A cada remoção, uma nova ocupação

Por Raquel Rolnik

Estamos vivendo uma emergência habitacional em São Paulo, como não se via há mais de uma década, pelo menos. Em outras palavras, por absoluta falta de acesso à moradia no mercado formal, e diante da ausência absoluta de políticas públicas para este segmento da população, estão se multiplicando as ocupações e os novos assentamentos, tanto nas periferias quanto nos edifícios abandonados de bairros centrais.

A afirmação do título não é vazia: por conta do trabalho que a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo vem desenvolvendo, via Observatório de Remoções, em conjunto com outras entidades e coletivos no Fórum Aberto Mundaréu da Luz, soubemos de pelo menos uma família que, depois de ser removida da sua casa, na quadra 36, região dos Campos Elíseos, pelo governo do Estado e diante de nenhuma alternativa concreta de onde morar, instalou-se no edifício Wilton Paes de Almeida. O edifício, quando construído, foi um marco na arquitetura e engenharia brasileiras. O arquiteto Roger Zmeckol concentrou todo o peso de sua estrutura em apenas alguns pontos centrais, podendo assim implantar a primeira fachada inteiramente de vidro da cidade. O prédio, inaugurado em 1968, foi sede de várias empresas, até que seus proprietários endividados acabaram cedendo o edifício para a União. Desocupado, transformou-se em casa para mais de 300 pessoas quando desabou na madrugada da última terça-feira, 1º de maio.

Assim como essa, muitas outras famílias que habitam a região central da cidade estão perdendo suas moradias. Pontualmente chamo a atenção para aquelas famílias moradoras das quadras 36, 37 e 38, área em que, por meio de uma Parceria Público-Privada (PPP), vai ser construído o novo Hospital Pérola Byington. De acordo com o Plano Diretor de São Paulo, esta região é uma Zona Especial de Interesse Social (ZEIS), e portanto destinada à produção ou à melhoria de habitações sociais.

A recusa ao cumprimento da lei, e ao diálogo com os cidadãos, acontece neste momento em que é fundamental ampliar a política social, de apoio à moradia. Mas o que tem acontecido é o oposto: a retração dos investimentos públicos, aliada a uma política de remoções que não oferece nenhuma alternativa sustentável, de longo prazo às famílias. Com isso, para onde mais poderiam ir as pessoas que são forçadas a sair de suas casas? Que fique bem claro: cada remoção é estímulo para uma nova ocupação. E a resposta do Estado? Por enquanto, criminalizar os que mais sofrem.

Esse assunto foi tema da minha coluna “Cidade para Todos”, na Rádio USP.  Ouça aqui.

Vila Autódromo: remoção e eleições

Na última quinta-feira (16), moradores da Vila Autódromo, no Rio de Janeiro, entregaram ao prefeito Eduardo Paes uma proposta de urbanização que demonstra não haver incompatibilidade entre a construção do futuro Parque Olímpico do Rio, a existência da comunidade e a preservação ambiental da Barra da Tijuca, onde esta está localizada. Por conta dos Jogos Olímpicos, a Prefeitura pretende remover as cerca de 500 famílias que moram no local há mais de 40 anos e reassentá-las em um conjunto habitacional a ser construído com recursos do Programa Minha Casa, Minha Vida.

Conhecido como “Plano Popular da Vila Autódromo”, o projeto foi desenvolvido numa parceria entre a Associação de Moradores da comunidade e professores e alunos da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e da Universidade Federal Fluminense (UFF). No processo de elaboração foram realizadas três oficinas, seis assembleias, e diversas reuniões com os moradores.

Tecnicamente, o plano está dividido em quatro programas: habitação; saneamento, infraestrutura e meio ambiente; serviços públicos; e desenvolvimento cultural e comunitário. O programa habitacional, por exemplo, prevê unidades de tamanhos variados, algumas com possibilidade de ampliação, o que permite levar em conta as especificidades de cada família.

