É bem-vinda a parceria entre prefeitura e governos estadual e federal para a produção de moradias no centro de São Paulo

A imprensa paulistana noticiou ontem a assinatura de um protocolo de intenções entre a Prefeitura de São Paulo e o Governo do Estado para a produção de 20 mil moradias na região central da cidade, utilizando inclusive a reforma de edifícios vazios. O governo federal entrará no projeto com os financiamentos do Programa Minha Casa Minha Vida, e os governos estadual e municipal com recursos complementares para viabilizar essa produção.

Além de reformar imóveis abandonados ou sem uso, o projeto prevê a criação de imóveis mistos, através de PPPs (parcerias público-privadas), com comércio no térreo e moradia nos demais andares. De acordo com reportagem do Estadão, das 20 mil unidades, 12 mil devem ser destinadas a famílias que ganham até cinco salários mínimos. Também seria reservada uma cota aos movimentos sociais de moradia. Estão incluídos na área do projeto os bairros Santa Cecília, Barra Funda, Bom Retiro, Pari, Brás, Mooca, Belém, Cambuci, Liberdade e Bela Vista.

Sem dúvida a iniciativa é muito positiva e poderá beneficiar milhares de pessoas que trabalham na região central e hoje moram em locais distantes, gastando horas de deslocamento entre a casa e o trabalho. Mas há alguns desafios – nada simples – que precisam ser enfrentados para que a implementação dessa intenção declarada de fato dê certo.

Em primeiro lugar, embora tenha sido afirmado que 12 mil unidades serão destinadas à famílias com  renda entre 0 e 5 salário mínimos, é importantíssimo também determinar quantas unidades serão destinadas para famílias com renda de até 3 salários mínimos, já que é nessa faixa que há maior dificuldade de acesso à moradia. Na legislação de São Paulo, a chamada “Habitação de Interesse Social” (HIS), que inclui a faixa de renda de até 6 salários, deixa uma grande margem para que as famílias das faixas mais baixas – e, portanto, muito mais difíceis de atender – fiquem de fora. Por outro lado, a chamada “Habitação de Mercado Popular” (HMP) chega até 10 salários mínimos de renda familiar mensal, que, em função da valorização recente do salário mínimo, acaba sendo uma faixa que poderia ser facilmente atendida pelo mercado.

Portanto, uma revisão dessas definições é mais do que urgente para que possamos definir com clareza os percentuais para cada segmento, as misturas possíveis e o nível de subsídios necessários para cada uma das faixas. Particularmente importante é garantir um bom percentual para as faixas de 0 a 3 que, em São Paulo, estão totalmente excluídas da oferta atual. É preciso lembrar, aliás, que a melhor equação é sempre a mistura de diversas faixas de renda, incluindo famílias com renda de 0 a 3 salários, de 3 a 6 e até mais que 6 no mesmo empreendimento. Isso já ocorre em varias cidades do Canadá e dos Estados Unidos e, apesar de arrepiar a cultura segregacionista da produção imobiliária brasileira, é a equação mais sustentável sob todos os pontos de vista.

Outra questão importante é enfrentar os obstáculos que envolvem a reforma de prédios antigos, hoje inviabilizada inclusive em função dos códigos de obra e de segurança, que exigem padrões impossíveis de se atingir com algumas dimensões e características desses imóveis. É necessário, portanto, construir uma regulação específica voltada para a reforma e reabilitação de imóveis no âmbito deste programa. E um desafio correlato é conseguir fazer isso dentro das regras do programa Minha Casa, Minha Vida, que hoje tem normativos completamente baseados na construção de habitações novas, não contemplando as especificidades de uma reforma.

Enfim, não são poucos os desafios. Mas, considerando a necessidade de produção habitacional em áreas centrais da cidade de São Paulo, sem dúvida a parceria entre as três esferas de governo é muito positiva e bem-vinda. Vamos torcer pra dar certo.

14 comentários sobre “É bem-vinda a parceria entre prefeitura e governos estadual e federal para a produção de moradias no centro de São Paulo

  1. Acredito nos investimentos na região central da cidade. A ideia de trazer moradia próxima aos bens e serviços, essa decisão favorece a dinâmica daqueles incapazes de ter seus direitos assegurados.
    Proporciona também a ebulição da vida noturna, visto que, atualmente o centro é usado na sua totalidade, apenas durante o dia. Interessante também é manter o valor da terra acessível economicamente, sem supervalorização da terra urbana, de maneira que, os mais pobres possam ser beneficiados e terem direito a cidade.
    Porém, ouvi na rádio Estadão, entrevistas com algumas pessoas, que não gostariam de morar no centro, a justificativa era relacionada, na maioria das vezes, com a descrença no poder público, em tornar a fala em realidade.

