Em tempo: O que esperar do novo Ministério das Cidades 2

Segunda-feira publiquei em minha coluna no Portal Yahoo! um comentário sobre o Ministério das Cidades, analisando as expectativas que podemos ter para a área do desenvolvimento urbano com base nas primeiras declarações do novo ministro, o deputado Bruno Araújo (PSDB).

Ontem, com a notícia da primeira medida oficial tomada pelo ministro, a revogação de portarias publicadas pela presidenta Dilma Rousseff relacionadas à modalidade “entidades” do Programa Minha Casa Minha Vida, sob a justificativa de readequar o orçamento da União, percebemos que começa a se delinear de fato a política dessa gestão interina.

Para quem não conhece, o Minha Casa Minha Vida – Entidades obedece aos mesmos procedimentos da modalidade “Construtoras” do programa. Só que são associações e cooperativas de moradores – geralmente da área rural ou ligadas a movimentos sociais urbanos – que elaboram e aprovam os projetos, compram os terrenos e contratam construtoras para produzir os conjuntos (às vezes parte das obras é executada através de mutirões).

É importante destacar que essa modalidade é voltada exclusivamente para a faixa de renda 1 – ou seja, a parcela mais pobre da população – e que consome apenas 1% dos recursos totais destinados ao programa.

E como os integrantes das cooperativas são os próprios beneficiários das novas moradias, que não precisam lucrar com as obras, ao contrário das incorporadoras, muitas vezes se consegue, com os mesmos recursos, elaborar projetos de habitação maiores e de melhor qualidade.

Além disso, a modalidade Entidades consegue enfrentar com mais sucesso um dos problemas mais graves do programa, que é a gestão dos condomínios depois de prontos e entregues. Como os moradores já estão previamente organizados em cooperativas ou associações, a capacidade de realizar essa gestão é muito maior.

Como se pode perceber, o argumento de “readequação de custos” não faz o menor sentido, já que se trata de uma modalidade que consome apenas 1% do total dos recursos do programa. Além de falacioso em sua justificativa, esse ato prejudica a população mais pobre, já que o MCMV Entidades atende justamente famílias na faixa 1 de renda.

Não tendo grandes impactos nos cortes de gastos e muito menos correspondendo à anunciada diretriz do governo interino de focalizar suas ações na população mais pobre, qual é então a motivação para revogar as portarias da presidenta? Trata-se de postura puramente ideológica, apesar de o ministro ter declarado que se empenharia em desfazer “amarras ideológicas”.

Isso sinaliza que sua gestão não permitirá que subsista absolutamente nada que não seja 100% rentável para o mercado.

Portaria que regulamenta remoções é tema de consulta pública do Ministério das Cidades

Até o dia 23 de maio, está aberta no site do Ministério das Cidades uma consulta pública sobre os procedimentos que devem ser adotados por prefeituras e governos estaduais em casos de remoções causadas por obras públicas financiadas pelo Ministério, de forma a garantir o direito à moradia das pessoas afetadas. Após a consulta, tais procedimentos serão regulamentados por uma portaria cujo texto preliminar está disponível no site do Ministério. Clique aqui para acessá-lo.

Os interessados em participar devem preencher um cadastro no seguinte link: http://www4.cidades.gov.br/consulta_publica/src/sistema/index.

Vale a pena lembrar que, no âmbito da Organização das Nações Unidas, já existem vários textos que reconhecem o direito à moradia e, inclusive, definem critérios para a realização de remoções e despejos de forma a garantir este direito.

Na Relatoria da ONU para o Direito à Moradia Adequada, temos, desde 2007, os “Princípios básicos e orientações para remoções e despejos causados por projetos de desenvolvimento”. Além disso, publicamos, em 2010, a cartilha “Como atuar em projetos que envolvem despejos e remoções” e também o folheto “Querem nos despejar. E agora?”, que explicam os princípios básicos em linguagem acessível.

Além disso, em 1997, o Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da ONU, que monitora a implementação do Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC), do qual o Brasil é signatário, publicou o Comentário Geral nº 7, que trata de despejos e remoções forçadas.

Todos estes textos estão disponíveis no site da Relatoria, nos links abaixo:

Princípios básicos e orientações para remoções e despejos causados por projetos de desenvolvimento

Cartilha “Como atuar em projetos que envolvem remoções e despejos”

Folheto “Querem nos despejar. E agora?”

Comentário Geral nº7.

Não é fácil acessar os canais de informações oficiais sobre o Minha Casa, Minha Vida

Frenquentemente recebo comentários no blog e mensagens no meu email de pessoas em busca de informações sobre o programa Minha Casa, Minha Vida.

A Tânia Regina, por exemplo, quer saber qual o melhor site “para poder saber o andamento..” do programa. E o Luis Marcolino pergunta: “Porque não tem informação sobre o programa minha casa minha vida para as pessoas de baixa renda?”. A Andréa da Silva diz que se inscreveu no programa em 2009 e até agora não recebeu nenhum retorno do governo. Ela quer saber quanto tempo vai levar pra ter a resposta.

