A Cidade é Nossa com Raquel Rolnik #42: Adeus, Tobogã do Pacaembu

Nesta semana, começou a ser demolido o Tobogã, uma parte do Estádio do Pacaembu, espaço carregado de memória na cidade. Sua demolição viabilizará a construção de um edifício de 5 andares a ser explorado pela concessionária que ganhou o estádio por 35 anos. Infelizmente, a rentabilidade econômica, e não os valores de uso da cidade, tem fundamentado esta e outras boiadas urbanísticas. É sobre isso que fala o episódio 42 do “A Cidade é Nossa”, produzido por Raquel Rolnik e Mara Matos, da equipe do LabCidade. Para ouvi-lo na sua plataforma de podcast favorita acesse: spotifyapple podcastsgoogle podcasts e overcast.

A Cidade É Nossa com Raquel Rolnik #41: Lá vem a boiada urbanística

Em plena pandemia, algumas cidades decidiram que é urgente fazer a revisão de seus planos diretores. Definir mudanças na regulação urbanística da cidade, em meio a um cenário de tanta incerteza, definitivamente não é a melhor ideia. Além disso, há preocupações maiores para serem encaradas no presente, como a situação emergencial de moradia, comida e renda. É preciso dizer não à boiada urbanística, que aproveitando a impossibilidade da discussão presencial exclui parte da sociedade do processo de discussão necessário para revisão dos planos diretores. Vamos fazer esse debate somente quando for a hora!

Esse é o tema do episódio 41 do “A Cidade é Nossa”, produzido por Raquel Rolnik e Mara Matos, da equipe do LabCidade. Para ouvi-lo na sua plataforma de podcast favorita acesse: spotifyapple podcastsgoogle podcasts e overcast.

A Cidade é Nossa com Raquel Rolnik #40: É preciso suspender despejos e remoções

Hoje (08/06), o Senado iria votar o Projeto de Lei 827/20, que estabelece a suspensão das remoções e desocupações durante a pandemia. Por pressão da bancada ruralista, a votação foi adiada para a próxima semana, com uma audiência pública sobre o tema na sexta (11/06). Em meio à alta dos aluguéis e a queda da renda por conta da crise sanitária e econômica, muitas famílias têm perdido a sua moradia, desemparadas pela falta de políticas públicas — tendo como alternativa morar na rua ou em ocupações. Aprovar o PL 827 é uma medida humanitária, emergencial e de extrema importância. É sobre isso que fala o episódio 40 do “A Cidade é Nossa”, produzido por Raquel Rolnik e Amanda Mazzei, da equipe do LabCidade. Para ouvi-lo na sua plataforma de podcast favorita acesse: spotifyapple podcastsgoogle podcasts e overcast.

A Cidade é Nossa com Raquel Rolnik #36: Medidas da fase emergencial não amenizam risco no transporte

Na fase emergencial do Plano São Paulo, que passa a valer hoje (15/03), faltam medidas concretas para proteger a população na circulação através do transporte coletivo. O escalonamento de horário dos trabalhadores e a não redução das frotas de ônibus pelas prefeituras são ações “recomendadas”, sem obrigatoriedade ou qualquer apoio por parte governo estadual à sua adoção. É sobre isso que fala o episódio 36 do “A Cidade é Nossa”, produzido por Raquel Rolnik e Amanda Mazzei, da equipe do LabCidade. Para ouvi-lo na sua plataforma de podcast favorita acesse: spotifyapple podcastsgoogle podcasts e overcast.

A Cidade é Nossa com Raquel Rolnik #35: Por uma Praça Pôr do Sol sem grades

A Praça Pôr do Sol, no Alto de Pinheiros, é um mirante para uma das mais belas paisagens do entardecer na cidade, encravada em um bairro exclusivamente residencial. Exatamente por esta qualidade a praça atrai gente de toda a cidade (e até mesmo de fora dela), gerando um conflito com (parte) dos moradores locais que tentam há vários anos murar o local para restringir o acesso. Na pandemia, sob o pretexto de evitar aglomerações, a praça está sendo cercada! Um movimento anticercamento luta para impedir mais um monumento ao urbanismo excludente. É sobre isso que fala o episódio 35 do “A Cidade é Nossa”, produzido por Raquel Rolnik e Amanda Mazzei, da equipe do LabCidade. Para ouvi-lo na sua plataforma de podcast favorita acesse: spotifyapple podcastsgoogle podcasts e overcast.

Sobre o movimento contra o cercamento da Praça:

A Cidade é Nossa com Raquel Rolnik #30: Dia Mundial do Urbanismo – Marina Vive

Neste 8 de novembro, Dia Mundial do Urbanismo, a morte de Marina Harkot nos mobiliza para lutar por um modelo de cidade que proteja a vida. É sobre isso que fala o episódio 30 do “A Cidade é Nossa”, produzido por Raquel Rolnik e Amanda Mazzei, da equipe do LabCidade. Para ouvi-lo na sua plataforma de podcast favorita acesse: spotifyapple podcastsgoogle podcasts e overcast

A Cidade é Nossa com Raquel Rolnik #28: Pegadinhas do mercado imobiliário

Em um vídeo recente, Atila Iamarino discutiu a origem do boom de varandas gourmet na cidade de São Paulo. Mais importante do que o Plano Diretor de 2002 para a existência dessa e de outras características das formas de morar na capital, como os condomínios com áreas de lazer, foi a Fórmula de Adiron, adotada desde 1972 e em vigor até 2014. O mercado imobiliário encontra formas de burlar as restrições da lei e inventar produtos que se transformam em objetos de desejo e valorização. É sobre isso que fala o episódio 28 do “A Cidade é Nossa”, produzido por Raquel Rolnik e Amanda Mazzei, da equipe do LabCidade. Para ouvi-lo na sua plataforma de podcast favorita acesse: spotifyapple podcastsgoogle podcasts e overcast.