As questões ambientais, muito usadas como argumento para a remoção da comunidade, também foram incluídas no plano, que prevê, entre outras coisas, uma área de recuperação ambiental da Faixa Marginal da Lagoa de Jacarepaguá e da Beira de Córrego de 23 mil m². Com relação aos serviços públicos, a plano propõe a inclusão da comunidade no programa Saúde da Família e a construção de uma creche e de uma escola municipal. Também foi planejada a criação de novas áreas de esporte e lazer.

Para os moradores, o plano mostra que, tanto do ponto de vista técnico como financeiro, é possível manter a comunidade no local, sem qualquer prejuízo para a realização dos megaeventos esportivos. Financeiramente, inclusive, o plano é bem mais vantajoso do que a proposta de reassentamento da Prefeitura. Enquanto a proposta da comunidade está orçada em R$ 13 milhões, a da Prefeitura custa R$ 38 milhões.

Então por que insistir na remoção? Quais são os argumentos que a justificam? Infelizmente, o prefeito Eduardo Paes não se comprometeu nem com a proposta apresentada, nem com a permanência da comunidade, tampouco apresentou justificativas para a remoção. Ele apenas disse que encaminharia o plano às secretarias competentes, mas que nada seria feito antes dos 45 dias que correspondem ao período eleitoral para que não haja uso político da situação. Qual poderia ser o possível “uso político” da situação?

A Prefeitura do Rio tem em mãos um projeto que, se adotado, poderia servir de modelo para vários casos semelhantes não apenas no Brasil, mas no mundo. E mostraria que, no Brasil, os megaeventos não precisam, necessariamente, atender apenas aos interesses do mercado e de seus patrocinadores, podendo se transformar em oportunidade de enfrentamento de dívidas sócio-ambientais acumuladas há décadas em nossas cidades. Sem dúvida, esta atitude seria aclamada pelos moradores e por todos que lutam pelo direito à moradia. A pergunta então é: o que o prefeito perderia – em momento eleitoral – ao afirmar e reconhecer estes direitos?

Vila Autódromo: um bairro marcado pra viver

Compartilho abaixo um manifesto do Comitê Popular da Copa e das Olimpíadas do Rio de Janeiro sobre a Vila Autódromo, uma das comunidades ameaçadas de remoção no contexto da preparação da cidade para os megaeventos. Para assinar o manifesto, clique aqui.

Vila Autódromo: um bairro marcado para viver

Por COMITÊ POPULAR DA COPA E DAS OLIMPÍADAS DO RIO DE JANEIRO

Foto: Dario de Dominicis / Agência Olhares

“Desde o anúncio da realização da Copa e das Olimpíadas no Brasil, os moradores da Vila Autódromo se tornaram alvo de ameaças de remoção. Não é a primeira vez. Esta comunidade está situada em zona que, com o processo de expansão da cidade, tornou-se alvo da cobiça de especuladores e grandes construtoras. Seus moradores aprenderam a resistir, afirmando seu direito à moradia diante do poder do mercado imobiliário aliado aos sucessivos governos.

A ocupação da Vila Autódromo é legal, resultado de décadas de organização dos moradores para a urbanização do bairro. O direito à moradia é garantido pela Constituição Federal, e expresso na Concessão de Direito Real de Uso dada a moradores da comunidade pelo Governo do Estado.

Na preparação dos Jogos Panamericanos, a Prefeitura condenou o bairro à morte. A resistência dos moradores mostrou que na cidade democrática instalações esportivas podem conviver com moradia social. Anunciadas as Olimpíadas no Rio de Janeiro, veio nova condenação: a comunidade ameaçaria a segurança dos atletas. Rapidamente veio a público que a Vila Autódromo é um dos poucos bairros populares da cidade que não está submetido a traficantes ou milícias. Não hesitaram em inventar um argumento ecológico, alegando a necessidade de remoção para preservar as margens da Lagoa de Jacarepaguá. Os moradores mostraram que é possível a recuperação ambiental, sem destruir as casas.

