Liminar suspende projeto Nova Luz até julgamento de ação que contesta aprovação do Plano Urbanístico da Zeis da Santa Ifigênia

Em abril, o plano urbanístico da Zeis da Santa Ifigênia, na região do projeto Nova Luz, foi aprovado sob protestos da sociedade civil. Na época, comentei o ocorrido aqui no blog. Hoje recebi a notícia de que a Ação Civil Pública proposta pela Defensoria Pública com pedido de liminar para a anulação da aprovação do Plano e a paralização do Projeto Nova Luz foi deferida pela Juíza Alexandra Fuchs de Araújo.

De acordo com a decisão da Juíza, “(…) Neste contexto, defiro a liminar para que a ré se abstenha de promover, por si só ou por meio de terceiros, qualquer intervenção urbanística na área objeto do ‘Projeto Nova Luz’, fundada na aprovação do Plano de Urbanização objeto de questionamento, inclusive que se abstenha de publicar eventual edital de concorrência até o julgamento da presente ação, sob pena de multa diária, no valor de R$ 50.000,00”.

Clique aqui para ler o texto completo da decisão.

Leia mais sobre o assunto no blog Apropriação da Luz.

Justiça barra revisão autoritária e tecnocrática do Plano Diretor de São Paulo

Em decisão  de 1ª instância, o juízo da 5ª Vara da Fazenda Pública da capital de São Paulo, Marcos de Lima Porta, acolheu a maior parte dos pedidos das entidades que integram a Frente em Defesa do Plano Diretor Participativo e SUSPENDEU  a revisão autoritária e tecnocrática do Plano Diretor que foi iniciada pela prefeitura.

A ação civil pública foi construída coletivamente em 2008 e proposta pelas seguintes entidades: União dos Movimentos de Moradia, FACESP, Instituto Polis, Centro Gaspar Garcia e Movimento Defenda São Paulo. Também foi apoiada pela Defensoria Pública e contou com a firme atuação do Ministério Público.

Em decisão histórica, o juiz determinou a invalidação do PL municipal de revisão e a realização de efetivo processo de participação popular na tramitação do anteprojeto de lei, considerando que estes não podem ser apenas  rituais formais de cumprimento mínimo de exigências legais, esvaziados de conteúdo e sim se constituir em processos reais de pactuação pública devidamente preparados e instrumentados para esta finalidade.

Clique aqui para baixar o texto da sentença.

E leia abaixo matéria do Jornal da Tarde sobre o assunto:

Juiz anula revisão de Plano Diretor

Tiago Dantas

A Justiça determinou ontem a suspensão do projeto de revisão do Plano Diretor Estratégico da Capital (PDE) e ordenou que a população seja incluída na discussão da lei, que servirá para organizar o crescimento da cidade nos próximos dez anos.

A decisão foi tomada pelo juiz Marcos de Lima Porta, da 5ª Vara da Fazenda Pública, ao julgar uma ação civil pública movida, em 2 de abril de 2008, pelo Instituto Polis e pela União dos Movimentos de Moradia da Grande São Paulo e Interior.

O magistrado questionou a utilidade das quatro audiências públicas organizadas por Prefeitura e Câmara dos Vereadores ano passado – uma em cada região do município. Nas ocasiões, os cidadãos tinham dois minutos para se pronunciar. “Há de se afirmar que dois minutos, de qualquer ângulo que se veja, é período deveras muito curto para que se possa formular uma opinião útil e construtiva”, afirmou Porta, na decisão.

“O juiz foi sábio. Não adianta fazer audiência em linguagem cifrada, em que as pessoas entram mudas e saem caladas e onde não se explica o que está sendo discutido”, opina a arquiteta e urbanista Raquel Rolnik, professora da USP. “O processo de revisão do Plano Diretor foi marcado por atropelos e erros. Deveria ter sido precedido de uma avaliação do plano que está em vigor”, completa.

Com validade até 2012, o atual PDE entrou em vigor em 2002, durante a gestão Marta Suplicy (PT). Na sentença de ontem, o juiz argumenta que alguns instrumentos do PDE ainda nem entraram em vigor, “a exemplo do parcelamento ou utilização compulsório do solo ou edificação, sob pena de IPTU progressivo”.

