Vila Itororó: pressa em retirar os últimos moradores não faz nenhum sentido!

Mais uma vez a procuradoria geral do Estado de São Paulo insiste em remover as últimas famílias da Vila Itororó, no bairro da Bela Vista, antes da entrega dos apartamentos onde elas serão definitivamente realocadas. Em 2006, um decreto de utilidade pública determinou o despejo dos moradores do local com o objetivo de transformar o espaço em um centro cultural e gastronômico. A maior parte das 71 famílias já deixou a Vila em dezembro de 2011, mas ainda restam algumas. O despejo está marcado para as 6h desta quarta-feira.

Os apartamentos para onde irão estas famílias estavam previstos para serem entregues em dezembro passado, mas não ficaram prontos. O novo prazo é abril. De acordo com informações de uma moradora, a secretaria municipal de cultura, que está diretamente envolvida no projeto, afirma que não tem pressa, e a secretaria estadual de cultura está plenamente de acordo com que os moradores só saiam da Vila Itororó quando puderem ir para suas casas definitivas, em fase final de construção.

Por que então o procurador geral do Estado não define o adiamento do prazo para que as famílias possam mudar para suas moradia definitivas conforme o que preconizam os elementos do direito à moradia adequada em relação às remoções? A pressa da procuradoria não faz o menor sentido e implica em violação do direito à moradia adequada.

Leia mais sobre a Vila Itororó aqui no blog:

13/12/12: Últimos moradores da Vila Itororó podem ser despejados amanhã sem alternativa de moradia adequada.

Moradores da Vila Itororó exigem garantia do direito à moradia e cobram diálogo do poder público

Desde 2006, os moradores da Vila Itororó, no bairro da Bela Vista, em São Paulo, estão ameaçados de despejo por conta de um decreto de utilidade pública que quer transformar a área em centro cultural.

Abaixo segue uma carta da Associação de Moradores e Amigos da Vila Itororó (AMAVila), publicada no início deste mês no Jornal Brasil de Fato. A Associação reivindica a abertura de diálogo com o governo e, acima de tudo, a garantia do direito à moradia das pessoas que residem no local.

Quando a injustiça bate à porta

Assina esta carta a Associação de Moradores e Amigos da Vila Itororó, AMAVila, em nome de todos seus moradores.

(…) queria dizer que uma das coisas que mais me aborrece como Secretário de Cultura é ver gente, até com a melhor intenção, dizer assim: ‘tem um casarão velho lá não sei onde, vamos fazer um museu’. Por que um casarão velho tem que virar museu ou centro cultural? Quem disse que casarão velho é um bom lugar pra ter museu ou centro cultural? É uma solução pra um problema que ninguém consegue resolver. Uso de prédios históricos é uma das ciências mais ocultas que eu conheço. É preciso descobrir a vocação daquele espaço porque ele fala. É só lhe dar ouvidos que ele diz o que ele é, ele diz o que ele pode ser. Não pode ser inevitavelmente centro cultural ou museu. Mete lá umas velharias, põe o nome da mãe do prefeito e temos um museu na cidade. Não é isso que a gente deseja.”

É concordando com estas palavras do Sr. Carlos Augusto Calil, na ocasião da abertura do “II Encontro Paulista de Museus”, no Auditório Simon Bolívar em São Paulo, em Junho de 2010, que nós, moradores da Vila Itororó, queremos reafirmar nosso desejo de permanecer morando neste lugar que escolhemos para construir nossas histórias de vida.

Alguns de nós residimos na Vila Itororó há cerca de 30 anos, outros há mais de 50, outros há 10 anos. Desde a década de 1920 esta Vila sempre foi moradia de aluguel, e todos nós tínhamos contratos de locação regulares. Ocorre que há cerca de 20 anos, a Vila está abandonada pelo proprietário, restando a nós, moradores, mantermos a área da forma que podemos. Isso significa que temos direitos adquiridos. Em 2006 fomos surpreendidos com uma ação judicial de desapropriação, decorrente de um decreto de utilidade pública para esta área, que fica no bairro da Bela Vista (SP) e que é tombado pelos órgãos de patrimônio histórico estadual e municipal – Condephaat e Compresp.

A Secretaria Municipal de Cultura quer transformar nossas residências em um centro cultural e gastronômico! A contradição não está relacionada apenas ao depoimento do Sr. Secretário, mas também na insistência em inserir este tipo de função em um bairro que já tem muitos equipamentos culturais e restaurantes.