  2. cobri a reintegração do edifício na rua 7 de abril, 355. foi-me informado pelo próprio dono que o prédio já esta ligado com a cohab…estão com acordo com a prefeitura. vamos ver se de fato será destinado para a moradia das pessoas de baixa renda. por sinal, artigo muito importante, pois aborda pontos fundamentais e de suprea importancia neste aspecto de moradia, parabéns e obriagada pelas elucidações.

  3. Começamos tudo errado novamente. A manchete do Estadão saiu errada.
    Saiu que o novo acordo assinado entre o governo do Estado e Prefeitura que
    que levarão 20 mil novos moradores para o Centro, mas pelo que entendemos são 20 mil novas moradias que daria um total de 80 a 100 mil pessoas. Com a atual infra-estrutura suportaríamos ? E quem definiu este número de unidades, baseado em que ? Se pegarmos o Centro e os bairos vizinhos a este, tenho certeza que é o numero é bem maior.
    Como ensinou o Professor Lula, o Hadad também vai passar por cima das Leis.
    Em São Paulo existe, Um Código de Obras , Um Plano Diretor e Uma Lei de Zoneamento, Acho que sem mexer nestes, principalmente Zoneamento, dá para fazer muito pouco na Região Central. O substitutivo 509/2011 enviado a Câmara pelo Ex Prefeito Gilberto Kassab, previa isto, mas só foi aprovado na primeira votação, na segunda o Partido dos Trabalhadores e seus aliados fizeram de tudo para não votar. Primeiro por causa da Eleições de 2012, depois que passou a eleições as Lideranças da Câmara resolveram deixar para 2013, e até agora nada. A Revisão do Plano Diretor está engatinhando.
    Desapropriar não seria a solução, só aumentará a dívida ainda mais da Prefeitura já tão endividada, e quem acaba pagando a conta somos nós
    Acho que devem deixar por conta da iniciativa privada somente, desde que mude alguns Zoneamentos(Principalmente as Zeis) e dê incentivos com contra-partidas, como é a outorga onerosa. Acho que , tanto o Governo do Estado como a Prefeitura, devem sim cuidar da Infra -estrutura da Cidade, oferecendo Segurança, Escolas, Saúde de boa qualidade, Metrô, Onibus, coleta e varrição do lixo eficaz, promover constantemente a Reciclagem, além de cuidar do Trânsito e das Enchentes.Eliminar ao máximo as área de riscos, seja em morros ou em margens de córregos. Este é o papel principal do Estado, quando ao deficit habitacional é só dar condições estruturais e financiamentos, que a Iniciativa Privada resolve.
    PS. Tenho a solução para resolver grande parte das enchentes em São Paulo , e sem gastar muito, só que os Poder Público não dá chance ao Cidadão Comum. Deviam pelo menos promover um Concurso sobre o assunto.
    Antonio da Ponte
    Creci. 103.472

  4. Demorou muito para que uma iniciativa como essa surgisse. O ideal é que esses quesitos sejam abordados com todo critério e o máximo de cuidado. No entanto, acho forçada a “classificação” adotada para as faixas de renda estabelecidas pelo Dec.Municipal 44.667/04 que regulamenta o acesso “social” à habitação, no município de São Paulo. Levando-se em conta a prática do salário mínimo no Brasil e a realidade dos “miseráveis” que ainda vivem abaixo da linha de pobreza, seja uma verdadeira aberração considerar a faixa de até “6 salários mínimos”, e mesmo a de “16 salários mínimos” como “quesitos máximos” preestabelecidos para adquirir um imóvel de HIS (habitação de interesse social) e HMP (habitação de mercado popular),
    respectivamente, segundo o decreto. Além disso, há sim o grande desafio de tornar as áreas centrais, famosas por seus “bolsões” decadentes em polos reais de fomento à moradia. Outra questão não levantada, que não apenas o Código de Obras e o PDE, é a de que há também muitos edifícios de grande valor cultural e histórico e que podem vir a se tornar objetos dessa utilização, correrem o risco de sofrer reformas e restaurações desastradas, ou de má qualidade, sem que sejam levados em conta parâmetros reais sustentáveis
    e compatíveis entre seus novos usos e suas características. Quanto à segregação socioespacial, creio não ser uma fórmula produzida e adotada pelo setor imobiliário, e muito menos pela produção habitacional a contribuir
    com os “enclaves de exclusão” espalhados pela cidade, haja vista que o próprio poder público é segregador quando prioroza e investe nas áreas mais abastadas, negligenciando os mais pobres. Temos aqui uma outra questão social a ser debatida e enfrentada pelas póprias classes sociais, segregadas por si mesmas como se formassem uma doença “autoimune” em que o corpo ataca o próprio corpo. Como possível solução é preciso tomar outros caminhos, agir diferente e tentar fazer o que ainda não foi feito! Concordo sim com a revitalização central da cidade e com todos os incentivos para que isso ocorra, mas há de fato muito o que se pensar!

