Ainda somos um país de lixões

lixao da estrutural foto senado

Lixão da Estrutural. Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado. Alguns direitos reservados.

Uma das metas da Política Nacional de Resíduos Sólidos aprovada em 2010 era acabar com os lixões em todas as cidades brasileiras até 2014. Diante do não cumprimento da meta, está em discussão hoje no Congresso Nacional um Projeto de Lei que propõe prorrogar esse prazo, de modo escalonado, e considerando o tamanho dos municípios. Assim, as maiores cidades e as capitais teriam até 2018 para alcançar a meta, enquanto pequenas cidades teriam até 2021.

Isso vai resolver o problema? Dificilmente. Na imprensa, o discurso geral é de que a maior dificuldade é financeira: a maioria dos municípios não disporia de recursos para implementar aterros, coleta seletiva, entre outras medidas, e assim acabar com os lixões. Além disso, a crise econômica e o ajuste fiscal impediriam o governo federal de repassar recursos para tais iniciativas. Se o problema fosse simplesmente esse até que era fácil…

Em primeiro lugar, a meta geral propõe a substituição dos lixões por aterros sanitários, mas estes só se viabilizam a partir de certo volume de lixo coletado, o que não se justifica em municípios com pequena população. De fato, sob essa lógica, as prefeituras não têm mesmo condições financeiras de construir essas estruturas, muito menos de operá-las. Esse modelo só serve para médias e grandes cidades ou… se for compartilhado entre vários municípios.

Aí começa o segundo problema. Já existe legislação que permite e regula a formação de consórcios para uma gestão compartilhada entre diversos entes da federação. Mas até hoje são muito poucas as iniciativas de consorciamento entre municípios. Antes de mais nada, essas iniciativas emperram em uma dificuldade de outra ordem, decorrente de interesses políticos entranhados nas gestões municipais, que têm impedido a formação de consórcios. Afinal, quem será o fornecedor do serviço? O da prefeitura A, da B ou da C? E a empreiteira que vai construir a obra? Quem vai indicar?

Além disso, o modelo de consórcio só tem possibilidade de dar certo se aplicado a municípios muito próximos. No interior de Minas, por exemplo, ou mesmo de alguns estados do Nordeste, pode funcionar. Mas se pensarmos em muitos municípios das regiões Norte e Centro Oeste, é impossível implementar um serviço de coleta e destinação do lixo que requer transportar o material por quilômetros e quilômetros de distância.

Ou seja, em alguns lugares é inviável tanto construir um aterro quanto implementá-lo por meio de consórcio. Para esses casos, é urgente pensar soluções alternativas. Mas tais soluções hoje estão fora do radar dos modelos de projeto e de seus correlatos modelos de financiamento. Mal e mal desenvolvemos equações técnicas já incluídas nas rotinas de financiamento para a implantação de aterros e centrais de reciclagem…

E o problema não está só nos lixões. A Política Nacional de Resíduos Sólidos prevê diversas outras medidas que também não estão sendo cumpridas. A coleta seletiva vem aumentando? Sim, mas a passos muito lentos, e ainda está muito longe de alcançar um patamar satisfatório. A logística reversa foi implementada? Não. A cadeia produtiva de empresas que fabricam itens como lâmpadas, pilhas, baterias, eletrodomésticos, eletrônicos, entre muitos outros, ainda não incluiu de fato a coleta e destinação dos seus produtos quando eles perdem utilidade.

O fato é que nos últimos anos a geração de lixo no país aumentou em um ritmo muito maior que o crescimento da população: entre 2010 e 2014, a produção de lixo cresceu 29%, e a população, 6%. Hoje, 41,6% dos resíduos ainda vão parar em lixões. Esses dados são de pesquisa realizada pela Abrelpe – Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais.

Enfim, não se trata de falta de dinheiro. Falta repensar o nosso modelo de federação (como podemos tratar como iguais municípios absolutamente diferentes? Como construir novas formas de gestão territorial intermunicipais de fato?) e, especialmente, formular soluções que levem em conta a diversidade de situações presentes em nossos municípios. Finalmente, falta também assumirmos mais firmemente nossas metas de redução da produção lixo!