Relator da minuta de substitutivo ao PDE e líder do governo na Câmara, o vereador José Police Neto (PSDB) afirmou que precisa tomar conhecimento do processo para “discutir o assunto”. “Se precisar fazer as discussões de novo, vamos fazer”, garante Neto. Segundo ele, foram feitas reuniões em 31 subprefeituras, além das quatro audiências públicas citadas pelo juiz Porta. A transcrição das reuniões está no site da Câmara.

A revisão do PDE estava prevista para ser votada na Câmara antes da Copa do Mundo. Em junho, 207 entidades civis assinaram um manifesto contra o projeto. A bancada do PT questionou a divisão da cidade em macroáreas, que determinam quais bairros terão mais prédios e em quais deles a urbanização será freada.

Fonte: Jornal da Tarde.

Liminar impede demolição dos edifícios São Vito e Mercúrio no centro de São Paulo

No final da semana passada, foi anunciado pela imprensa que a demolição dos edifícios São Vito e Mercúrio, no centro de São Paulo, foi impedida pela Justiça através de uma liminar. O argumento utilizado pelo juiz Valter Alexandre Mena é de que a demolição para construção de uma praça e um estacionamento descaracteriza os objetivos da desapropriação dos edifícios pela prefeitura, que eram a implantação de programa habitacional e a revitalização do centro.

Para saber mais, leia o texto que publiquei ano passado sobre este assunto.

Abaixo segue o texto da liminar:

Vistos. A DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, o CENTRO GASPAR GARCIA DE DIREITOS HUMANOS e o INSTITUTO POLIS INSTITUTO DE ESTUDOS, FORMAÇÃO E ASSESSORIA EM POLÍTICAS SOCIAIS ajuizaram a presente ação civil, objetivando sustar a demolição dos Edifícios SÃO VITO e MERCÚRIO, situados na avenida do Estado, ns. 3.179 e 3.163, região do Parque Dom Pedro II, e a anulação da Concorrência Pública nº 013/08/SIURB, instituída com aquela finalidade. Sustentam que referidos edifícios foram desapropriados pela ré por interesse social revitalização do Centro e implantação de programa habitacional, e a demolição caracteriza desvio de finalidade, além de se antecipar ao planejamento urbano, inexistente, precedido de audiência pública. Pediu liminar. Determinada a oitiva da ré sobre o pedido de liminar, informou que a licitação foi anulada pela administração, desaparecendo o interesse de agir dos autores (fls. 63). Os autores insistem no prosseguimento, porque a licitação não foi anulada, mas somente a fase de qualificação dos concorrentes (fls. 88 e 131). Responde a ré que o pedido era apenas de anulação da concorrência, que foi anulada (fls. 138). O Ministério Público opinou pela concessão da liminar (fls. 141/144) É o relatório. Decido. Acolho a bem lançada manifestação da Dra. Joiese F.T. Buffulin Salles, 5ª Promotora de Justiça de Habitação e Urbanismo. Quanto ao pedido, veja-se a orientação do C. Superior Tribunal de Justiça, referido por Theotonio Negrão e outros na Nota 12.a ao artigo 282 do C.P.C. (CPCLPV, 42ª edição): “O pedido é o que se pretende com a instauração da demanda e se extrai da interpretação lógico-sistemática da petição inicial, sendo de levar-se em conta os requerimentos feitos em seu corpo e não só queles constantes em capítulo especial ou sob a rubrica “dos pedidos” (cf. RESP 233.446/RJ, Rel. Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO EIXEIRA, DJ de 07.05.2001). Inocorrência, na espécie, de julgamento extra petita. (AgRg no Ag 594865 / RS (2004/0042628-2), Relator Ministro FERNANDO GONÇALVES, 4ª T., j. 21/10/2004 Evidente que a pretensão posta na inicial é a não-demolição dos edifícios, sendo a licitação mero instrumento para concretizá-la. Também não ocorreu a perda superveniente do interesse de agir. O ato administrativo que declarou prejudicada a concorrência 13/08 não fez cessar a ameaça de demolição, mas apenas a diferiu no tempo, tanto que determinada a abertura de novo certame (fls. 133). Tal ato foi praticado em fevereiro de 2010, depois, portanto, da notificação da ré (24/7/2009), o que poderia até caracterizar fraude processual: extinta esta demanda, outra precisaria ser ajuizada em face de nova licitação com o mesmo objeto. Em face dos fortes argumentos postos na inicial, defiro a liminar, para impedir a demolição dos referidos edifícios. Cite-se para contestar. II A renúncia do patrono (fls. 108) não depende de homologação e deve ser manifestada ao cliente e comprovada em Juízo. Intime-se e oficie-se.