  5. A articulação entre governo do estado e prefeitura para enfrentar o problema da moradia em SP, é mais do que necessária. Porém, há outro ator neste elo de ligação e de unidade que é preocupante: as empreiteiras. Com muito dinheiro. Dentro do modelo neoliberal, as PPPs parecem encantar os governos de plantão. Sem qualquer discussão com os Movimentos.Populares.- Aliás, já estamos há mais de um ano sem Conselho de Habitação em São Paulo. Existem hoje, mais de 20 ocupações no centro. Segundo informam, os projetos das PPPs devem começar a sair do papel em outubro. Muito antes disso, muita gente já estará nas ruas!

  6. É preciso ter um certo cuidado na escolha das pessoas que serão contempladas com as moradias. Muitas delas são apenas oportunistas ou ingênuos recrutados pelos movimentos pró moradia apenas para fazer número e barulho.

    Por outro lado, os verdadeiros necessitados, os que trabalham no centro e moram na periferia podem ser excluídos caso não façam parte do ‘esquema’.

  7. É um começo, mas infelizmente vejo pouca possibilidade das famílias de até 3 SM serem contempladas. O Mercado quer de 5 SM pra cima, preocupação já exposta pela Rolnik no texto. Outra coisa que nos assusta é o fato dos movimentos de moradia, as associações de bairro, as cooperativas habitacionais não participarem destas decisões. Precisa dialogar com quem não tem casa para produzir casa. Quem entende de moradia para famílias de baixa renda são os movimentos de moradia e as associações e cooperativas. O resto é conversa fiada… Isso é urgente. Ivanio COOHABRAS.

    • Discordo Ivanio.

      Os verdadeiros beneficiários das moradias no centro seriam as pessoas que trabalham e moram de aluguel na região há muitos anos. Não tem tempo de sair às ruas em passeata, conferindo legitimidade aos movimentos Pro-moradia.

      Nada impede que um cidadão interessado em adquirir sua casa própria inscreva-se nos programas dos governos e aguarde. Não se produz moradia assim como quem faz caldo de cana na hora, basta pedir.

      O que esses movimentos querem é alçar voo para a política, algo muitíssimo rentável hoje em dia. Os ingênuos que estão lá fazendo barulho e pressão com crianças e bebês à frente são na verdade massa de manobra.

      saudações.

      • Olá Rogério.
        Não há trabalhador ou trabalhadora que não tenha tempo para reivindicar seus direitos. Esta sua percepção de que não temos tempo para protestar é equivocada, eu sempre trabalhei – e trabalho – e isso não me impede de lutar pelos meus direitos.
        Os movimentos de moradia são legítimos, fruto de longa luta pelo direito à moradia, e essa possibilidade criada por esta notícia só é possível por causa de nossa luta. Pense nisso: Será que esta decisão caiu do céu? Claro que não. Agora imagine… se ninguém tensionasse… vc acredita que o governo se movimentaria?
        A pura inscrição nos bancos estatais não vai tensionar o surgimento de políticas públicas… é necessário a pressão política positiva para que as coisas aconteçam. Quem só quer aguardar, que espere sentado….
        O movimento de moradia não quer alçar voo pra política, eles já são políticos! Em sua essência reside uma forma de ver e pensar o mundo, política pura, onde os sem moradia são agentes da mudança e não espectadores. Não somos massa de manobra, essa ideia é construída pelo mídia para desvalorizar as mobilizações sociais e reduzir os militantes sociais a ignorantes.
        A cidade é nosso espaço por direito, quem se movimenta conquista, quem fica parado… mora de aluguel. Abraço fraterno, bom diálogo a todos e todas nós. Ivanio COOHABRAS.

  8. Na PPP proposta pela Casa Paulista no ano passado, ficava claro que não se pensava em enfrentar o desafio do parcelamento do solo. Grandes terrenos geram grandes condominios, dificuldades de circulação e outros inconvenientes que conhecemos. Penso ser importante tocar nesse ponto controverso desta vez.

