Por que os espaços e objetos públicos são depredados?

O que leva os moradores de nossas cidades a cometerem atos de vandalismo e depredação de patrimônio público? De escolas a orelhões, passando por pontos de ônibus, transporte público em geral, cabos de iluminação, lixeiras e até monumentos e esculturas, a destruição é sistemática e recorrente. Anos atrás, a revista Problemas Brasileiros, do Sesc SP, publicou uma matéria que traz alguns dados impressionantes sobre essa questão. Embora não sejam informações atualizadas, elas dão ideia da dimensão do problema.

De acordo com a matéria, 25% dos “orelhões” da empresa Telefônica são destruídos todos os meses no Estado de São Paulo. A manutenção mensal consome R$ 1,2 milhão na recuperação dos aparelhos. No Rio de Janeiro, a prefeitura gasta R$ 200 mil todos os anos para repor partes de monumentos ou repor placas. Para se ter uma ideia, de 2002 a 2009 os óculos da estátua do poeta Carlos Drummond de Andrade, que fica em Copacabana, foram furtados sete vezes.

Em Curitiba, nos primeiros seis meses de 2009, 11.285 ônibus tiveram suas janelas riscadas, gerando um custo de reposição de R$ 2,6 milhões. No mesmo período, as estações tubo tiveram um prejuízo de cerca de R$ 115 mil por conta da depredação. Em todo o ano de 2008 o sistema gastou R$ 350 mil para repor vidros, catracas, elevadores, corrimões e portas. Na cidade de São Paulo todos os meses 20% dos pontos e abrigos de ônibus são danificados. O custo mensal da manutenção desses equipamentos, em 2009, foi de R$ 600 mil de acordo com a SPTrans.

O vandalismo também atinge o sistema de iluminação pública. De acordo com a reportagem, todos os meses 150 quilômetros de cabos usados na iluminação da capital paulista são furtados e 300 lâmpadas são substituídas diariamente. Nem os bueiros estão a salvo: 500 peças são roubadas mensalmente. Além disso, todos os meses desaparecem 400 placas de trânsito da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET).

Por que isso acontece? A explicação mais recorrente que encontrei explorando o tema atribui o vandalismo à falta de educação das pessoas, de cidadania etc. Embora seja verdadeira, essa explicação não é suficiente. Me parece que há uma relação estreita entre a qualidade urbanística de nossas cidades e a ocorrência de atos de vandalismo. O fato é que a qualidade geral das nossas cidades é péssima — elas são mal cuidadas, mal mantidas, em grande parte autoproduzidas e depois consolidadas de qualquer maneira, sem cuidado: essa situação provavelmente confere um não valor às cidades.

Outra dimensão que deve ser considerada é a qualidade e constância da manutenção dos espaços e equipamentos públicos. Um lugar como o parque Villa Lobos, em São Paulo, por exemplo, está sempre impecável. O metrô também está sempre limpo e bem mantido. Significa que não existe vandalismo e depredação nestes locais? Certamente, não. Mas a ação da administração desses espaços é rápida e permanente, o que provavelmente contribui para que haja menos depredação. Falta de educação e cidadania? Sim. Mas a cidade nos educa (ou deseduca também).

Texto publicado originalmente no Yahoo!Blogs.

19 comentários sobre “Por que os espaços e objetos públicos são depredados?

  1. A educação direcionada a cidadania precisa ser uma política de Estado e não de governos.
    Quanto a questão organizacional e de manutenção da cidade ser atrativa, pensando em São Paulo, por exemplo, existe a necessidade urgente da mudança da mentalidade de gestores higienistas para gestores sociabilizadores.

  2. Os espaços e objetos públicos são depredados porque são tratados como privados. Quando usados, as pessoas tem a ideia de que aquele espaço ou bem público é “seu” porque – mesmo que teoricamente – paga seus impostos ou é um cidadão com direitos. Contrario sensu, as pessoas se eximem de cuidá-los ou preservá-los exatamente porque são públicos e como tais, não são de propriedade/responabilidade de ninguém, senão “do governo” – ente virtual que também é negligente com suas obrigações!

  3. Penso que o hábito da usurpação da coisa pública desde as altas esféras faz com que muitos cidadãos não sinta que o público é de todos e tenha mais a impressão de que o público não pertence a ninguém.
    O desapego facilita o mal uso, o descaso, a depredação.