As barricadas que dividem São Paulo

Reportagem publicada no jornal Brasil de Fato em 19/10/2009, disponível neste link.Protestos expõem insatisfação das periferias em face às diversas formas de violência a que são submetidas

Por Patrícia Benvenuti

O helicóptero sobrevoa e flagra as chamas que tomam conta de pneus, entulhos e até de um ônibus em uma avenida interditada. O estampido dos tiros e das bombas se mistura ao barulho de sirenes histéricas de viaturas. Muito corre-corre. A cena descrita narra mais um confronto entre policiais e moradores em uma favela de São Paulo.

Só neste ano, foram pelo menos dez grandes protestos em diversas regiões de periferia da capital paulista, que resultaram em enfrentamentos com a polícia e um saldo de destruição de casas e pertences familiares, pessoas presas e feridas.

Orquestradas, ou não, para coincidirem com os programas policialescos dos finais de tarde, o fato é que essas manifestações parecem expressar a revolta dos moradores contra as tantas formas de exclusão e violência de que são testemunhas diárias.

O caso de Heliópolis

A manifestação mais recente aconteceu em Heliópolis, na zona sul de São Paulo, a maior favela paulistana, com cerca de 100 mil habitantes. Na noite de 31 de agosto, a estudante Ana Cristina Macedo foi assassinada enquanto voltava do curso supletivo, alvejada por um tiro que partiu de um guarda civil metropolitano de São Caetano do Sul, no ABC paulista, que perseguia um grupo suspeito de roubar um carro.

Baleada no momento em que tentava se esconder atrás do carro, Ana Cristina só foi socorrida pelos guardas civis, segundo os moradores, depois da autorização de um policial militar que chegou ao local. Segundo relatos, os guardas teriam segurado a estudante pelos braços e pernas e jogado seu corpo dentro da viatura. A jovem ainda chegou com vida ao hospital, falecendo em seguida.

Sob gritos de “assassinos”, os moradores atiraram pedras contra policiais e contra o veículo que foi motivo da suposta troca de tiros. Os manifestantes também montaram barricadas com pneus e pedaços de madeira, além de terem incendiado e apedrejado carros e ônibus. Com apoio do Grupo de Operações Especiais (GOE) e do Grupo de Repressão a Roubos e Assaltos (Garra), a polícia lançou bombas de efeito moral e tiros de borracha para conter o protesto.

Intensificação

Para a urbanista e relatora especial da Organização das Nações Unidas para o Direito à Moradia Adequada, Raquel Rolnik, “a intensificação dos confrontos tem a ver, de um lado, com a retomada de investimentos em infraestrutura e urbanização, em grande escala, afetando as comunidades e, por outro, com uma atitude mais truculenta, menos negociadora, por parte da prefeitura e governo do Estado na relação com os moradores”, argumenta.

Opinião semelhante tem o integrante da União dos Movimentos de Moradia (UMM) Benedito Roberto Barbosa, que atribui o aumento dos protestos à interferência agressiva do poder público nas comunidades, atingidas de forma crescente por grandes intervenções urbanas. “As obras chegam e não levam em conta que aí tem uma comunidade”, pontua.

Como exemplo, Barbosa cita o projeto de ampliação da Marginal do Tietê, cujas obras devem remover cinco favelas do entorno, na zona norte. Revoltados, os moradores da Favela do Sapo, localizada na Água Branca, organizaram um protesto contra uma ordem de despejo emitida para 450 famílias e contra a inserção de apenas as cem famílias mais antigas da comunidade em programas habitacionais. Para o restante, foi oferecido apenas o chamado “cheque-despejo”, com valores entre 1,5 mil e 8 mil reais.

A mesma situação foi vivenciada pelos moradores de Paraisópolis, na zona sul, onde dezenas de famílias foram despejadas e tiveram suas casas demolidas para dar espaço a obras de “revitalização” da favela. Sem direito à indenização, foi oferecido o financiamento de um novo imóvel e, para as famílias que não tivessem renda suficiente, um “cheque-despejo” de cinco mil reais, um cômodo em um albergue ou uma passagem de retorno para suas cidades de origem.