A Cidade é Nossa com Raquel Rolnik #27: Cracolândia tem solução!

Bombas, destruição, estigmatização e violência têm sido a tônica das políticas públicas para a “Cracolândia”. As problemáticas que permeiam a região são complexas e o tripé repressão/destruição/remoção fracassou em transformar a área. Propostas responsáveis e humanizadas podem de fato melhorar a qualidade de vida de quem mora ou transita pela Luz/Campos Elíseos. É sobre isso que fala o episódio 27 do “A Cidade é Nossa”, produzido por Raquel Rolnik e Amanda Mazzei, da equipe do LabCidade. Para ouvi-lo na sua plataforma de podcast favorita acesse: spotify, apple podcasts, google podcasts e overcast

Luz para os Campos Elíseos” é a proposta-manifesto elaborada pelo Fórum Aberto Mundaréu da Luz – uma articulação de instituições, grupos de pesquisa, coletivos e população que vive nessa região – . O documento evidencia o fracasso das políticas vigentes e elenca propostas para esses territórios. Veja também o documento “Campos Elíseos Vivo”, projeto de intervenção urbanística e social.

A Cidade é Nossa com Raquel Rolnik #25: Conheça a São Paulo rural e orgânica

Você sabia que um terço da cidade de São Paulo é composto por área rural? A São Paulo rural tem terras indígenas, produção de orgânicos, turismo, cultura e belezas naturais. A recém-lançada plataforma Sampa+Rural agrega estas e outras informações, como contatos de distribuidores de alimentos orgânicos, mapeamento de mercados e feiras orgânicas, hortas urbanas, pomares, serviços para agricultura, associações e cooperativas, iniciativas da sociedade civil, políticas públicas, pesquisas e locais turísticos da São Paulo rural.  É sobre isso que fala o episódio 25 do A Cidade é Nossa, produzido por Raquel Rolnik e Amanda Mazzei, da equipe do LabCidade. Para ouvi-lo na sua plataforma de podcast favorita acesse: spotifyapple podcastsgoogle podcasts e overcast.

Plataforma Sampa+Rural: https://cutt.ly/8fKqpDQ
Projeto Ligue os Pontos: https://cutt.ly/zfKqoVd

A Cidade é Nossa com Raquel Rolnik #1: Chuvas e Enchentes

Até agora, são 69 mortos só na região metropolitana de Belo Horizonte. Ontem, foi a vez de São Paulo. Depois das fortes chuvas, a cidade parou em importantes vias da cidade, como as marginais dos rios Pinheiros e Tietê. Pior que isso, famílias da periferia estão desabrigadas, em razão de estragos nas suas residências decorrentes de deslizamentos. Insistimos que o problema não é a precipitação, e sim a organização urbana precipitada, que desfavorece os mais vulneráveis. Em um panorama de mudanças climáticas, esses chamados desastres tendem a se agravar.



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Sessenta candidatos contra violação de direitos nas remoções forçadas

Mais de 60 candidatos e candidatas à Presidência da República, Senado, Câmara dos Deputados e Assembleias Legislativas de 10 estados do Brasil já assinaram a carta-compromisso para proteger  indivíduos e famílias contra as remoções forçadas. O documento foi elaborado  pela Rede contra Remoções, um coletivo de movimentos e instituições que defendem o direito à moradia.

Desde que foi lançada, há duas semanas, a carta-compromisso já conta com a adesão de candidatos e candidatas de oito partidos (26 do PSOL,  24 do PT, 4 do PCdoB, 2 da REDE, 1 do  PSB, 1 do  PSDB, 1 do PDT, 1 do PPL), e embora mais da metade (36) sejam de São Paulo, onde a iniciativa teve início, hoje já engajam candidatos e candidatas das seguintes unidades federativas: Bahia, Pernambuco, Minas Gerais, Santa Catarina, Distrito Federal, Espírito Santo, Paraná, Piaui, Rio de Janeiro e Goiás.

Mônica Bento/ Folhapress

O tema das remoções forçadas tem pouca visibilidade, a não ser quando em função da violência ou de situações trágicas, como foram os casos do Pinheirinho, em São José dos Campos, ou da Cracolândia, em São Paulo. Este ano, com o desabamento do edifício Wilton Paes de Almeida, no Largo do Paissandu, região central da capital, se tornaram conhecidas as histórias de algumas das famílias que estavam no prédio porque haviam sido removidas à força de favelas ou ocupações, revelando trajetórias habitacionais que são basicamente perambular entre ocupações e alugueis precários.

 De acordo com levantamento realizado pelo Observatório de Remoções, só em São Paulo e região do ABC, entre 2010 e 2016 quase 300 mil famiíias foram removidas ou ameaçadas de remoção. Além disso desde 2017, na capital paulista, outras 14 mil famílias foram forçadas a sair de suas casas, sem que uma alternativa de moradia tenha sido oferecida.