  4. Se tivessemos um planejamento urbano de alto nível, com mobiliarios urbanos, pisos, paisagismo,etc com um projeto arquitetonico de qualidade tenho certeza que não existiria tanto vandalismo. A depedração e o vandalismo acontecem porque a sensação é de que nossa cidade, a parte pública pelo menos, é de baixa qualidade.

  5. O que é meu é preservado… o que não é posso depredá-lo, roubá-lo. Casa de ladrão é roubada pelo próprio ladrão?

  6. Raquel, alguma palavra sobre a confirmação da indicação do PP do Maluf para a habitação? Afinal, você se engajou diretamente na campanha do Haddad, convenceu muita gente imagino, agora isso.

  7. Nasci em uma cidade de fronteira- guajara-mirim, do lado da bolivia os bancos das praças são os mesmos desde minha infancia ja no lado de cá… faz tempo não existem mais. Atribuo esse zelo pela coisa publica pelo excessivo civismo- sentem orgulho de sua nacionalidade e de suas coisas (diferente do que a maioria dos brasileiros pensam sobre eles)

  8. Urbanismo deveria ser aprendido desde cedo na escola! São lamentáveis as deformidades na cultura geral urbana do apreço pelo bem público. Mas também há o descaso do próprio poder público quando o assunto é planejamento e manutenção desses espaços. Precisamos de gestores realmente engajados na vigilância desses bens que façam com que a população perceba que a cidade é dela, e não de meros administradores
    de “gabinete”, apenas peocupados com o próprio tempo de gestão e com a “cadeira” de cargos públicos. Muitos deles sequer comprometidos com a qualidade de seu trabalho e com a vida da população. Também é preciso que haja cidadãos esclarecidos que se empenhem numa “contracultura” em mostrar que as leis não são inócuas! Isto está contido dentro de uma “ampla reforma política”. Corrigir vícios “eleitoreiros” e a sucessão de más gestões públicas, pode ser um caminho, pois isso inclui, infelizmente, a má educação pública!

  9. Cara Raquel, acho que uma dimensão importante a ser observada diz respeito ao não-pertencimento à cidade, ou como também poderíamos chamar de ausência de um sentimento de coletividade. Para mim, me parece que esse fenômeno está relacionado com as inconsistências dos aspectos relacionados com o exercício de uma vida pública. Acho que um bom caminho para uma boa interpretação do fenômeno caminha nessa direção. Com todo respeito aos leitores que ainda insistem em questionar a qualidade do planejamento urbano, afirmo; o problema não é técnico e sim político.Logo, o problema do planejamento urbano não reside na sua qualidade, e sim na gerência políticas dos processos de decisão e gestão urbana.

    Cordialmente,

  10. Meu pai conta que demorou um pouco para que as pessoas se acostumassem a não jogar lixo no chão dos Shoppings..que no começo, quando uma pessoa que jogava um lixo, logo vinha uma outra pessoa responsável pela limpeza para recolhe-lo, conforme orientado pelos donos. Depois de um tempo, vendo sempre limpo, as pessoas se acostumaram..formaram uma “cultura”.

  11. O livro “A CABEÇA DO BRASILEIRO”, do cientista político Alberto Almeida, mostra alguns pontos que explicam porquê os espaços públicos são depredados. O brasileiro não tem espírito público, diz o escritor, o que dificulta sua compreensão de que o que é público também é seu. Para ele, o que é público é do governo, cada um cuida do que é seu e o governo cuida do que parece não ser de ninguém.

  12. Pelo coment. do Lorenzo:

    Vamos incluir a todas alternativas acima: “Mais amor, por favor” ao Brasil!

    Grata. Nac♥

  13. Bom, o comentário do Antonio Carlos R. Furtado.

    Urbanismo deveria ser ensinado nas escolas do segundo grau.

    No mais, diria que brasileiro sofre da cultura do individualismo. No plano pessoal o cidadão move uma montanha para fazer valer seus direitos. Mas no plano coletivo, não levanta da cadeira. Aliás ‘direitos’ são uma palavra pronunciada quase que diariamente na mídia enquanto ‘deveres’ nunca são lembrados.

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