Estes são só alguns exemplos. Diante de tantos comentários e emails sobre o mesmo assunto, resolvi buscar informações sobre os canais disponíveis para atendimento ao público interessado no programa. A tarefa não é fácil. Logo de cara, o primeiro site que aparece na busca do google exibe um formulário para cadastramento no Minha Casa, Minha Vida 2.

Apesar de muito bem feito – simulei um cadastro e recebi um email automático de confirmação – , desconfiei do domínio, que não é governamental (www.minhacasaminhavida.com.br), e fui checar a informação com o Ministério das Cidades. Depois de me passarem para várias pessoas de diferentes setores, a assessoria de comunicação do Ministério me confirmou: o site é falso! Eles prometeram divulgar a fraude e alertar as pessoas sobre isso.

Na conversa com a assessoria do Ministério, descobri também que não existe um número de telefone ou site explicativo sobre o programa. Há informações dentro do site do Ministério, numa área escondida, difícil de acessar. A assessoria sugeriu que eu falasse diretamente com a Caixa Econômica Federal.

No site da Caixa as informações estão mais bem organizadas e são mais bem explicadas. Mas também não é muito fácil chegar até elas… Na parte inferior do site, há um quadro com “dicas para comprar um imóvel”.  Se a pessoa clicar no quadro, abrirá um pdf sobre o que você precisa saber antes de comprar o seu imóvel“. Mas se ela clicar no título do quadro, “minha casa, minha vida”, abrirá uma janela pop up, com um simulador do programa e uma cartilha explicativa em pdf.

Além dessas ferramentas, a Caixa disponibiliza um canal de atendimento por telefone através do número: 0800 726 0101. Enfim, deu para perceber que de fato não é uma tarefa fácil acessar os canais de informação sobre o programa. E, pra piorar a situação, as pessoas ainda precisam estar atentas às fraudes.

Cidades ignoram dispositivos para viabilizar moradia em área segura

No dia 17 deste mês, a Folha de São Paulo publicou em sua versão impressa uma interessante matéria, baseada em estudo encomendado pelo Ministério das Cidades, sobre a utilização dos instrumentos criados pelo Estatuto da Cidade para regular a ocupação do solo e viabilizar a produção de moradia de interesse social. Confira abaixo:

Cidades ignoram dispositivos para viabilizar moradia em área segura

Instrumentos criados pelo Estatuto da Cidade há 10 anos ainda não são utilizados, diz estudo

Em geral, eles permitem às prefeituras taxar de forma progressiva e até desapropriar imóveis que são subutilizados

CLAUDIA ANTUNES
DO RIO

A maioria dos municípios do país ignora os instrumentos criados há dez anos pelo Estatuto da Cidade para regular a ocupação do solo.

A lei federal, de 2001, cria dispositivos a serem usados pelas prefeituras para combater a especulação imobiliária e viabilizar moradias populares em áreas seguras.

Muitos imóveis atingidos pelos deslizamentos e cheias na região serrana do Rio ficavam em áreas de risco.

A conclusão é dos urbanistas que coordenaram estudo encomendado pelo Ministério das Cidades para avaliar 526 planos diretores no país -92 deles em SP e 28 no Rio.

No papel, até houve avanços, com a inclusão desses dispositivos nos planos diretores, mas menos de 20% deles preveem prazos para aprovar leis complementares que permitam a aplicação. Na maioria dos casos, essas leis não foram aprovadas.

“Existem raríssimos casos de aplicação efetiva dos instrumentos”, diz Orlando Alves dos Santos Jr., coordenador nacional do estudo.

Um dos instrumentos, as Zeis (Zonas Especiais de Interesse Social), é essencial para evitar que os mais pobres sejam empurrados para periferias urbanas e áreas de risco.

Ele reserva áreas no espaço urbano para casas populares e permite que famílias pobres morem perto do centro ou de locais estruturados.

Outros dispositivos ignorados são o Peuc (Parcelamento, Edificação ou Utilização Compulsórios) e o IPTU progressivo no tempo. Essas regras preveem taxações maiores com o passar do tempo e até a desapropriação de imóveis parados, à espera de valorização no mercado.

Anderson Kazuo Nakano, do Instituto Pólis, responsável pelo relatório paulista, aponta duas cidades em SP onde a aplicação das regras foi iniciada ou regulamentada: a capital e Santo André.

MINHA CASA, MINHA VIDA

O aquecimento imobiliário, com o aumento do crédito e o programa Minha Casa, Minha Vida, agravou a situação. Nas regiões metropolitanas, terras para moradias de famílias com renda de até três salários mínimos são raras e, em geral, na periferia.

Raquel Rolnik, relatora especial da ONU para o Direito à Moradia, afirma que prefeituras e Câmaras Municipais acabam não utilizando os dispositivos porque eles causam muito conflito com donos de imóveis e representantes do setor imobiliário.