Parte das remoções são decorrentes de obras públicas, que quase nunca incluem, no próprio projeto da obra, uma solução habitacional definitiva para as famílias e indivíduos atingidos. Resultado: estas  acabam recebendo um atendimento provisório, quando recebem, geralmente insuficiente para cobrir os custos de moradia em condições adequadas. Em situações de reintegração de posse, promovidas por particulares ou pelo poder público, nem os juízes consideram  a situação e destino dos atingidos ao proferir sua sentença, nem o governo oferece qualquer tipo de proteção, apesar do direito à moradia ser um direito constitucional e sua proteção uma obrigação das várias instituições do Estado.

Dentre os compromissos constantes da carta-compromisso, estão os de evitar ao máximo as remoções, o que absolutamente não acontece hoje. Pelo contrário: muitas obras públicas são projetadas para literamente passar em cima de áreas ocupadas por assentamentos populares, já que isto barateia – quando não elimina! – os custos de desapropriação. Muitas vezes algumas remoções são inevitáveis. Neste caso é fundamental que se apresente proposta de atendimento definitivo de moradia para essas famílias e que estas propostas sejam discutidas e acordadas com os atingidos.

É fundamental que os atingidos participem ativamente da definição de um atendimento que atenda as suas necessidades específicas. E este é um outro problema hoje, porque não temos nas prefeituras, governos estaduais e federal, um leque de possibilidades de atendimento habitacional definitivo.

O que se oferece – e quando se oferece – é a compra da casa própria via hipotecário, solução  inadequada para as familias extremamente pobres e vulneráveis, que são justamente as maiores vítimas das remoções. Estas, além de não se adequadrem no perfil do financiamento, raramente encontram soluções para compra próxima a seus lugares originais de moradia, que também são os lugares aonde encontram suas condiçoes de sobrevivência.

Outros compromissos que constam do documento são evitar o uso da violência, criar espaços de mediação, garantindo acesso à justiça e condições de igualdade nos processos judiciais.

Quem assinou a carta-compromisso

(até 28 de agosto de 2018)

PRESIDÊNCIA        

Guilherme Boulos – PSOL

SENADO

São Paulo
Daniel Cara – PSOL
Eduardo Suplicy – PT
Jilmar Tatto – PT
Silva Ferraro – PSOL

Pernambuco
Eugênia Lima – PSOL

GOVERNO ESTADUAL     

Bahia
Marcos Mendes – PSOL

São Paulo
LiseteArelaro – PSOL

DEPUTADA(O) FEDERAL 

Bahia
Hamilton Assis – PSOL
Kenno Ferreira – PSOL
Neto (Paulo Moraes Neto) – PSOL
Paulo Ribeiro – PSOL
Silvio Humberto – PSB

Espírito Santo
Ines Simon – PT

Minas Gerais
Padre João – PT

Pernambuco
Ivan Moraes Filho – PSOL

Piauí
Neide de Jesus Carvalho – PT

Rio de Janeiro
Marcelo Freixo – PSOL

Santa Catarina
Lino Peres – PT

São Paulo
Alencar Santana Braga – PT
Douglas Belchior – PSOL
Duda Alcantara – REDE
Ivan Valente – PSOL
José De Filippi Júnior – PT
Juliana Cardoso – PT
Luiza Erundina – PSOL
Mandado Cidadanista (Célio Turino) – PSOL
Maria Ap Marques de Simoni – PT
Marinalva Brito – PT
Nilto Ignácio Tatto – PT
Paulo Teixeira – PT
Rui Falcão – PT
Samia Bonfim -PSOL
Silvio Cabral (Mandato Coletivo) – PSOL

DEPUTADA(O) ESTADUAL

Bahia
Aladilce Souza – PC do B
Hilton Coelho – PSOL
Jhonatas Monteiro – PSOL
Marcelino Galo – PT
Maria del Carmen – PT
Professor Euvaldo – PSOL

Distrito Federal
Alinne de Souza Marques – PPL

Goiás
Dra. Cristina – PSDB

Minas Gerais
Leleco Pimentel – PT

Paraná
Goura – PDT

São Paulo
Adriano Diogo – PT
Anita de Gusmão Damião – PSOL
Carina Vitral Costa – PCdoB
Erica Maluguinho- PSOL
Juninho – PSOL
Leci Brandão – PCdoB
Lucas Landin – PSOL
Luiz Turco – PT
Marcia Lia – PT
Maria da Penha Souza – PT
Marina Helou- REDE
Rebuliço Barba – PT
Renato Simoes – PT
Simão Pedro – PT
Toninho Vespoli – PSOL
Vanderlei Siraque – PCdoB

Íntegra da carta-compromisso

Às candidatas e aos candidatos à presidência da república, ao senado, à câmara dos deputados, aos governos estaduais e às assembleias legislativas nas eleições de 2018.

CONSIDERANDO QUE:

  1. O desabamento do edifício Wilton Paes de Almeida, no Largo do Paissandu, em São Paulo, no dia 1º de maio de 2018, escancarou a situação de emergência habitacional;
  2. Verifica-se uma ofensiva no sentido da criminalização dos movimentos de moradia;
  3. Outras tragédias envolvendo incêndios, remoções com uso de violência e outras violações de direitos já haviam ocorrido antes do desabamento, caracterizando as remoções e os despejos como um problema histórico e sistemático em todo o país;
  4. As famílias que se encontravam no edifício que desabou haviam sido submetidas anteriormente a processos de remoções e despejos;
  5. Entre 2010 e 2016, ao menos 288 mil famílias foram removidas ou ameaçadas de remoção apenas em São Paulo e no ABC Paulista, sendo que 81% dessas remoções ocorreram motivadas por obras públicas;
  6. Somente entre janeiro de 2017 e abril de 2018, ao menos 14 mil famílias foram removidas de suas casas na Região Metropolitana de São Paulo e outras 30 mil estão ameaçadas de remoção sem perspectiva de atendimento habitacional definitivo. Sendo, nesse período, 75% das remoções causadas por processos de reintegração de posse;
  7. Tornam-se cada vez mais recorrentes os casos de famílias que já passaram por mais de uma remoção, evidenciando a situação de insegurança permanente vivida pelas famílias mais vulneráveis.