Esse tipo de política, para Barbosa, traz consequencias negativas não apenas para os moradores, mas para todo o conjunto da sociedade. “A Prefeitura chega com uma proposta de oferecer uma indenização pífia para as famílias, porque isso nem é indenização, é uma vergonha. Então as pessoas vão morar nas margens dos rios e dos mananciais, aumentando os problemas ambientais da cidade”, explica.

Raquel Rolnik também critica as medidas, que evidenciam falta de vontade política para solucionar as questões habitacionais. “As desapropriações e despejos forçados não resolvem o problema da falta de moradia. O exemplo do ‘cheque-despejo’, da prefeitura de São Paulo, é um caso emblemático no qual o poder público empurra o problema com a barriga, sem desenvolver estratégias adequadas para mitigar suas raízes”, analisa.

Além destes casos, Barbosa alerta para outras obras que devem ser a causa de mais tensionamentos. Uma delas é a construção de um parque linear na zona leste, como compensação ambiental para a ampliação da Marginal do Tietê, que pretende desalojar cerca de 12 mil famílias dos bairros de São Miguel Paulista e Itaim Paulista.

Na zona sul, a construção de um túnel de 4,5 quilômetros que ligará a Avenida Jornalista Roberto Marinho à Rodovia dos Imigrantes será responsável pelo despejo de aproximadamente oito mil famílias. “É um confronto anunciado, vai ter conflito”, prevê Barbosa, que atenta também para a relação entre a força do mercado imobiliário e o discurso repressivo que estigmatiza os moradores. “Como tem amplo apoio do setor imobiliário, a Prefeitura remove as famílias e ainda diz isso, que [quando ocorrem manifestações] todos são bandidos”, completa.

Violência policial

A violência policial sistemática nas comunidades também funciona como um catalisador de tensões nas periferias. Para o coordenador auxiliar do Núcleo Especial de Cidadania e Direitos Humanos da Defensoria Pública do Estado de São Paulo Antonio Maffezoli Leite, os conflitos são o resultado final do descontentamento da população de áreas pobres com o tratamento recebido pelas forças de segurança do Estado.

“Pegando o último caso de Heliópolis, em que há perseguição de um suposto bandido que viria de São Caetano, com tiroteio. Fato que jamais aconteceria em um bairro rico. O Rio de Janeiro tem vários casos recentes. Isso acaba só demonstrando uma forma que já é histórica das polícias não só de São Paulo, de como elas veem e tratam os moradores de comunidades carentes” analisa.

As ações da polícia na periferia, de acordo com o Maffezoli, refletem a maneira como a sociedade, em geral, encara seus pobres. “A sociedade brasileira, com esse sistema de desigualdade social, acaba segregando uma grande parcela dela para os guetos, e essas pessoas não são vistas como iguais a todas as outras. As forças de segurança, quando têm que intervir em qualquer coisa, simples ocorrências do cotidiano, acabam usando uma força totalmente desproporcional e uma atuação sem controle”, critica.

O defensor público aponta, ainda, que a falta de investigações para abusos policiais e a impunidade, na imensa maioria dos casos, contribuem para a agitação da comunidade. “Normalmente, em casos que envolvem excessos policiais, as investigações são extremamente superficiais e acabam não chegando em lugar nenhum. É exceção que uma armação e um excesso feitos pela polícia acabem sendo desvendado”, assegura.

Para o integrante da União de Movimentos de Moradia, é preciso estar atento à repressão nas favelas, na medida em que são graves e crescentes as denúncias sobre abusos policiais. “Acompanhamos com preocupação por causa da violência da polícia, é um desrespeito com as pessoas. A periferia de São Paulo hoje está sitiada, qualquer coisa é motivo para a polícia entrar e matar as pessoas”, afirma.

Integração

Para Raquel Rolnik, o fim dos conflitos só cessarão com o fim da separação entre favela e cidade, possibilitada por uma série de medidas que regularizem as comunidades que hoje estão isoladas e sem acesso pleno a serviços públicos. “[Isso] envolve, necessariamente, as ruas estarem no cadastro da prefeitura; o caminhão de lixo da prefeitura entrar no local; todos receberem o carnê do IPTU, mesmo que seja isento do pagamento; regras de uso e ocupação do solo, sobre onde pode haver casas ou comércio etc”, explica a urbanista.