A Prefeitura mentiu novamente ao dizer que a remoção é fundamental para os Jogos Olímpicos: o projeto vencedor de concurso internacional para o Parque Olímpico manteve a comunidade. Em mais uma tentativa, apresentou um projeto viário, alterando a rota da Transcarioca já em obras (e com várias irregularidades no licenciamento ambiental), somente para passar por cima da comunidade. Com a mudança constante de pretextos, a Prefeitura pretende legitimar a remoção de 500 famílias, e a cessão, para o consórcio privado Odebrecht-Andrade Gutierres-Carvalho Hosken, de uma área de 1,18milhões de m2, dos quais 75% serão destinados à construção de condomínios de alta renda.

Como alternativa à injusta, injustificável e ilegal tentativa de remoção, a Associação de Moradores da Vila Autódromo elaborou o Plano Popular da Vila Autódromo, com a assessoria técnica de especialistas. O Plano é técnica e socialmente viável, e garante condições adequadas de moradia e urbanização. É uma realização da cidadania. Na Grécia antiga onde nasceram as Olimpíadas, eram banidos das cidades os tiranos, e não os cidadãos. Estes reuniam-se na praça pública, a Ágora, para decidir seus destinos e os destinos de suas cidades. Que o espírito olímpico reine na cidade maravilhosa. Que a Vila Autódromo, as comunidades e bairros ameaçados de remoção e toda a população da cidade participem das decisões.

A campanha pela sobrevivência da Vila Autódromo é uma luta de seus moradores, mas é também, e sobretudo, uma luta de todos por uma cidade justa e igualitária. Nos últimos meses, milhares de famílias foram compulsoriamente removidas ou estão ameaçadas em nome da Copa do Mundo e das Olimpíadas: Restinga, Vila Harmonia, Largo do Campinho, Rua Domingos Lopes, Rua Quáxima, Favela do Sambódromo, Morro da Providência, Estradinha, Vila Recreio 2, Belém-Belém, Metrô Mangueira, Arroio Pavuna.

Convidamos todos os cidadãos e cidadãs a dizer: PAREM AS REMOÇÕES! Apelamos à sensibilidade e responsabilidade das autoridades governamentais, da Prefeitura do Rio de Janeiro, da FIFA e do Comitê Olímpico Internacional para que as medalhas entregues aos atletas da Copa do Mundo 2014 e dos Jogos Olímpicos 2016 não sejam cunhadas com o sofrimento e a dor de milhares de famílias expulsas de suas casas e de suas vidas”.

Viva a Vila Autódromo!
Vivam todas as comunidades populares da Cidade do Rio de Janeiro!

PARA TER ACESSO AO MANIFESTO E PARTICIPAR ASSINANDO CLIQUE NO LINK ABAIXO:
http://www.portalpopulardacopa.org.br/vivaavila/index.php/manifesto

Remoção de parte da Vila Autódromo, no Rio: não existe outra alternativa?

Na última quarta-feira, a juíza Cristina Aparecida de Souza Santos emitiu sentença na qual determina a remoção de parte da comunidade da Vila Autódromo, situada próxima à lagoa de Jacarepaguá, no Rio de Janeiro. Com a justificativa de fazer cumprir a legislação ambiental, a Justiça do Rio pode estar ajudando a produzir novas ocupações em áreas de risco e de preservação.

Os problemas da Vila Autódromo poderiam ser resolvidos com a implementação de um projeto urbanístico que eliminasse a situação de risco e vulnerabilidade e melhorasse as condições ambientais da comunidade e de todo o seu entorno. Em vez disso, a Justiça autoriza as remoções, sem compromisso com uma solução habitacional que respeite o direito à moradia adequada da população que será atingida.

Desde os Jogos Panamericanos a comunidade da Vila Autódromo vem resistindo às ameaças de remoção. O fato é que ela está localizada na área onde será implantado o projeto olímpico, assim como ações de urbanização e reestruturação imobiliária. Para os interesses empresarias envolvidos na construção e remodelamento da região, as comunidades precisam ser removidas porque elas representam um empecilho à “limpeza” da área. E a prefeitura absorve e adota essa posição como diretriz ao afirmar que essas comunidades têm que ser removidas e não urbanizadas.