  9. Meu nome é Carlos Josué, sou mestrando em geografia da Universidade Estadual do Ceará, pesquisamos a espacialização do Programa de Arrendamento Residencial – PAR na RMF. Venho através desse e-mail, dizer que a admiro pela sua atuação nas questões sociais presentes no espaço urbano. Seu empenho histórico por um direito à cidade. Mas, venho também tentar contribuir. No seu texto do dia 01 de março de 2013, com a manchete intitulada “É bem-vinda a parceria entre prefeitura e governos estadual e federal para a produção de moradias no centro de São Paulo.” A senhora fala sobre a importância dessa parceria focar a atuação na moradia no centro, mas também ressalta que “[…] um desafio correlato é conseguir fazer isso dentro das regras do programa Minha Casa, Minha Vida, que hoje tem normativos completamente baseados na construção de habitações novas, não contemplando as especificidades de uma reforma.” Professora, na revista Construção Mercado da edição 97 de agosto de 2009″ No caderno “Habitação popular” trás uma reportagem sobre o PAR, com o nome “PAR ou?”. Nessa reportagem muitos atores envolvidos na produção pública de habitação no Brasil apostam na coexistência de programas, isto é, o PAR permanecerá justamente para atender a fatia não contemplada no MCMV, que a é reforma de habitações em áreas centrais antigas, que está prevista na própria legislação que rege o programa. Como fala Inês Magalhães (Secretária Nacional de Habitação do Ministério das Cidades): “Existe o desafio, atualmente, de manter o PAR como uma modalidade mais voltada para um nicho específico como a de recuperação de áreas centrais”.
    Agora resta saber se o público atendido será realmente o que não tem acesso ao mercado imobiliário formal. Tenho receios que os centros, passem por processos de “revitalizações” de aparência, expurgando, como no passado tudo que é “indesejado” para uma produção capitalista da cidade. Essas habitações em áreas centrais podem vir como um pacote higienista trazendo ranços do passado. Segregando mais que agregando.

    Professora, acredito que a senhora já soubesse, mas acho interessante que a proposta seja discutida,
    Atenciosamente,

  10. Sinceramente já passou da hora, não somente de revitalizar o centro, mas também de TRANSFORMÁ-LO, dispondo de toda infra-estrutura, qualidade arquitetônica e urbanística que qualquer mega cidade alfa no mundo possui. O que nossos prefeitos (de VÁRIOS partidos políticos) fizeram com o centro da cidade, seria um crime em Nova York (especificamente Lower e Midtown Manhattan), pois a entusiasta população nova-iorquina ficaria revoltada e exigiria um impeachment. A questão não é ser uma cidade de país desenvolvido ou emergente, mas sim sobre o descaso e a péssima visão de nossos prefeitos em geral.

    Salvo raras exceções, é fácil reconhecer centros de cidades brasileiras: calçadas sem um padrão e personalidade (lamento pela estética, mas também pelas pessoas idosas ou portadoras de deficiência física), prédios com empenas cegas, blocões residenciais de janelas pequenas, prédios caindo aos pedaços, e alguns, de “brinde” ainda dispõem de fiações aéreas ao “melhor” estilo varal.

    Não tenho inveja, mas fico triste quando penso, não somente em Nova York, mas também em Chicago, Los Angeles, Toronto, Calgary, Sydney, Auckland, Paris, na EMERGENTE cidade russa Moscou, em cidades da EMERGENTE China, e até em cidades de interior dos EUA. Ser um entusiasta brasileiro é pedir para ter desgosto. Parece que no Brasil não há planejamento urbano e arquitetônico.

    A cidade-país Singapura (ou Cingapura), já provou para o mundo que é possível alcançar o 1º mundo. Não estamos tão mal quanto Singapura esteve no passado, ou seja, está mais do que provado que nosso problema não é impossível de resolver, basta querermos.

    Não concordo sobre criar moradias somente para a população pobre, o ideal seria concentrar diversas classes sociais (classe baixa, média e média-alta), e isso sim eu chamo inclusão social. Porém somente pessoas que respeitam esse tipo de região (e sei muito bem do que estou falando).

    Abraços!

  11. Prezada Raquel,

    Existe no ar uma questão muito importante e que não foi ainda comentada que é a dimunição dos recursos do Governo Federal para a Urbanização Integrada das Favelas, no Brasil, priorizando a destinação dos recursos para a produção de unidades habitacionais. (No PPA federal para o periodo de 2012-2015 não aparece o quesito urbanização integrada de assentamentos precários).
    É sabido que em inumeras cidades no país não há disponibilidade de terras, digo espaço, para a construção de um número de unidades que dê conta do deficit quantitativo que dirá do qualitativo, portanto o que nos parece é que a urbanização das favelas que hoje são territorios por vezes bastante consolidados, ficará a cargo dos municipios que nem sempre tem recurosos disponiveis para as ações desta natureza, pois em vários casos envolvem grandes obras, tanto para implantação de saneamento ambiental como para conteções de encostas.
    A figura do mutirão volta a cena em muitas discussões, ação que foi deixando de acontecer por inúmeros motivos, inclusive pelo alcance e pela durabilidade dos serviços e inexistência de projetos que balizem as intervenções.
    O que enxerga neste ambito?

    Abs Viviane M. Rubio

  12. Maravilha essa iniciativa.Melhor ainda se eu conseguir como uma grande obra divina, uma dessas moradias. Deus é pai.

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