Simultaneamente , Maffezoli indica a necessidade de aproximação entre moradores e policiais, a fim de destruir estereótipos. “A polícia comunitária é um pouco isso. O policial está inserido naquele contexto, ele conhece todo mundo, se envolve com aquilo e não é uma força inimiga, uma força externa que chega em um determinado local em algum momento do conflito, vendo aquelas pessoas como inimigas”, argumenta.

Os conflitos de 2009

Favela Chica Luísa, zona norte

31 de julho – Moradores da favela Chica Luísa realizaram um protesto contra a morte de um mecânico pela Polícia Militar. De acordo com a PM, o homem teria reagido durante a uma abordagem. Os moradores atiraram pedras contra viaturas da polícia e, mais tarde, um ônibus foi incendiado próximo ao Rodoanel. O motorista do coletivo ficou ferido.

Favela Filhos da Terra, Tremembé, zona norte

26 de agosto – A execução de um inocente, tido como traficante pela polícia, foi a causa da revolta dos moradores, que organizaram um protesto para denunciar a violência policial na comunidade. Durante a ação, ônibus e carros foram queimados.

Favela Tiquatira, zona leste

6 de janeiro – Protesto contra falta de abrigos municipais depois de um incêndio que destruiu diversos barracos na comunidade. Os manifestantes interditaram a Marginal Tietê, queimando pneus e outros objetos. Também foram lançadas pedras contra os policiais, que usaram bombas de efeito moral, gás de pimenta e dispararam tiros de borracha. Três pessoas foram presas.

13 de maio – Moradores fizeram um protesto contra a prisão de um jovem, autuado por tráfico de drogas, e de sua mãe, acusada de desacato. Os manifestantes bloquearam uma rua com pneus e pedaços de madeira e atearam fogo em quatro veículos. Em resposta, a PM lançou balas de borracha e bombas de efeito moral. Pelo menos duas pessoas ficaram feridas. Pai e vizinhos do rapaz preso asseguram que ele não tem envolvimento com crimes.

Favela do Sapo, na Água Branca, zona oeste

15 de julho – Moradores realizaram uma forte manifestação nos arredores da comunidade, revoltados com a ameaça de despejo por parte da Prefeitura, que alega que as casas estão em áreas de risco. As famílias, no entanto, afirmavam ter recebido apenas a oferta de um cheque-despejo no valor máximo de cinco mil reais.

Favela Cidade Jardim, zona sul

6 de abril – Moradores da comunidade realizaram uma manifestação contra a falta de água no bairro, que ocupou totalmente a pista na altura da Ponte Engenheiro Ary Torres.

Favela da Cidade Tiradentes, zona leste

6 de maio – A desocupaçãode mais de 20 casas depois de um deslizamento de terra foi o estopim de um protesto na comunidade. Moradores atearam fogo em pneus e em um ônibus que estava quebrado. A Polícia Militar usou bombas de gás lacrimogênio e balas de borracha para dispersar os manifestantes. Cerca de 120 pessoas ficaram desalojadas.

Paraisópolis, zona sul

2 de fevereiro – Policiais e moradores da comunidade entraram em confronto após o assassinato de um homem durante uma abordagem. A polícia sustenta que o homem assassinado era um traficante; os moradores afirmam que a vítima não tinha relação com o crime. Em protesto, eles montaram barricadas e atearam fogo em veículos, pedaços de madeira e outros objetos, ocupando as ruas da comunidade. Seis pessoas ficaram feridas e nove foram presas.

Heliópolis, zona sul

31 de agosto – Moradores da maior favela de São Paulo revelaram-se contra a morte de uma estudante de 17 anos atingida por um tiro disparado por um guarda civil durante um suposto tiroteio com um suspeito de roubar um carro. Os moradores montaram barricadas com madeira e pneus incendiados e receberam bombas de efeito moral e tiros de borracha por parte dos policiais. Pelo menos dois moradores se feriram.

Jardim Aracati, zona sul

25 de maio – O atraso de linhas de ônibus na região foi o motivo da revolta de moradores da comunidade, que apedrejaram nove coletivos nas proximidades da Estrada do M’Boi Mirim. Com a chegada da polícia, os moradores fugiram. Um passageiro ficou ferido durante a ação.

