Quando até a classe média é expulsa de seus bairros…

Como já venho falando, as grandes cidades brasileiras vivem hoje uma forte crise habitacional gerada pela alta valorização imobiliária e o consequente aumento no preço dos imóveis e dos aluguéis. Se a demanda por habitação já era grande, esta crise só agravou o problema.

Na ausência de políticas habitacionais que apresentem alternativas de enfrentamento a essa questão, de um lado, cresce o número de ocupações e mobilizações promovidas por organizações de sem teto, reinvindicando o direito à moradia adequada. De outro, parte da classe média já está sendo forçada a se mudar para bairros mais periféricos.

Sobre este assunto, ontem o Estadão divulgou notícia comentando uma pesquisa desenvolvida pelo Creci-SP (Conselho Regional de Corretores de Imóveis do Estado de São Paulo). Esta pesquisa revela que dobrou o número de pessoas que está devolvendo imóveis ao final de seus contratos de aluguel porque não consegue pagar os valores que estão sendo cobrados na renovação.

Confira abaixo a matéria do Estadão.

*Leia também aqui no blog: Emergência habitacional.

Dobra devolução de imóvel por aluguel alto
Reajuste ‘expulsa’ moradores para regiões periféricas, mostra pesquisa do Creci-SP

MÔNICA REOLOM – O Estado de S.Paulo
A zootecnista Andréa Souza de Paula, de 26 anos, teve de procurar outro lugar para morar em São Paulo depois que o proprietário do apartamento quis subir o valor do aluguel em R$ 800. O preço passaria de R$ 1,6 mil para R$ 2,4 mil, um aumento de 50%.

“Eu dividia uma casa na Vila Mariana com uma amiga e o valor pedido na hora de renovar o contrato era muito alto. Não deu para continuar”, conta Andréa. Pelo valor original, ela e a amiga só conseguiram um apartamento menor em outra região da cidade, na Lapa.

Uma pesquisa divulgada neste mês pelo Conselho Regional de Corretores de Imóveis do Estado de São Paulo (Creci-SP) mostra que, em um ano, dobrou a proporção de pessoas que devolveram as chaves de apartamentos por não conseguir arcar com o aluguel. O índice de entrega por problemas financeiros passou de 15% do total das devoluções, em fevereiro de 2013, para 30%, no mesmo mês deste ano. A pesquisa foi feita com 402 imobiliárias.

“A maioria das pessoas não consegue suportar o novo aluguel”, afirma o presidente do Creci-SP, José Augusto Viana Neto. “O contrato geralmente é de 30 meses. Depois desse período, sempre há uma atualização. Mas é livre a negociação e, como há escassez de imóveis para alugar, o proprietário pede o que quer. O locatário acaba entregando o imóvel e indo para outro lugar”, explica.

Segundo Viana Neto, há um movimento claro das famílias de classe média para as zonas periféricas da cidade. “As pesquisas mostram que, por causa da valorização dos imóveis, as pessoas estão saindo das áreas centrais e seguindo para a periferia”, diz.

O presidente do Creci-SP afirma que a alta abusiva dos valores pode ser explicada pela falta de oferta de imóveis para locação na cidade. “Imóvel para vender tem, e a oferta é boa, mas para alugar falta, e muito. Não há interesse dos investidores em comprar imóvel para esse fim, porque a tributação é muita alta e as ações de despejo, muito demoradas. As pessoas acabam indo para outros investimentos.”

Sem opção. Nascida em Tupã, no interior do Estado, Camila Yano, de 25 anos, também passou por situação semelhante à de Andréa. Em janeiro, a assessora de marketing quis renovar o contrato com a proprietária do apartamento em que morava com mais quatro pessoas no bairro de Santa Cecília, região central. A proposta era de aumentar o valor em R$ 1,5 mil, alcançando R$ 3,5 mil por mês.

“A proprietária não deu justificativa para o aumento abusivo. Acho que ela quis equiparar com os preços da região”, diz. Sem chegar a um acordo, os moradores não toparam a proposta e seguiram em busca de novos lares, o que não foi fácil.

“Eu não queria sair desta região porque consigo chegar ao trabalho rápido. Mas olhei tudo, fiquei dois meses procurando. A média de preços era de R$ 2,5 mil a R$ 3 mil para um apartamento de dois quartos”, diz. No fim das contas, Camila encontrou um imóvel por R$ 1,9 mil, que considerou justo.

“A proprietária deste apartamento perto do metrô havia comprado para investimento e não estava conseguindo alugar por causa da região, que é um pouco perigosa e muito movimentada no fim de semana. Foi o mais barato que achei e, mesmo assim, acho caro. Como precisava alugar, acabei usando a máxima do ‘é o que tem para hoje’.” Camila, que hoje divide a residência com um amigo, diz que compromete quase 50% da renda com o aluguel.

Hubert Gebara, vice-presidente de Administração Imobiliária e Condomínios do Sindicato da Habitação de São Paulo (Secovi-SP), atribui o aumento de devolução ao desaquecimento da economia. “A inadimplência está alta porque houve muito estímulo ao consumo nos últimos anos. As pessoas assumiram dívida e está complicado pagar. Há uma pressão em cima dos inquilinos para honrar os compromissos.”

 

6 comentários sobre “Quando até a classe média é expulsa de seus bairros…

  1. Câmara Municipal marca Audiência Pública sobre Desapropriações na Operação Urbana Água Espraiada. 28-05-2014, 13h.

    Nesta quarta-feira (14), a Comissão de Administração Pública da Câmara Municipal de São Paulo aprovou a data de 28 de maio de 2014, às 13h, para a realização de uma audiência Pública para tratar da questão das Desapropriações na Operação Urbana Consorciada Água Espraiada.

    CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO
    COMISSÃO DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
    Data: 28/05/2014
    Hora: 13h
    Local: Plenário 1º de Maio – 1º andar
    Endereco: Viaduto Jacareí, nº 100 – Bela Vista –

    Audiência Pública sobre dasapropriações na Água Espraiada e Jabaquara. 28/05, 13h.

  2. A classe média no Brasil tem que começar a se mexer , se organizar , gritar e ir para a RUA contra a espoliação urbana e a extorsão do financiamento imobiliário .
    Deixar a luta pela moradia apenas nas costas das classes populares não vai nos levar a lugar nenhum , ou melhor, vai nos levar à BOLHA IMOBILIÁRIA . E do tamanho que é este pais vai ser um BOLHÃO do tamanho do continente e não uma marolinha ….

  3. Cara, Raquel, a atual Lei do Inquilinato, que só foi alterada para pior no Governo Lula (LEI Nº 12.112, DE 9 DE DEZEMBRO DE 2009), não concede nenhum poder ao inquilino na hora de renovar o contrato de locação. O proprietário pode pedir o que quiser e o inquilino paga ou desocupa imediatamente a moradia. Urge mudar essas regras.

  4. A pesquisa foi promovida pelos corretores de imóveis? Pois eles podiam muito bem contribuir para uma solução do problema, revendo a cultura de tratar moradia como meio de especulação financeira. Pela tendência atual (e pela mentalidade dominante atualmente), corremos o risco de assistir aqui ao que ocorreu na Espanha, com gente se matando por não mais poder pagar pelo que deveria ser um direito básico.

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