Queremos uma virada cultural pra valer

No último fim de semana, a população de São Paulo e do Rio de Janeiro contou com uma grande opção de atividades artísticas e culturais, graças à realização da Virada Cultural e do Viradão Carioca.

Em sua 8ª edição, o evento paulistano atraiu mais de 4 milhões de pessoas às 900 atrações espalhadas em mais de cem locais da cidade, a maior parte concentrada na região central. A programação da Virada Cultural começa sempre às 18h de sábado e termina às 18h de domingo, com programação ininterrupta e metrô aberto durante toda a madrugada para atender o público.

Já no Rio de Janeiro, cerca de 300 mil pessoas compareceram a um dos quatro palcos espalhados pela cidade para assistir a uma das 60 atrações programadas para a 4ª edição do Viradão Carioca. Foram dois palcos na Zona Sul – um em Copacabana, outro no Arpoador -, um na Zona Oeste, em Bangu, e outro na Zona Centro-Norte, na Quinta da Boa Vista. Diferentemente de São Paulo, a programação na capital carioca começa na sexta-feira e termina no domingo, com intervalos.

Obviamente que programação cultural farta e gratuita, ocupando ruas e espaços públicos – livres dos carros – com transporte coletivo 24 horas, é um sonho… Mas um megaevento artístico que ocupa a cidade durante apenas um dia, ou um fim de semana, é mesmo uma virada cultural?

No caso de São Paulo, o desafio da nossa cultura é ocupar a cidade permanentemente, de forma segura e heterogênea. A arte, com sua capacidade de deslocar sentidos, produz reflexão, rebeldia, transformação. Mas essa capacidade de promover mudanças de fato na cultura urbana só é possível se não estiver confinada a um único evento, em um único dia. Uma política permanente que abra espaço para a ocupação artística da cidade é que seria de fato uma grande virada cultural.

A verdadeira Virada Cultural acontecerá quando espaços públicos como a Praça Roosevelt forem bem tratados

Essa semana a prefeitura anunciou oficialmente que remanejará R$ 2,8 milhões que seriam usados para a reforma da Praça Roosevelt para a realização da Virada Cultural de São Paulo. Mas o que mais chamou a atenção foi o valor total da verba destinada à reforma da praça: quase R$ 20 milhões.

Me parece um valor altíssimo para um projeto discutível, que inclusive está gerando bastante controvérsia. Tenho recebido vários emails de ouvintes e comentários aqui no blog questionando, por exemplo, a destruição do pentágono. Uma dessas mensagens diz inclusive que isso poderá gerar sérios problemas, já que o pentágono tem uma função estrutural na obra.

Isso me leva a pensar que a verdadeira Virada Cultural de São Paulo acontecerá no momento em que os espaços públicos da cidade, especialmente os que têm grande importância cultural, como é o caso da Praça Roosevelt, forem tratados de forma muito diferente da que vem sendo feita.

Ações absolutamente simples e prosaicas, como limpeza, manutenção, cuidado, segurança, iluminação, que não são caras e fazem um enorme bem para os usuários da praça e cidadãos dessa cidade, poderiam ser feitas. Mas em vez disso, a praça fica largada enquanto se discute há 10 anos um projeto de reforma caro e mirabolante.