Um bilhão de favelados

Entrevista publicada na Folha Universal (tiragem de 2,7 milhões de exemplares!!!) em 6 de setembro de 2009.

OBS: Concedi a entrevista no dia 4 de junho, alguns pontos podem estar desatualizados.

Por Gisele Brito

A violência das recentes reintegrações de posses de terrenos particulares ocupados em São Paulo traduz em cores fortes a carência habitacional do País. Ter uma casa própria não passa de sonho para grande parte dos brasileiros. Com déficit de oito milhões de casas, a habitação é um dos nossos principais problemas. Mais de 34,5% dos brasileiros vivem em moradias inadequadas. A urbanista e professora da Universidade de São Paulo (USP), Raquel Rolnik, que há mais de 1 ano ocupa o cargo de Relatora Internacional do Direito à Moradia Adequada do Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), fala sobre esse grave problema: “Os lugares bons, urbanizados, com infraestrutura, estão bloqueados para os pobres.”

1 – O direito à moradia se resume a ter um teto?

Não, absolutamente. De acordo com os tratados internacionais na área de direitos humanos, moradia adequada é um lugar no qual a pessoa ou família tem acesso aos meios para uma sobrevivência com dignidade. Acesso a tratamento de água e esgoto, coleta de lixo, iluminação pública, pavimentação, arborização. A existência de um bairro que tenha equipamentos de saúde e educação. O acesso ao emprego, às oportunidades econômicas e culturais.

2 – E na área rural?

No meio rural, uma moradia adequada é um lugar onde a família pode plantar, pode distribuir seus produtos, ter água para irrigar sua plantação, ter acesso à estrada.

3 – Segundo o IBGE, 34,5% dos brasileiros vivem em condições inadequadas. O que isso acarreta?

Significa que as oportunidades estão muito limitadas, bloqueadas. E é por isso que o lugar onde a pessoa vive é uma engrenagem muito importante da concentração de renda e de oportunidades no Brasil. O lugar tem a ver com a ideia de quem é cidadão e quem não é cidadão.

4 – A Defensoria Pública de São Paulo questiona como a prefeitura recupera áreas de proteção ambiental ocupadas. O que a senhora acha?

Nos casos de remoção, existem procedimentos que devem ser adotados para se respeitar o direito das pessoas. Não é chegar de madrugada com trator, derrubando casas e muito menos dando cheques que não permitem que aqueles moradores possam ter uma moradia, no mínimo, igual a anterior. Não é por acaso que a maior parte dos lugares em que as pessoas moram está em áreas que não podiam ser ocupadas.

5 – E por que isso acontece?

Os lugares bons, urbanizados, com infraestrutura, estão bloqueados para os pobres. E aí, acabam sobrando os lugares onde o mercado formal não pode entrar: beiras de córregos, encostas íngremes, áreas de preservação, mangues. Isso só vai parar se aumentar o acesso à moradia em lugar adequado para quem tem menos renda.

6 – O que a senhora pensa do programa do Governo Federal, “Minha Casa, Minha Vida”, que pretende investir R$ 34 bilhões para construir um milhão de casas?

É muito positivo uma decisão governamental de colocar dinheiro do orçamento para construir moradia popular para quem ganha de zero a três salários mínimos de renda familiar mensal, onde a moradia é inteiramente subsidiada. Até hoje, nunca houve dinheiro para produzir moradia para esse grupo. E muito positivo também dar bastante subsídios a famílias com renda de três a seis salários, que conseguem pagar alguma coisa, mas não tudo. Esse valor, de R$ 34 bilhões, é algo que a gente não viveu ainda. Mas, por outro lado, o “Minha Casa” não faz nenhuma exigência de que a localização seja adequada. E isso faz com que a gente possa prever que a totalidade das moradias de baixa renda vai ser na extrema periferia.

7 – O que a senhora acha dos muros nas favelas no Rio de Janeiro?

É uma ideia infeliz, para dizer a palavra mais leve que eu consigo em relação à proposta do governador Sérgio Cabral. É muito sintomática. O Rio de Janeiro foi um dos lugares onde mais chegou dinheiro do PAC Favelas (programa voltado para a urbanização de favelas). Na hora que a favela vai virar um bairro, se põe um muro. Para quê? Para deixar claro que aquilo não é um bairro, é outra coisa. Então, eu acho que isso é um sinal, um símbolo da política excludente que a gente tem no País, que não quer deixar o pobre fazer parte da cidade.