O pior de tudo é que não há debate público sobre o assunto. O projeto Olímpico, assim como o da Copa, não está sendo objeto de discussão pela sociedade. Assim, outras possibilidades de projetos, inclusive aqueles que contemplariam a urbanização dessas áreas, não puderam ser elaborados, nem expostos, nem muito menos debatidos ou levados em consideração. É de um extremo autoritarismo fechar todos os projetos para as Olimpíadas e a Copa sem nenhum debate público, com interlocução do governo apenas com o setor empresarial.

Remoções forçadas devido a projetos de desenvolvimento – como respeitar o direito à moradia?

Há projetos de infra-estrutura e urbanização sendo desenvolvidos todos os dias em nosso país. Mas os impactos podem ser particularmente intensos quando é necessário remover famílias de suas casas.

É viável preservar o direito à moradia adequada dessas pessoas. E há normas internacionais de direitos humanos, ratificadas pelo Brasil, que definem essa obrigação e devem ser respeitadas em qualquer circunstância.

A Relatoria da ONU para o Direito à Moradia Adequada preparou um folheto para que a população conheça seus direitos e saiba a quem recorrer no caso de remoções forçadas.

Também desenvolvemos um guia destinado a autoridades e gestores públicos, técnicos de engenharia e arquitetura, empresários do setor imobiliário e construtoras, que sintetiza as normas internacionais sobre remoções forçadas e contém orientações e dicas para todos os envolvidos.

O folheto e o guia podem ser divulgados reproduzidos livremente. Inclusive há espaço para colocar o logo de entidades que quiserem imprimi-los.

FOLHETO

Para ver na tela do computador, clique aqui. Para baixar o arquivo, clique aqui.

GUIA

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Há também versões em inglês, espanhol, francês e árabe deste material.

Reforma da zona portuária do Rio para Olimpíada é chance para equacionar acesso à moradia na região

Farei alguns comentários mais detalhados sobre o plano para a zona portuária do Rio, que pode ficar bastante interessante.

É uma discussão que já se arrasta há muitos anos no Rio, por ser uma área com enorme potencial de renovação. Inclusive porque lá mais de 70% dos terrenos são de propriedade pública. A maior parte é do Governo Federal, em função do Rio de Janeiro ter sido a capital federal, e também porque muitos terrenos pertencem ao Porto do Rio, que também era de propriedade federal e agora se transformou bastante.

A proposta para revitalizar a zona portuária começou a acelerar. O prefeito Eduardo Paes apresentou uma proposta, que se chama “Porto Maravilha”, e enviou três Projetos de Lei para a Câmara Municipal.

Um altera o Plano Diretor, outro cria uma Operação Urbana para permitir a venda de potencial construtivo para poder realizar obras públicas, a exemplo do que foi feito em São Paulo, nas Águas Espraiadas e na Faria Lima. E o terceiro cria uma companhia de desenvolvimento, uma empresa de economia mista pra cuidar do porto, das obras e da gestão dessa área.

Essa companhia mista poderia ter a participação do Governo Federal e do Governo Estadual, sob a forma de terrenos, e da Prefeitura, sob a forma de venda de potencial construtivo.

A zona portuária é uma área histórica importantíssima para o Rio de Janeiro. Há um grande patrimônio histórico ali, como o Mosteiro de São Bento, que data do início do século XVIII, e o Morro da Conceição, que é uma das primeiras áreas ocupadas no Brasil, além do primeiro arranha-céu da América Latina, o edifício “A Noite”, construído nos anos 20, e muitos outros elementos históricos importantes.

Também há 14 comunidades de moradores que vivem nessas áreas. Pelo que pude ver nos planos, está prevista a construção de edifícios altos, que podem chegar a até 40 pavimentos. Mas nas não vi ainda qual será o destino das pessoas que estão lá. E já notei repercussões no Rio reclamando da falta de discussão pública desse projeto, já que ele está tramitando na Câmara e está sendo aprovado a toque de caixa. Há um certo receio sobre como é que esse projeto vai atender a várias questões colocadas no espaço.