*Texto originalmente publicado no Blog Habitat do Portal Yahoo.

6 comentários sobre “Ainda somos um país de lixões

  1. tenho uma sugestão:
    A questão do lixo

    Se reciclagem fizesse sentido — waterfall_web_environment.jpgeconomicamente, e não como um sacramento para a adoração de Gaia —, estaríamos sendo pagos para tal.

    Quando visto sob a devida perspectiva, os problemas que enfrentamos hoje em relação ao lixo não são piores do que foram no passado. O lixo sempre foi um problema durante toda a história humana. A única diferença é que, hoje, temos métodos seguros para lidar com ele — caso os ambientalistas nos permitam.

    Dizem, por exemplo, que devemos separar jornais para a reciclagem. E a ideia de fato parece fazer sentido. Afinal, jornais velhos (isto é, com mais de meia hora de impressão) podem ser transformados em caixas, folhas de fibra, revestimento de parede e material isolante. O problema é que o mercado está inundado de papel de jornal, graças também aos programas e às propagandas governamentais. Um caso clássico ocorreu em Nova Jersey, no início da década de 1990. Por causa do excesso de oferta, o preço dos jornais usados, que estava em US$ 40 a tonelada, despencou para menos US$ 25 a tonelada. Ou seja: antes, os empreendedores do lixo estavam dispostos a pagar ($40) por jornal velho. Depois, eles passaram a cobrar ($25) para levar o entulho.

    Se for economicamente eficiente reciclar — e jamais poderemos saber ao certo enquanto o governo estiver envolvido —, então o lixo inevitavelmente terá um preço de mercado. É apenas por meio de um livre sistema de preços, como Ludwig von Mises demonstrou há 90 anos, que podemos saber ao certo o valor de bens e serviços.

    O homem das cavernas tinha problemas com o lixo, e o mesmo problema acometerá nossos descendentes. E tal ciclo perpetuar-se-á enquanto a civilização humana existir. E o governo não possui a solução para o problema. Um sistema estatizado de coleta de lixo é inerentemente ineficiente, como podemos comprovar diariamente. O lixo pode até ser coletado, mas sua destinação certamente não será a mais “ambientalmente saudável”. Um sistema socialista de coleta de lixo funciona exatamente como a economia da Coréia do Norte.

    Apenas o livre mercado pode solucionar o problema do lixo, e isso significa abolir não apenas o sistema socialista de gerência do lixo, mas também aquele sistema corporativista (fascista) relativamente mais eficiente que várias prefeituras costumam adotar, no qual uma empresa com boas conexões políticas vence a licitação.

    A solução é privatizar e desregulamentar tudo, desde a coleta até os aterros sanitários. Dessa forma, cada um pagará a fatia apropriada dos custos. Alguns tipos de lixo serão levados mediante uma taxa, outros serão levados de graça e vários outros poderão inclusive ser vendidos para os coletores. A reciclagem seria baseada no cálculo econômico, e não no decreto governamental.

    Coleta e manuseio de lixo é um serviço como qualquer outro. Se é verdade que todo mundo quer ter seu lixo removido e tratado, então há uma demanda de mercado para tal serviço. Há dinheiro a ser feito nessa área. Caso não houvesse tal interesse, não haveria tantos “coletores ilegais” como vemos hoje. Com efeito, a única coisa que impede a concorrência no mercado do lixo é exatamente o fato de o estado ter tornado tal atividade ilegal.

    Se o mercado estivesse no comando, a produção excessiva de lixo não seria vista como um problema — como vê o governo —, mas como uma oportunidade. Empreendedores estariam se atropelando para satisfazer a demanda por coleta, assim como acontece em todos os outros setores que são controlados pelo mercado. Será que os fabricantes de sapatos vêem um aumento na demanda por calçados como um problema? As redes de fast food vêem os glutões como uma terrível ameaça? Pelo contrário, esses são encarados como oportunidades de lucros. Da mesmo forma, é muito provável até que o sistema de coleta fosse feito da maneira mais confortável possível para nós, os clientes.