8 – Qual é o paralelo entre precariedade da habitação e a violência?

O fato do lugar dos pobres na cidade ser o lugar da irregularidade e o da precariedade urbanística tem a haver sim com a violência. Em um lugar sem regra é muito mais fácil a penetração de circuitos ilegais.

9 – Há outros fatores?

É aquilo de todo dia eu estar num lugar em que eu vejo onde o outro mora, o carro que ele tem, a condição de vida que ele tem, a escola que ele tem e, daí, eu olho a minha e comparo. Esse embate exacerba a violência. Quanto mais segregação, mais violência. Quanto mais muro, mais câmera, mais carro blindado, mais violência.

10 – O que a relatoria do direito à moradia tem observado sobre habitação no mundo?

Um bilhão de favelados no planeta. Um terço da população mundial vive em favelas. Eu vi situações bem piores que as favelas brasileiras. Em assentamentos na Ásia, na Índia e em alguns lugares da África, existem situações muito precárias. Mas, por outro lado, existem lugares que resolveram seus problemas de moradia. Claro que são países desenvolvidos e europeus, mas que já tiveram o problema e o enfrentaram.

Não será fácil derrubar o São Vito e o Mercúrio

A prefeitura de São Paulo anunciou na semana passada que os edifícios São Vito e Mercúrio, no centro de São Paulo, serão demolidos ainda neste ano. Inclusive divulgou o nome da empresa responsável pela demolição, ArcoEnge, e o custo: 9 milhões e 200 mil reais.

Mas há o risco dessa promessa não sair do papel.

Na gestão da ex-prefeita Marta Suplicy, houve um debate sobre se era melhor demolir o São Vito ou reformá-lo. Acabou prevalecendo a ideia da reforma, e um projeto foi elaborado. Nesse momento, a prefeitura nem ia mexer no Mercúrio.

Na época foi editado um decreto de desapropriação do São Vito, para que ele passasse a ser de propriedade da prefeitura. Porém quando é feita a desapropriação de um imóvel, deve ser declarada a razão pública, e a razão para justificar a desapropriação do São Vito foi produzir habitação de interesse social. A desapropriação demorou a sair, mas foi concluída.

E o que aconteceu? Quando terminou a gestão da Marta e começou a do Serra/Kassab, a prefeitura desistiu de reformar o São Vito e decidiu demoli-lo. E como o São Vito é vizinho do Mercúrio, resolveram demolir também o Mercúrio junto, para fazer uma praça e um estacionamento perto do Mercadão.

O Mercúrio estava em boas condições, não tinha porque ser demolido. As famílias resistiram, conseguiram estender esse prazo, mas acabaram retiradas. Agora a prefeitura concluiu a licitação para contratar a demolição.

Entretanto, a Defensoria Pública de São Paulo, junto com outras entidades, moveu uma ação civil contra a demolição, por duas razões:

1) O Plano Diretor de São Paulo define que aquela é uma Zona Especial de Interesse Social, ou seja, deve se destinada para habitação popular.

2) A desapropriação foi feita com o objetivo de produzir habitação popular. Então, por mais que os edifícios sejam demolidos, isso deve acontecer para construir habitação popular, não para fazer um estacionamento.
Essa história vai render ainda. Não será fácil demoli-los para fazer um estacionamento.

História lamentável

Havia mais de 700 moradias habitadas no São Vito e no Mercúrio. Isso quer dizer que, em termos de pessoas, havia muito mais gente envolvida.

A situação do São Vito era bastante precária, ele requeria uma reforma imediata de qualquer forma. Já o Mercúrio não, era um prédio com uma condição bastante adequada, tranqüila, bem mantido. Mas foi muito dilapidado durante todo esse processo.

Os dois podem continuar parados, vazios, sem cumprir nenhuma função na cidade, o que é absolutamente lamentável. Aliás, a história inteira é lamentável.

O São Vito já poderia estar reformado e revitalizado, em vez de ficar ali, virando um enorme esqueleto na cidade, sem nenhuma função.

A coluna: