dilapidado durante todo esse processo.

Os dois podem continuar parados, vazios, sem cumprir nenhuma função na cidade, o que é absolutamente lamentável. Aliás, a história inteira é lamentável.

O São Vito já poderia estar reformado e revitalizado, em vez de ficar ali, virando um enorme esqueleto na cidade, sem nenhuma função.

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