ASSUMO, perante a população brasileira, caso seja eleita(o), o compromisso de trabalhar em defesa do direito constitucional à moradia digna cumprindo as normas internacionais que regem a matéria e especialmente defender as seguintes propostas referentes aos casos de ameaças de remoção:

  1. Não promover projetos públicos, ou em parceria com a iniciativa privada, que promovam remoções;
  2. Apresentar proposta de atendimento habitacional definitivo junto com o projeto de intervenção que apresentar necessidade de remoção, garantindo a participação das comunidades atingidas e o amplo acesso à informação, respeitando os modos de vida e as especificidades de cada contexto;
  3. Assegurar o atendimento habitacional definitivo para todas as famílias, no caso de inevitabilidade de remoção; e quando a justificativa da remoção for a segurança das famílias, que o atendimento habitacional seja feito de acordo com as necessidades e capacidade de pagamento dos atingidos;
  4. Garantir que o atendimento habitacional provisório só aconteça no caso de remoções de populações em risco emergencial. Em quaisquer outros casos o atendimento deve ser sempre definitivo. Caso não haja o atendimento definitivo no momento da remoção, garantir moradia digna até o atendimento definitivo;
  5. Atender as necessidades habitacionais independente da origem das pessoas nessas situações;
  6. Priorizar as famílias que já moram em áreas sujeitas a intervenções, reformas ou projetos que visam suas transformações futuras;
  7. Garantir a construção de contra laudos nos casos de áreas de risco e o atendimento definitivo aos moradores em áreas de proteção de mananciais;
  8. Nunca usar a violência, respeitando em todos os casos a dignidade do ser humano;
  9. Incorporar o princípio da equidade no atendimento habitacional, tratando cada caso de forma a respeitar suas especificidades;
  10. Atenção e atendimento prioritário a mulheres, crianças e pessoas com deficiência;
  11. No caso de remoção, comunicar obrigatoriamente aos conselhos municipais de habitação, da criança do adolescente e dos idosos;
  12. Assegurar acesso à assistência jurídica e à assistência técnica em habitação de interesse social gratuitas para todas as pessoas e famílias atingidas;
  13. Assegurar mecanismos de controle e de acesso à terra e à moradia bem localizada e com infraestrutura para famílias de baixa renda, destinando imóveis ociosos à moradia popular para que, enfim, cumpram sua Função Social;
  14. Atuar de forma que sejam constituídas instâncias de tratamento dos conflitos fundiários urbanos e rurais no âmbito dos poderes executivo, legislativo e judiciário, garantindo que as partes estejam no mesmo pé de igualdade nas negociações e que o direito coletivo prevaleça sobre o direito individual, respeitando os princípios da não remoção e da promoção da segurança da posse;
  15. Dialogar permanentemente com as diferentes instâncias e órgãos do poder público, em especial o sistema judiciário (Defensoria, Ministério Público) de modo a tratar de forma adequada as situações de conflito fundiário, assumindo a responsabilidade de evitar as remoções;
  16. Garantir o acesso universal aos serviços públicos essenciais: água potável, saneamento, energia elétrica, saúde, educação, cultura, lazer, entre outros;
  17. Assegurar a instalação de infraestrutura, equipamentos e serviços públicos, mesmo em áreas sob disputa judicial, como garantia de defesa da vida, saúde e da segurança das famílias;
  18. Dialogar com os movimentos sociais de moradia e acesso à terra, encontrando soluções em conjunto com esses atores. Não criminalizar a luta por moradia digna;
  19. Assegurar políticas de regularização fundiária e segurança habitacional para as populações vulneráveis (favelas, assentamentos precários e outros).

São Paulo, 15 de agosto de 2018

“Cracolândia”: dois erros graves e uma solução possível

Crédito: Danilo Verpa/Folhapress

Crédito: Danilo Verpa/Folhapress

 

(este texto foi o primeiro publicado na minha coluna “A Cidade é Nossa” no UOL)

Há exatamente um ano, a Prefeitura de São Paulo, em conjunto com a Polícia Militar do Estado, realizou uma ação violenta em um conjunto de quarteirões do bairro dos Campos Elísios, onde então se localizava um cenário de consumo e venda de drogas a céu aberto denominado pela imprensa, desde o final dos anos 1990, de “Cracolândia”. Coordenada pelo Grupo de Operações Especiais da Polícia Civil, sob as ordens do governador Geraldo Alckmin, a investida teve início, na manhã do domingo 21 de maio, com a dispersão de pessoas por meio de tiros de bala de borracha e bombas de gás lacrimogêneo e continuou nos dias seguintes.