    A escolha é sempre a mesma: ou se coloca os consumidores no comando, dando espaço para a propriedade privada e para o livre sistema de preços, ou cria-se um fiasco por meio da gerência governamental. Sob esse sistema de livre concorrência, até eu vou começar a separar meu lixo.
    http://www.mises.org.br/Article.aspx?id=677

  2. Cara Raquel e leitores do Blog
    A solução da Politica de Resíduos Sólidos e sua aplicação passa por três ou mais colunas de sustentação : 1ª Educação, 2ª Educação e Informação e 3ª Educação e Responsabilidade com o Planeta. Sem isto, nada poderá ser implementado.
    O consorcio ou parcerias é apenas uma das soluções para Municípios pequenos e limítrofes. dependendo das distancias entre eles. Já na região Centro-Oeste, Norte e Nordeste, as sedes das Cidades são muito distantes, ou seja de 200 km para mais. Estes municípios devem resolver individualmente, não só a geração de resíduos sólidos como a destinação correta, e tudo passa por muita educação ambiental. Agora os Consórcios devem ser apartidários e com participação igualitária, pois não dá para sair do Planeta (pelo menos por enquanto) portanto somos co-responsáveis por todo lixo que produzimos, mesmo que um individuo ou um município incluso no consorcio, produza menos ou mais lixo. Temos que entender primeiro que o problema dos resíduos sólidos é de todos, que dependendo do tratamento dado a estes pode beneficiar ou prejudicar a todos. E não só aos seres humanos, mais toda flora e fauna.
    A Educação Ambiental deve ser mais presente , da pré-escola até a terceira idade.
    Deve ser incentivada a Reciclagem e o Reaproveitamento de tudo, e aquilo que o cidadão comum não tem condições para reciclar ou reaproveitar (como lampadas, eletroeletrônicos, pneus, etc.) deve se fazer cumprir a Lei da Logística Reversa, caso as empresas não atendam, acionar o Ministério Publico, e invocar o Código Jurídico Ambiental. Quero aqui louvar a atitude da ANIP Associação Nacional da Industria de Pneumáticos, que recolhe pneus usados, em todo Brasil, dando-lhes a destinação correta.
    A Educação e a Informação é importante para conscientizar o cidadão, e este conscientizado e instruído , automaticamente será responsavel pela Sustentabilidade do Planeta.
    Outro item importante que as Prefeituras não estão cumprindo e é muito mais antigo do que a data limite para Destinação Correta dos Resíduos Sólido, é o Saneamento Básico, que a maioria dos Governos Municipais encaram como gasto ou despesa, mas na verdade é um grande investimento publico , pois o Saneamento Básico economiza milhões que são gastos anualmente na Saúde.
    Grato por mais esta oportunidade
    Antonio da Ponte
    Ambientalista da Aclimação

    • discordo um tanto disso: as empresas vao embutir esses custos nos preços, dificultando o acesso aos bens. Ou então simplesmente deixarão de produzir. Seria um tiro no pé. Muito melhor deixar o mercado livre e incentivar que empresas lucrem com a gestão, coleta e destinação final do lixo.

      • Steel, o custo não seria tão alto. No caso dos refrigerantes, já vivemos esta época e funcionava muito bem. Pilhas, podem ter a mesma lágica: a pilha usada vale desconto na compra da pilha nova. É preciso repensarmos os padrões de consumo e a quantidade de lixo gerada. Istonão exclui sua sugestão de incentivar que empresas lucrem com a gestão, coleta e destinação final do lixo.

  3. As razões apresentadas por Raquel não me convencem.

    Não faltam formular soluções.

    O pais tem sim, leis, normas tecnicas, modelos de gestão que atendem os objetivos da nossa Política Nacional de Resíduos Sólidos, boas praticas desses modelos de gestão, ate mesmo experiências incríveis como a compostagem domiciliar alçada a instrumento de política publica em São Paulo.

    Então por que ainda temos lixões? Eh uma boa pergunta.

    E teríamos uma boa resposta se tivéssemos o Plano Nacional de Resíduos Sólidos vigente. La estavam propostos estratégias, metas e responsabilidades.

    Ops! Vi um lampejo de resposta bem mais simples…parece que falta gestão.

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