No mês de março do ano passado, participei do “I Encontro Acadêmico Internacional Resíduos Sólidos Urbanos e seus impactos socioambientais”, organizado pelo Instituto de Eletrotécnica e Energias (IEE) da USP.
O evento aconteceu meses depois da promulgação da Lei 12.305, que trata da Política Nacional de Resíduos Sólidos, e contou com a participação de especialistas, docentes, pesquisadores de diversas áreas do conhecimento, representantes de órgãos governamentais e acadêmicos de universidades estrangeiras.
Como resultado do encontro, os organizadores produziram o livro “Resíduos sólidos urbanos e seus impactos socioambientais”, que reúne as transcrições das apresentações realizadas pelos participantes, organizadas tematicamente. Minha contribuição está no capítulo 2 da primeira parte da publicação.
Para acessar o pdf do livro, clique na imagem abaixo.
Recentemente, a ilha de Fernando de Noronha, em Pernambuco, foi tema de uma reportagem especial do Jornal do Commercio. Mas dessa vez o diário mostrou um lado desconhecido desse que é um dos mais belos cartões postais do nosso país: a precariedade em que vive a população da ilha.
Segundo a reportagem, o aluguel em Fernando de Noronha custa cerca de R$ 1000,00. Há mais de 300 moradores cadastrados junto à administração a espera de uma casa. Por conta do alto custo de vida, há famílias que alugam suas casas para turistas, como forma de arrecadar dinheiro, e passam a viver espremidas num quartinho de fundo.
Há também os que nem sequer têm uma casa ou um terreno para morar. Diante dessa situação, muitas famílias estão morando nas favelas de zinco da ilha. São iglus feitos de metal retorcido cujas paredes dão choque quando chove (veja o vídeo). Outras ocuparam um prédio público abandonado, chamado “Carandiru”, onde dividem poucos cômodos e um único banheiro.
Outro problema grave em Noronha, segundo a reportagem, diz respeito à coleta de lixo. Para se ter uma ideia, o navio que transporta o lixo de Noronha para o Recife carrega, por mês, cerca de 80 toneladas de dejetos. Mas o volume produzido na ilha mensalmente é o dobro disso. Ou seja, metade do lixo fica acumulado na usina da ilha, produzindo o chorume que ameaça de contaminação o solo e as praias vizinhas.
A reportagem fala ainda da situação precária da educação e da saúde na ilha e da total dependência da população da administração da ilha, mesmo nas questões mais básicas, como trocar telhas ou um vaso sanitário. Vale lembrar que Noronha é um distrito cujo administrador é indicado pelo governador de Pernambuco.
Para ler o especial “Noronha: o paraíso às avessas”, clique aqui.
Quando abordei a questão do acondicionamento, coleta e destinação do lixo aqui no blog na semana passada, recebi via twitter a informação de que na cidade de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, desde 2007 há um sistema de conteinerização e coleta mecanizada de lixo orgânico.
Segundo informações da Companhia de Desenvolvimento de Caxias do Sul (Codeca), o sistema começou com a disponibilização, nas ruas centrais da cidade, de 500 contêineres verdes para lixo orgânico e 500 amarelos para lixo reciclável.
Em 2010, a cidade já contava com 2,8 mil contêineres (1400 para lixo orgânico e 1400 para resíduos seletivos). Clique aqui para saber mais sobre o sistema implementado em Caxias do Sul.
Sobre o acondicionamento do lixo doméstico – debate que precisa ser aprofundado – a Simone Dias deixou aqui no blog algumas dicas interessantes para economizar no uso de sacolas plásticas. Veja abaixo:
No banheiro: tenha 2 latinhas de lixo, uma para recicláveis (embalagens, miolo do rolo de papel, etc.) e outra para o papel higiênico e demais itens sujos. Somente esta recebe um saquinho plástico, e como o papel é macio, pode ser compactado e o saquinho leva um tempão para encher.
Na cozinha: tenha também duas latas de lixo para separar o orgânico do reciclável. Novamente só a lata de orgânico recebe saco plástico, pois a de recicláveis recebe dejetos limpos, embalagens enxaguadas, etc. O mais importante: a lata de lixo deve ser grande e ter uma tampa boa, assim não sai cheiro ruim e não precisa trocar o saco o tempo todo.
Na lavanderia: aí ficam duas lixeiras grandes (60l), com capacidade para o lixo da semana, separados, claro. Fica bem arrumadinho se você compactar o lixo reciclável amassando latas e desmontando caixas.
Como eu já disse aqui antes, o debate sobre acondicionamento, coleta e destinação do lixo precisa ser feito de forma integrada. Senão, as dicas da Simone e o sistema implementado em Caxias do Sul continuarão sendo experiências isoladas.
O debate sobre a proibição da venda e distribuição das sacolinhas plásticas na cidade de São Paulo levanta outra importante questão: a do acondicionamento e descarte do lixo doméstico. Foram muitos os comentários aqui no blog sobre esse assunto. Como disse o Francisco, “a imensa maioria dos consumidores reutiliza as sacolas plásticas para acondicionar lixo”.
Maria Inês lembra que “a introdução dos saquinhos se deu como uma cortesia, quando houve a proibição de usar latões de lixo que eram descarregados nos caminhões”.
De fato, antigamente, as pessoas deixavam o lixo em latões nas calçadas e os lixeiros se encarregavam de despejar o conteúdo nos caminhões. Muitos prédios tinham também um duto no corredor de serviço por onde se jogava o lixo, que caía num contêiner comum.
Diante desse novo cenário, o Edson pergunta: “Se tiver que comprar sacolas de lixo, não dará na mesma? Eu sei a resposta, não. Terei que pagar mais, e alguém vai ficar mais rico vendendo sacolas de lixo.”