A Prefeitura participou ativamente desta ação, não apenas com a mobilização da Guarda Civil Metropolitana, dispersando agrupamentos de pessoas, mas também através de uma ação liderada pela Subprefeitura da Sé, que interditou, lacrou e, inclusive, demoliu imóveis residenciais e comerciais, alegando que estes serviam de abrigo a traficantes e outros criminosos alegando irregularidades sanitárias ou administrativas, como falta de alvarás de funcionamento. Há exatamente um ano, imediatamente após esta incursão, o então prefeito João Dória declarava à imprensa que “a cracolândia acabou”.

Não foi a primeira vez que estas cenas aconteceram naquele território. Desde meados dos anos 1990, quando se reconheceu a penetração do consumo de crack na cidade e sua concentração em uma região entre a Santa Efigênia e os Campos Elísios, que incursões deste tipo se repetem: em 1999, uma grande operação do Departamento de Investigações sobre Narcóticos (Denarc), sob as ordens do então governador Mario Covas, efetuou inúmeras prisões na região; em 2005, durante a gestão do então prefeito José Serra, a “Operação Limpa Cracolândia” dispersou os usuários que se concentravam no entorno da antiga Estação da Luz, fazendo que estes se transferissem para a região dos Campos Elíseos. Ao longo de 2012, durante a gestão Kassab, a “Operação Sufoco” reprimia diariamente, de forma violenta, o chamado “fluxo”, com a intenção de impedir sua permanência nas ruas.

Longe de “acabar com a cracolândia”, estas ações apenas deslocaram a presença/permanência do “fluxo”, deixando um rastro de destruição humana e material pelo caminho. Qualquer um que passe por esta região da cidade hoje pode comprovar este fato. Aliás, o relato que apresento até aqui já foi inúmeras vezes reproduzido, inclusive pela imprensa. O que podemos acrescentar a esta história para entendê-la melhor? Não é necessário ser especialista em urbanismo ou política social para se indignar com o que se vê nas ruas desta região. Mas é possível enfrentar o enorme desafio de transformar este cenário?

Em primeiro lugar, é preciso reconhecer que este já conhecido relato sobre a “cracolândia” está incompleto e, por isso, esconde mais do que revela. Esconde, por exemplo, que o consumo e venda de crack, que hoje nomeia de forma simbólica um dos bairros mais antigos de São Paulo, é apenas uma entre as múltiplas vulnerabilidades sociais presentes na região. De acordo com levantamento feito pelo próprio governo do estado, entre os indivíduos presentes no “fluxo”, a dependência química do álcool (droga legalizada) é quase tão grande quanto a do crack, e, além disso, neste grupo há várias pessoas que não são consumidoras de drogas.

Aliás, a característica de entrar e sair da dependência, assim como de entrar e sair de serviços socioeducativos mentais ou penais, marca a trajetória de um vasto grupo de pessoas denominado pela professora Vera Telles de “refugiados urbanos”. São homens e mulheres, vítimas das mais diversas formas de violência, descuidado e desamor, que encontram nas ruas – desta e, cada vez mais, de outras regiões da capital –, e entre pares, formas possíveis de sobrevivência que incluem, por vezes, a prostituição e o varejo de drogas.

O erro, neste caso é tratar deste lugar na perspectiva da “guerra às drogas”, modelo a partir do qual têm sido pensadas e articuladas as estratégias de intervenção no local, que não apenas vítima e torna ainda mais vulneráveis indivíduos com trajetórias marcadas pela humilhação e repressão, como também se mostra totalmente ineficaz para “fazer desaparecer” este cenário.

Em segundo lugar, sistematicamente, as estratégias repressivas baseadas em intervenção policial têm sido sempre acompanhadas de destruição física/material dos lugares de moradia e comércio existentes na região. As políticas e ações que mencionamos anteriormente foram sempre acompanhadas pela ideia de que aquela é uma região “esvaziada” que precisa ser “revitalizada”. Assim, projetos para a área anunciam a chegada de equipamentos culturais – como foi a Sala São Paulo – e, mais recentemente, de parcerias público-privadas para ali instalar hospitais e moradias voltadas para grupos capazes de arcar com custos de financiamento bancário e condominiais.

Se é verdade que parte da dinâmica urbanística presente na região sofreu primeiro com a decadência do transporte por trem e, posteriormente, com a saída do terminal rodoviário, a ideia de uma “região vazia” esconde a presença de uma população moradora de pensões, hotéis e apartamentos, muitas vezes em condições precárias, e que mantém uma rede de comércios e serviços em pleno funcionamento e dela sobrevive.

O próprio Plano Diretor da cidade reconhece este cenário ao estabelecer nesta região várias Zonas Especiais de Interesse Social. As sucessivas intervenções urbanísticas na região têm destruído estes espaços, removido estas populações e provocado, na marra, um esvaziamento que, por sua vez, transforma cada vez mais este lugar em ruína, atraindo arruinados. Gravíssimo é, portanto, o erro, cometido nas intervenções urbanas propostas e realizadas desde os anos 1990, de desconsiderar sistematicamente as existências neste lugar.

Finalmente, a pergunta: é possível reverter as vulnerabilidades e precariedades presentes na região? A resposta é: sim. A “cracolândia” de São Paulo não é a primeira nem a única no mundo. A Platzpitz Park, por exemplo, região no entorno da estação central de trem de Zurique, na Suíça, nos anos 1990 concentrava milhares de usuários de heroína. A combinação de estratégias de redução de danos com sistemas de acolhimento social – como o que foi iniciado pelo “Programa Braços Abertos” da Prefeitura na gestão Haddad,e que necessitaria ainda ser aperfeiçoado e ampliado mas foi interrompido na atual gestão –, articulada com programas fortes de acesso à moradia existentes desde o início do século passado na cidade, foi capaz de transformar a situação.