A injustiça maior é que estamos na iminência de um despejo e sendo obrigados a entregar nossas casas, sem termos qualquer garantia de moradia, sem termos sido oficialmente convocados a uma audiência pública, como preveem o Estatuto da Cidade e o Plano Diretor, ou seja, sem que o poder público tenha aberto qualquer tipo de diálogo com a comunidade.

Em Agosto de 2009, a CDHU informou por meio de nota da Assessoria de Imprensa, que estaria viabilizando três conjuntos habitacionais na Rua Conde de Joaquim para os moradores da Vila Itororó. No entanto, um destes imóveis já havia sido prometido a outro grupo de pessoas que hoje moram em cortiços no mesmo endereço – o que evidencia a total ausência de um planejamento integrado para um mesmo bairro. E mais: uma tentativa nítida de desarticular os movimentos sociais do centro que, há anos, estão na luta por uma política habitacional condizente com a realidade urbana em que vivemos.

A Associação de Moradores e Amigos da Vila Itororó (AMAVila), muito bem amparada pelo Serviço de Assessoria Jurídica da USP (SAJU), vem tentando um diálogo com a SEHAB, SMC, Procuradoria do Patrimônio Imobiliário do Estado de São Paulo e CDHU, porém ainda sem sucesso. Porque não encontrarmos espaço para diálogos diretos e claros com as Secretarias diretamente envolvidas e, logicamente, as responsáveis pelo assunto? Se o problema que enfrentamos é habitacional, porque a Secretaria de Cultura está coordenando este processo? Qual a legitimidade deste Decreto de Utilidade Pública para Desapropriação? Porque um centro cultural em uma cidade e em um bairro que carece de habitação social? Porque as Secretarias vêm se recusando a dialogar legalmente com a parte mais interessada em todo o processo, os moradores da Vila Itororó?

Enquanto cidadãos e moradores, exigimos minimamente que nossos direitos sejam respeitados:

– garantia do direito à moradia;

– participação popular por meio de todos os instrumentos legais já previstos;

– preservação da memória do bairro da Bela Vista;

Não estamos encontrando respostas a nenhuma de nossas perguntas, mas principalmente, para esta: qual motivo para termos que entregar nossas moradias de tantos anos, em troca de um financiamento, ou seja, uma dívida por mais de 25 anos? Como disse o Sr. Secretário em seu depoimento: “não é isso que a gente deseja”!

Vila Itororó precisa de uma solução completa: moradia adequada e preservação da história e da cultura locais

vilaitororo

As famílias que moram na Vila Itororó, no bairro da Bela Vista, em São Paulo, correm o risco de serem despejadas a qualquer momento. Nesta terça-feira, 4, uma liminar judicial autorizou sua remoção. A Prefeitura está movendo um processo de desapropriação da vila para transformá-la em um centro cultural.

A Vila Itororó foi construída na década de 1920, pelo mestre de obras português Francisco de Castro, e tem grande valor histórico para cidade. Lá foi erguida a primeira residência particular com piscina em São Paulo. Na década de 90, o imóvel foi tombado e a fundação que era a proprietária abandonou o local. Os moradores, que pagavam aluguel para essa fundação, começaram a cuidar coletivamente do espaço.

A comunidade, preocupada com a ação de desapropriação da Prefeitura e sem ter para onde ir, entrou na Justiça pedindo a usucapião do local. Para isso, contaram com o apoio do Serviço de Assessoria Jurídica Universitária, dos alunos da Faculdade de Direito da USP (SAJU). Porém, nesta terça, uma liminar da 1ª Vara da Fazenda Pública autorizou a remoção das famílias, sem oferecer uma alternativa que garanta o direito à moradia dessas pessoas.

Em 2006, a Prefeitura chegou a cadastrar as famílias e sugeriu o Programa Carta de Crédito, da CDHU, que financia a aquisição de imóveis prontos com valores entre 20 e 40 mil reais. No entanto, os moradores dizem que apenas cinco das 71 famílias tinham renda suficiente para cumprir os requisitos desse programa.

A Vila Itororó está caindo aos pedaços e deve ser restaurada, com urgência. Mas dois pontos devem ser considerados nesse processo. O local é hoje um dos focos da vida cultural do Bixiga e isso precisa ser preservado. É fundamental que a atual riqueza cultural da vila seja levada em conta em qualquer projeto para aquele espaço.

E, antes que qualquer remoção seja levada a cabo pelo poder público, é imprescindível equacionar o destino dessas famílias. Elas devem ter assegurado seu direito à moradia. E isso não significa colocá-las em abrigos, mas garantir moradias adequadas, de preferência na própria região. Quanto mais diálogo e participação houver nesse processo, melhor será o resultado.

Saiba mais no blog da Vila Itororó.

Crédito da foto: Julio Fragata