E o Antônio Carlos levanta uma preocupação muito importante: “Não estamos trocando plástico poluente por plástico poluente? Além da proibição da distribuição das sacolinhas nos mercados, temos que buscar materiais alternativos, que não o plástico, para transportar e acondicionar os dejetos. Até por uma questão de coerência…”.
A Vanessa também traz algumas questões sobre as quais precisamos pensar: “E os substitutos para as sacolinhas de plasticos, será o que? A de papel?? É biodegradavel (molha e vai se desmanchando… Mas para tanto.. materia prima do papel é… Árvores!!) ou mesmos as biodegradaveis plásticas que sobram… o ‘oxibiodegradavel’ ninguem sabe qual o ciclo de vida do catalisador do processo!”
Como disse o Antônio Carlos, precisamos buscar outras alternativas. Obviamente, não podemos voltar ao modelo dos latões. Parte do discurso que defende as sacolas plásticas é de que seu uso facilita o trabalho dos lixeiros. De fato, esse debate precisa levar em conta as condições de trabalho destas pessoas.
O modelo que temos hoje, em que os lixeiros andam pendurados na traseira do caminhão, correndo atrás de sacolas plásticas, me parece completamente arcaico e não oferece condições dignas de trabalho.
Precisamos pensar – e merecemos – um sistema mais sofisticado de acondicionamento, manipulação e coleta do lixo. Um exemplo que conheci em algumas cidades norte-americanas e europeias é um sistema que usa latões de plástico que se encaixam nos caminhões de coleta. O lixeiro não precisa abrir o latão e manipular o lixo, apenas facilitar seu encaixe no caminhão.
Outra forma que eu conheci numa pequena cidade da Europa é muito interessante: as pessoas levam o lixo para um lugar onde há vários compartimentos de aço subterrâneos, tampados. Daí aciona-se um mecanismo que permite a abertura do compartimento para o descarte do lixo, que já deve estar separado. Depois vem o caminhão, que encosta em cima do compartimento e remove todo o seu conteúdo. Obviamente essa solução só funciona em cidades pequenas.
O fato é que existem outros sistemas. Essa discussão precisa ser feita e não se esgota no uso ou não das sacolinhas plásticas nos supermercados e no acondicionamento do lixo doméstico, questão que precisa ser aprofundada. Essa discussão passa, principalmente, por um urgente debate sobre todo o ciclo de armazenamento, coleta e destinação do lixo.
Um dos desafios que está colocado para os nossos governantes nos próximos anos é o saneamento básico. Comparando as regiões metropolitanas do Brasil, as situações com relação a essa questão são bem diferentes. Antes de tudo, precisamos entender que o saneamento apresenta diferentes dimensões: a água tratada, o esgoto coletado e, finalmente, o tratamento do esgoto que é coletado.
Com relação à água tratada, pode-se dizer que estamos chegando perto da universalização em nossas regiões metropolitanas. Em quase todas elas temos percentuais de domicílio com acesso à água tratada acima de 90%. Mas quando falamos de esgoto, esse número diminui.
Claro que há situações melhores que outras, como, por exemplo, as regiões metropolitanas de são Paulo e de Belo Horizonte, que apresentam mais de 80% de domicílios com coleta de esgoto. Mas mesmo o Rio de Janeiro, que é também uma região metropolitana rica, tem esgoto coletado em menos de 70% dos seus domicílios. No Recife, são 30%.
Isso significa que ainda temos muitos domicílios que sequer estão ligados à rede de esgoto. E em situações como a de Belo Horizonte e São Paulo enfrenta-se também um outro tipo de problema, a falta de tratamento de boa parte do esgoto. Dados de 2004 mostram que apenas 63% do esgoto coletado em São Paulo é tratado. Isso significa que o que não é tratado vai parar nos rios e córregos.
Numa perpesctiva mais ampla, é muito interessante pensarmos também na pergunta: quantas casas no Brasil têm tudo? Sendo que “tudo”, aqui, significa água tratada na torneira, esgoto coletado, lixo coletado, luz elétrica, banheiro dentro de casa, ou seja, tudo aquilo que é básico. Não estamos falando nem de tratamento de esgoto e destinação final do lixo, apenas do básico. A resposta é: mais ou menos um terço de todos os domicílios do Brasil.
As diferenças de uma região para outra, neste caso, também são grandes. Em estados como o Distrito Federal, Minas Gerais e São Paulo, os domicílios em situação adequada chegam a 80%. Mas isso nas áreas urbanas. São Paulo, por exemplo, tem quase 85% dos seus domicílios nas áreas urbanas com uma situação adequada, mas nas áreas rurais – onde estão quase 300 mil domicílios – essa proporção cai para 40%.
A situação das moradias no Brasil, portanto, é mais precária no meio rural que no urbano, especialmente em estados com tradição mais escravocrata. O único estado onde a situação dos domicílios no meio rural é melhor que no urbano é Santa Catarina, onde a proporção de domicílios adequados é de 40% e 24%, respectivamente.
Mas é importante esclarecer que esses dados são baseados no senso de 2000 e que, nos últimos anos, entre 2001 e 2008, houve um aumento de investimentos em saneamento de quase 3 mil%. Esses indicadores, portanto, devem melhorar quando tivermos os resultados do próximo senso.
Ainda assim, é absolutamente chocante que em alguns estados, como o Maranhão, por exemplo, apenas 10% dos domicílios tenham situação adequada. Temos números muito parecidos no Pará e também no Mato Grosso, que é um estado bem mais rico.
Podemos concluir, portanto, que a situação dos domicílios no Brasil, do ponto de vista das condições adequadas, ainda deixa muito a desejar. E este continua sendo um dos desafios dos próximos governantes.