Não se trata aqui de propor que copiemos nenhum programa. O que é necessário é, simplesmente, desenhar uma política que leve em consideração quem, porque e em que condições está presente naquele lugar, de modo que seja possível apresentar, em diálogo com estes indivíduos e grupos, uma alternativa consistente e duradoura. A rede de coletivos culturais, ONGs e grupos atuantes nos campos da saúde mental e da política de drogas, bem como laboratórios de arquitetura e urbanismo que têm atuado coletivamente na região, formulou uma proposta chamada “Campos Elísios Vivo” que vai nesta direção. Por que não ouvi-la?

Para saber mais: 
::. Proposta Campos Elíseos Vivo em: https://mundareudaluz.org/

::. Estudo em torno da Cracolândia Paulista

::. Doria: A Cracolândia acabou

Campos Elíseos Vivo: um projeto coletivo para o centro de São Paulo

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Apresentação do projeto Campos Elíseos Vivo, pelo Fórum Aberto Mundaréu da Luz (Foto: Camila Almeida)

Uma das primeiras ações do prefeito João Doria, ao assumir a prefeitura de São Paulo, foi declarar que a Cracolândia, como é conhecida a área em que há concentração de usuários de crack e outras drogas na região da Luz, tinha acabado. A afirmação veio logo após uma série de ações policiais extremamente violentas contra as pessoas, que, na prática, dispersaram o chamado “fluxo” na direção das ruas do entorno, mas de jeito nenhum acabaram com ele.

Dizer que acabou com a Cracolândia é claramente uma jogada com apelo político, que foi combinada com uma intervenção urbanística com projetos como as Parcerias Público-Privadas de Habitação e do Hospital Pérola Byington. Essas últimas ações combinadas de órgãos da prefeitura e do governo do Estado de São Paulo arrebentaram, desapropriaram e demoliram casas, com expulsão de moradores e com a produção, evidentemente, de mais pessoas sem-teto e de uma situação de ainda maior vulnerabilidade nessa região.

Mas as pessoas atingidas, assim como um conjunto muito grande de entidades no campo da saúde mental, da assistência social, do urbanismo e da cultura, que já estavam atuando no território e se relacionando com as pessoas que moram e usam o local, começaram a se articular para montar uma alternativa de intervenção para essa área. A ideia foi propor uma possibilidade de melhoria das condições de vida no bairro, de forma que ele não fique como está, mas que a transformação seja feita de forma a respeitar profundamente quem mora lá.

O projeto Campos Elíseos Vivo, que é como se denominou a iniciativa desse coletivo chamado Fórum Aberto Mundaréu da Luz, formado em maio do ano passado quando ocorreram ações muito violentas no bairro, procura atender às necessidades da região, de seus moradores atuais e dos comerciantes que atuam no bairro.

Utilizando apenas os terrenos e imóveis vazios ou subutilizados que já foram notificados pelo poder público, e lançando mão de instrumentos que constam no próprio Plano Diretor Estratégico de São Paulo, é possível construir moradia para mais de 3.000 famílias — número mais do que suficiente para atender às famílias do bairro e para atrair novos moradores para a região central da cidade.

O projeto prevê que, com as novas unidades, é possível oferecer uma diversidade de formas de morar, para atender as mais diversas composições e situações domiciliares, com programas de locação social, locação temporária, moradia terapêutica e casa própria. Além disso, está proposto um conjunto de outras ações e intervenções, como acompanhamento para usuários de drogas, espaços de convivência para a comunidade e outros equipamentos públicos necessários, como parquinhos para as crianças e banheiros públicos.

É possível transformar respeitando as pessoas e o patrimônio material e imaterial do bairro, que é um dos mais antigos da cidade de São Paulo, e que não merece ser destruído em nome de uma guerra às drogas que, ao criminalizar todos e todas que vivem ou estão ali, é incapaz de lidar com a complexidade da região.

Para quem quiser conhecer melhor o projeto: mundareudaluz.org 

O Campos Elíseos Vivo foi tema da minha coluna semanal na Rádio USP. Você pode ouvir aqui.

A mudança da Ceagesp é mesmo necessária?

Por Pedro Mendonça * e Raquel Rolnik**

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O futuro do edifício da Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais do Estado de São Paulo (Ceagesp) na Vila Leopoldina, na zona oeste, está em discussão. Só neste semestre, a agenda oficial do prefeito João Doria teve 13 eventos relacionados à companhia, dos quais o último registrou o interesse na substituição do edifício por um centro internacional de tecnologia. Mas afinal, a desativação da Ceagesp é mesmo benéfica para a cidade?

O argumento central dos que defendem o deslocamento do entreposto da Vila Leopoldina para as margens da Rodovia Bandeirantes, em Perus, é o impacto no tráfego. Segundo este argumento, a atual localização é inadequada para a movimentação de caminhões, que chegariam de longe e depois têm de percorrer longas distâncias para entrar e sair da Ceagesp. Entretanto, com os dados da Pesquisa Origem Destino de Cargas (OD Cargas), organizada pela CET para dimensionar as movimentações de mercadorias com origem ou destino no município, publicada em agosto deste ano, podemos demonstrar que esta narrativa não se sustenta. Pelo contrário, o deslocamento para Perus (e não a permanência na Vila Leopoldina) é que trará impacto muito maior no tráfego.

Comparação tamanhos

Mapa 1: Recortes em mesma escala com entorno do atual entreposto da Ceagesp e do empreendimento logístico da NESP. Dados: CET, Emplasa, Gestão Urbana. Elaboração: ObservaSP.

Operação imobiliária

O desejo de finalizar as atividades da Ceagesp na Vila Leopoldina foi expresso na gestão do ex-prefeito Fernando Haddad, através da nova Lei de Uso e Ocupação do Solo (nº 16.402/2016). Na lei se vinculava a desativação do entreposto naquele bairro à construção de um novo centro de armazenagem e distribuição. De acordo com o artigo 154, um parceiro privado poderia explorar o terreno da Vila Leopoldina sem pagar outorga onerosa em troca de sua participação nos custos de transferência da Ceagesp, firmando uma parceria público-privada. Para que isso acontecesse, a prefeitura deveria aprovar um Projeto de Intervenção Urbana (PIU) regulando os parâmetros urbanísticos para as duas  áreas.

Estabelecimentos alimenticios v2

Mapa 2: Concentração de estabelecimentos de serviços e varejo de alimentos com até 19 empregados. Dados: Centro de Estudos da Metrópole, RAIS 2016. Elaboração: observaSP

Em 2016, a empresa  Novo Entreposto de São Paulo S/A (NESP), através de Manifestação de Interesse Privado (MIP),  apresentou uma proposta de  PIU contendo um  empreendimento logístico para  armazenamento e distribuição em  uma Zona de Ocupação Especial (ZOE) em Perus, zona noroeste da cidade, sem mencionar a exploração do outro terreno na Vila Leopoldina. Certamente isso ocorreu porque a Ceagesp, de propriedade do governo federal, não decidiu ainda sobre desativação do seu entreposto e muito menos sobre a destinação do terreno de sua propriedade. O projeto do novo empreendimento logístico foi aprovado e decretado pela prefeitura em dezembro de 2016 (decreto nº 57.569/2016). Com isso, as obras do novo entreposto, em Perus, começarão em breve, assim como a adesão de alguns dos permissionários da atual Ceagesp para o novo empreendimento, mesmo que a desativação e possível destino dos armazéns atuais estejam ainda indefinidos.

Também em 2016, o Instituto Urbem, o Banco Votorantim e as empresas imobiliárias SDI e Jaguar apresentaram, via MIP, um PIU para a vizinhança dos armazéns na Vila Leopoldina. O projeto propõe a exploração imobiliária de antigos imóveis de uso industrial e já passou por um  primeiro processo de consulta pública. Este PIU, em área vizinha ao atual entreposto  ilustra a forte pressão feita pelo mercado imobiliário residencial, em plena expansão na Vila Leopoldina,  para que ocorra a liberação do terreno, seja para incorporação, seja para valorização da vizinhança. Evidentemente, interessa também à empresa NESP que a Ceagesp seja desativada, tornando os atuais permissionários do entreposto uma clientela cativa do novo empreendimento.

E o abastecimento da cidade?

Os dados da pesquisa OD de Cargas mostram a movimentação de cargas que chegam ou saem diariamente do município de São Paulo. Para analisar as movimentações de carga da Ceagesp, foram utilizados dados de movimentação de carga agrícola e alimentícia que saem e entram da Zona OD 26, onde está o  entreposto. Os mapas abaixo representam graficamente esta movimentação.

Entradas ZOD 26_2

Mapa 3: Origem das cargas agrícolas e alimentícias que entram na Zona OD onde está a Ceagesp. Dados: CET. Elaboração: observaSP

Chama a atenção no fluxo que se dirige à área da Ceagesp, ou seja, a quantidade de produtos que chegam lá para serem distribuídos, o enorme peso da região a oeste da metrópole e do Estado. Essas áreas têm acesso fácil à Vila Leopoldina através do Cebolão e suas conexões com as rodovias e marginais.

Porém, mais significativa ainda é a leitura do mapa das viagens originadas na Ceagesp. Estas abastecem principalmente o centro expandido com seus milhares de restaurantes, lanchonetes, mercadinhos, feiras, sacolões, floriculturas e outros varejistas que se abastecem no entreposto, graças a qualidade e preços baixos dos produtos ali oferecidos. Eles  terão que percorrer dezenas de quilômetros para ir a Perus – caso o entreposto realmente se desloque integralmente – ou simplesmente não contarão mais com estes produtos. Além disso, é fácil imaginar que o aumento da distância aumente  os custos de abastecimento para os pequenos estabelecimentos e seus consumidores e também piore o trânsito entre o novo entreposto e os destinos finais das cargas.

Saídas ZOD 26_2

Mapa 3: Destino das  de cargas agrícolas e alimentícias  que saem na Zona OD da Ceagesp. Dados: CET. Elaboração: observaSP

Assim, embora a saída da Ceagesp possa ser um excelente negócio imobiliário para alguns (como a NESP e incorporadoras), é bem discutível seu benefício para a cidade como um todo. Não há dúvida que a Ceagesp merece um projeto de modernização, o que é perfeitamente possível sem que esta tenha que sair um milímetro do lugar.