A área hoje tem 22 mil habitantes e a previsão é que ela passe para 100 mil habitantes, o que é super positivo, ter mais gente morando na zona portuária. Mas a questão é quem, como, como é que isso pode ser feito para incluir as várias faixas de renda e o que vai acontecer com quem está lá.

O Rio de Janeiro estabeleceu uma relação muito positiva entre Prefeitura, Estado e Governo Federal para tocar essas obras, e isso é muito bom. Também tem planos e propostas de intervenção. Mas alguns pontos estão desconectados e precisamos ver como é que serão feitos.

Por exemplo, fui procurar um número mais preciso sobre as favelas instaladas na Barra da Tijuca. São mais de 63 comunidades, mais de 30 mil pessoas moram lá, e eu olhei e re-olhei os planos, vi as propostas para o saneamento, para o transporte, de onde vêm os recursos, mas eu não vi o que será feito em relação a essas comunidades.

Tenho um pouco de receio, porque é  tipo de pressão que ocorre muito no Brasil. Quando aparece uma oportunidade dessas, alguns poucos saem correndo para se aproveitar, para ganhar muito dinheiro, fazer seus empreendimentos, e os interesses públicos mais gerais da cidade acabam indo pra trás.

Mas o Rio de Janeiro está com uma oportunidade na mão enorme para fazer diferente. E acho que nós temos que acreditar que pode ser diferente, e precisamos acompanhar esse processo.

Centro da Olimpíada será na Barra e moradores de favelas estão apavorados com projeto de remoção

Vamos falar um pouco sobre o plano básico para a Olimpíada de 2016, como as regiões do Rio de Janeiro serão afetadas e os principais desafios para a implementação das mudanças de infra-estrutura na cidade.

Todos nós estamos torcendo para que o Rio aproveite ao máximo essa oportunidade, para que possa não apenas acolher os jogos olímpicos com qualidade e organização, mas também promover mudanças importantes na cidade maravilhosa, para que ela possa ficar mais maravilhosa ainda e enfrente seus problemas, que não são poucos.

As obras para os jogos olímpicos vão tomar lugar principalmente na região da Barra da Tijuca. Para quem não conhece o Rio, seguindo pelo litoral, há Copacabana, Ipanema, Leblon e, depois, chega-se na Barra.

Do ponto de vista urbanístico, a Barra da Tijuca funcionou como uma espécie de zona de expansão urbanística da zona sul, com o mesmo tipo de uso, grupo social e produto imobiliário dessa região, embora ela se situe mais a oeste. Antes dessa grande expansão imobiliária, já havia ali o Rio Centro, uma área de convenções.

Vários equipamentos esportivos e a Vila Olímpica serão construídos ali na Barra. Mas como isso será feito?

A Vila Olímpica é um projeto privado, em um terreno privado, de uma construtora, com financiamento garantido pelo governo federal. Essa construtora fará os apartamentos que serão utilizados durante a Olimpíada e depois eles serão vendidos no mercado. Um modelo semelhante ao adotado na Vila do Pan.

Temos algumas questões que precisam ser enfrentadas na Barra. Primeiro é a questão do saneamento. Por incrível que pareça, a Barra, vendida como lugar chique, bacana e etc, até hoje não tem rede de esgoto. É um lugar que precisa melhorar muito do ponto de vista ambiental.

A segunda questão é a mobilidade para chegar na Barra, que hoje é complicada, congestionada, difícil.

Mas vou focar em outro assunto. A Barra é hoje um dos lugares do Rio com mais apartamentos vazios,  construídos mas não ocupados. E isso significa um desafio enorme sobre como esses apartamentos da Vila Olímpica serão vendidos. É uma quantidade muito grande, será que tem mercado para isso? Não irá virar um lugar fantasma depois dos jogos? São indagações necessárias.

Também há naquela região mais de 20 favelas instaladas. Todas estão neste momento absolutamente apavoradas com a perspectiva de remoção, já que o projeto apresentado para as Olimpíadas propõe a retirada de várias comunidades, como Pedra Branca, Restinga, Cortado, Vila do Autódromo e Canal do Anil.

Na época do Pan já havia a proposta de retirá-las. Mas elas resistiram, inclusive judicialmente, defendendo seu direito de permanecer lá e muitas acabaram não saindo. Agora isso será novamente colocado.

É uma questão delicada, que precisa ser tratada com muito carinho, pois qualquer remoção implica, do ponto de vista do direito daquelas pessoas, em um reassentamento adequado, para que na prática não acabem surgindo outras favelas.

*O jornalista Luis Megale acrescentou outra informação. Metade dos apartamentos construídos para a vila dos Jogos Pan-americanos está desocupada. Não são apartamentos caros, ficam na região de Jacarepaguá, custam pouco mais de 100 mil reais, mas nem metade foi vendida.

Vídeo do seminário sobre remoções em grandes projetos de desenvolvimento

Coloco abaixo o vídeo do seminário “Remoções em Grandes Projetos: e o Direito à Moradia Adequada?“, realizado na Faculdade de Arquitetura da USP na última sexta-feira, 2.

Estavam na mesa Luiz Gonzaga Xipaia de Carvalho, da Comunidade Indígena de Altamira (PA), afetada pela construção da hidrelétrica de Belo Monte, Ewerton Benedito da Costa Libório, representante do Movimento dos Ameaçados por Barragens e membro de Comunidade Quilombola (Vale do Ribeira, SP), Marcelo Edmundo Braga, da Central dos Movimentos Populares (RJ) e Evaniza Rodrigues, da União dos Movimentos de Moradia (SP).

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Poder público não pode remover famílias de seus lares sem oferecer uma alternativa digna

Remoções de famílias sempre geram muita polêmica em São Paulo. Nesta semana, tivemos duas manifestações, uma na Favela do Sapo e outra na região da Luz. A questão que está em jogo é como o poder público tem feito as remoções.

Evidentemente, todo nós desejamos que nossa cidade não tenha mais favelas, com moradias precárias, à beira do córrego, sujeita a inundações. Queremos moradia digna para todos os paulistanos. Mas como isso deve ser feito?

Vamos tomar como exemplo a Favela do Sapo, instalada à beira de um córrego que deságua no Tietê, próxima à ponte da Freguesia do Ó. Ela será objeto de intervenção urbanística no âmbito da ampliação da Marginal do Tietê e da operação urbana Água Branca.

Lá moram mais de 400 famílias, das quais 87 serão transferidas para moradias a serem construídas na região. As demais estão recebendo passagem para voltar para sua cidade natal ou o chamado cheque despejo, de no máximo 5 mil reais, que não é suficiente nem para comprar um barraco em outra favela.

Há pouco tempo o poder público removeu a Favela da Paz, que ficava na ponte da Anhanguera, e a Favela Aldeinha, perto da ponte Julio de Mesquita Neto. Muitas famílias removidas que receberam então o cheque despejo acabaram se instalando na Favela do Sapo. Em vez de pensar numa solução definitiva, a prefeitura empurra a situação com a barriga e vão se formando novas favelas.

O mesmo ocorre na discussão da Luz, onde houve protestos de comerciantes e moradores contra a “Operação Saturação”, que tem interditado cortiços e pensões. Estou de acordo que cortiços e pensões sem condições de salubridade e segurança devem ser transformados. Mas e o que acontece com as famílias que estão vivendo lá?

A proposta da prefeitura, de colocar as famílias em abrigos, não é uma proposta decente nem digna para elas. Não podemos tirar as pessoas sem, ao mesmo tempo, equacionar a situação da moradia. Infelizmente, porém, acaba predominando a mão pesada de fazer as coisas sem participação e sem considerar os vários aspectos envolvidos simultaneamente.