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Também falei desse assunto na minha coluna na Rádio USP desta quinta-feira (21). Ouça aqui

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Pedro Mendonça é estudante do curso de graduação em Arquitetura e Urbanismo da FAU USP. Pesquisa parcerias público-privadas (PPPs) utilizadas como instrumento de implementação de projetos urbanos, especialmente as PPPs Habitacionais do Estado de São Paulo. Integra a equipe do ObservaSP desde 2015. Lattes

Raquel Rolnik é urbanista, professora de Planejamento Urbano da FAU USP e coordenadora do LabCidade. Titular e livre-docente pela FAU USP e doutora pela New York University, foi coordenadora de urbanismo do Instituto Pólis, diretora de Planejamento Urbano da cidade de São Paulo, secretária de Programas Urbanos do Ministério das Cidades e relatora especial da ONU para o Direito à Moradia Adequada. É autora dos livros “O que é a Cidade”, “A Cidade e a Lei”, “Folha Explica São Paulo” e “Guerra dos Lugares”. Lattes

Compre o Anhembi e leve um pedaço de cidade

Vista aérea do Anhembi no primeiro plano. Sambódromo também faz parte do pacote. Foto: José Cordeiro/ SPTuris

A Câmara Municipal de São Paulo aprovou, na semana passada, o Projeto de Lei 582/2017, que autoriza a Prefeitura a vender ações da SPTuris, empresa municipal responsável pela realização de alguns eventos turísticos na cidade, como o carnaval, e pela gestão de equipamentos como o Complexo do Anhembi. Atualmente, a Prefeitura detém 96% das ações da empresa e, portanto, vendê-las significa  privatizá-la.

De fato, não parece absurdo que a Prefeitura deixe de se ocupar da gestão de um parque de exposições (como é o caso do Anhembi), ainda mais se for verdadeira a informação de que este gera prejuízo aos cofres públicos – embora esteja permanentemente lotado de feiras e eventos. O próprio Projeto de Lei se encarrega também de passar as atribuições relacionadas à política de eventos à secretaria Municipal que tem esta atribuição.

Entretanto, a forma como está sendo proposta esta privatização traz uma série de questões e preocupações.

Para aprovar a nova lei, o Executivo negociou com os vereadores a inserção de vários condicionantes, entre os quais, o que determina que o sambódromo (que faz parte do Complexo Anhembi) deverá ser utilizado de forma gratuita durante 75 dias ao ano para atividades ligadas ao carnaval e a eventos religiosos.

Outro condicionante, incluído por meio de emenda, é o de que 20% da renda obtida com a venda das ações sejam investidos na zona norte da cidade. E um outro, também incluído via emenda, é a garantia de não demissão dos funcionários da SPTuris, que deverão ser reaproveitados em outras empresas municipais. São compreensíveis as razões pelas quais estes condicionantes entraram na lei durante seu processo de aprovação.

Há, entretanto, outro condicionante, incluído no substitutivo aprovado, que determina que o edital de privatização só seja lançado depois que o zoneamento da área mudar.

O Parque Anhembi fica na Marginal Tietê e, além de servir à realização do carnaval, é usado como área de exposições e eventos, atividades que certamente vão continuar ocorrendo por lá. Então, para que mudar o zoneamento?

De acordo com o Plano Diretor aprovado em 2013, aquela área é uma ZOE, zona de ocupoação especial que deve ter seus parâmetros urbanísticos definidos a partir de um projeto específico. Enquanto isso não ocorre, valem os parâmetros da macroárea onde o equipamento está inserido.

Ocorre que na Lei de Zoneamento, aprovada depois do Plano Diretor, já ficaram definidos os parâmetros da área do Anhembi: já foi permitido mudar os coeficientes máximos de aproveitamento (que indicam a quantidade de metros quadrados que podem ser construídos) e foi disponibilizado um estoque de um milhão de metros quadrados adicionais de construção na área. Além disso, foi determinada a obrigatoriedade de manutenção de 20% do seu total como área pública.

Ora, parece que agora as definições do zoneamento estão sendo interpretadas como uma “trava”, ou seja, uma limitação em relação às possiblidades de exploração imobiliária do conjunto de terrenos públicos do Complexo Anhembi, que abriga hoje o pavilhão de exposições, o sambódromo, o estacionamento e o auditório.

Ou seja, o que se está privatizando não é exatamente o parque de exposições e eventos, mas uma enorme área pública com gigantesco potencial imobiliário.

Outro indicador do que constitui de fato o “negócio” do Anhembi é o fato de que, recentemente, o Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (CONPRESP) não aprovou o tombamento do Anhembi – cujo projeto é do arquiteto Jorge Wilhelm, em coautoria com Miguel Juliano, e cujos jardins foram projetados por Roberto Burle Marx –, apesar do parecer técnico favorárel por parte do Departamento de Patrimônio Histórico da Secretaria Municipal de Cultura (DPH).

Elaborado no final da década de 1960 e inaugurado em 1973, o projeto do Parque Anhembi marcou uma série de inovações na arquitetura paulistana, inclusive do ponto de vista construtivo. O pavilhão, uma estrutura metálica tubular que se esgarça na altura de 13 metros, como uma árvore, foi integralmente montado no piso e levantado em 8 horas, evitando a necessidade de construção de caríssimos andaimes.

A decisão política de não tombar o Parque Anhembi, aliada à pressão pelo aumento do potencial construtivo da área, revela no que consiste esta privatização: compre ações da SPTuris e leve de bônus um pedaço valiosíssimo de cidade para explorar.

Também falei sobre esse assunto na minha coluna da semana passada na Rádio USP. Ouça aqui