Estádios e negócios imobiliarios: já perdi a conta de em que capítulo está essa novela…

Na esteira dos malabarismos dos esquemas engenhosos que estão se armando em torno dos estádios da Copa de 2014, mais uma iniciativa acaba de ser lançada.

Ontem a imprensa anunciou que construtoras pretendem derrubar o estádio do Morumbi para construir um megaempreendimento no local. Em troca, elas fariam um novo estádio para o São Paulo Futebol Clube junto à estação de metrô Vila Sônia da linha amarela.

Os empreendedores já estão tentando articular com o prefeito Gilberto Kassab e com o vice-governador Domingos Afif, que já anunciaram apoio à proposta. Com esses apoios, cria-se um caldo favorável inclusive para pressionar o clube a aceitá-la.

Isso revela a verdadeira face do que são os megaeventos. A Copa de 2014 em si é o que menos conta nessa história toda. A questão fundamental é como os grandes negócios imobiliários se aproveitam dessa onda em torno do megaevento para poder encaçapar a bola…

As construtoras querem inserir esse malabarismo dentro da operação urbana Vila Sônia, que está em discussão há mais de 10 anos e que tinha como intenção estruturar o desenvolvimento urbano da região, preparando-a para os impactos do metrô. Mas cada vez mais ela também vai se transformando em apenas e tão somente abertura de frentes de expansão imobiliária.

A idéia de construir espaços publicos generosos, de qualificar o espaço urbano, expressas no plano diretor vão ficando para as cucuias… o que importa mesmo é quantos metros quadrados de área construída podem ser lançados no tempo mais curto possível.

Enquanto isso, nós continuamos a viver numa cidade entupida, desqualificada e insustentável. E parece que isso nao é problema nem do poder público nem do setor imobiliário.

São Paulo realmente precisa do Itaquerão?

Quando falamos em Copa do Mundo no Brasil, um assunto difícil de abordar é a questão do estádio de São Paulo, que está inclusive ameaçando a participação da cidade no evento. Esse assunto é difícil porque envolve diferentes aspectos que, a meu ver, deveriam ser tratados separadamente: a necessidade de um novo estádio para São Paulo, a falta de um estádio para o time mais popular da capital e o futuro do bairro de Itaquera, na Zona Leste paulistana.

Em primeiro lugar, a cidade de São Paulo precisa construir um novo estádio para a Copa do Mundo? Não. O Morumbi poderia perfeitamente ser reformado para o evento, o que significaria economia de recursos financeiros. As razões da decisão da Fifa de não aceitar a reforma proposta pelo São Paulo, aliás, até hoje não ficaram claras. Aparentemente, há uma necessidade muito maior de gerar gastos de bilhões de reais do que de superar problemas técnicos.

Obviamente, o Morumbi tem problemas, a começar por sua localização. Some-se a isso o difícil acesso ao estádio por transporte público. Mas a implementação de um bom projeto de mobilidade seria um ganho para toda a cidade, não apenas para quem usa o Morumbi, seja em dias de jogos, seja em dias de shows, mas também para os moradores, trabalhadores e frequentadores da região.

A segunda questão é: o Corinthians merece ter o seu próprio estádio? Como clube de futebol mais popular da cidade, paixão e alma paulistana, o Corinthians merece, sim, ter seu estádio. Mas será que o estádio do Corinthians não é o Pacaembu? Além de ser extremamente bem localizado, com fácil acesso por metrô e ônibus, o Pacaembu é também o estádio mais bonito do Brasil em termos de arquitetura e inserção urbana. Uma parceria entre o Corinthians e a prefeitura de São Paulo poderia viabilizar esta solução, mantendo o estádio aberto ao público como deve ser. O Pacaembu merece o Corinthians e o Corinthians merece o Pacaembu.

Por fim, em relação à Itaquera: o bairro merece intervenções urbanísticas que proporcionem melhorias para a região? Claro que sim! Itaquera, um dos centros da Zona Leste, a região mais povoada – e historicamente negligenciada – de São Paulo, carece de investimentos urbanísticos há muito planejados e nunca implementados. Mas, seguramente, um estádio não tem a capacidade de transformação urbanística positiva que se quer vender com a construção do Itaquerão.

Em lugar nenhum do mundo, grandes estádios atraem grande densidade de usos e investimentos em seu entorno. Muito pelo contrário – no mais das vezes, acabam gerando uma zona morta ao seu redor, já que ocupam grandes áreas, exigem grandes espaços de estacionamento e áreas de escape e, assim, bloqueiam a urbanidade. Ou seja, uma intervenção urbanística em Itaquera é bem-vinda, mas não será o Itaquerão que proporcionará as melhorias de que o bairro precisa. Itaquera e a Zona Leste merecem algo muito melhor que um estádio que, após a Copa, se tornará um elefante branco.

Infelizmente, ao se misturar três questões muito distintas, esconde-se o que não se quer dizer e impede-se – pela paixão – de se tomar uma decisão a altura de São Paulo, dos corinthianos e dos moradores da Zona Leste.

Texto originalmente publicado no Yahoo! Colunistas.

Novo estádio do Corinthians para a Copa parece melhor do que Piritubão, mas essa história ainda é nebulosa

Apesar de toda euforia que envolve o anúncio da construção do novo estádio do Corinthians como sede da Copa de 2014, será que esta é mesmo uma decisão definitiva? A questão fundamental é que essa história toda é ainda um tanto nebulosa, não sabemos ao certo por onde passa esse processo decisório sobre os estádios da Copa.

Até agora não ficou claro para ninguém por que o Morumbi não serve. Para mim, pelo menos, não ficou clara até hoje qual é exatamente a crítica em relação ao Morumbi. Se for aquela história de que ele não tem o número de cadeiras exigidas para a abertura da Copa, as intervenções devem ser feitas para que este número seja ampliado.

O novo estádio proposto já não será feito com o número de cadeiras necessário, que são quase 70 mil. Será um estádio de 45 mil cadeiras, então desse ponto de vista ele também não serve. Me parece que por alguma razão a FIFA, junto com a CBF, está pressionando para que se construa um estádio novo. Tentaram um balão de ensaio com Pirituba, não deu certo. Levaram Itaquera.

Não tenho dúvidas de que a localização e a equação de Itaquera – o terreno, que já é do Corinthians, do lado do metrô, numa área que é muito mais adequada do que a de Pirituba – já são bem melhores. E isso aliado às comemorações dos 100 anos do Corinthians aparece bem melhor na fita.

Porém, ainda me parece questionável que São Paulo tenha que ter uma nova arena. Será que o número de estádios da cidade não é suficiente para atender a demanda em relação a esse tipo de equipamento?

Mais estranho ainda é que ninguém viu o tal projeto do estádio e as obras já estavam anunciadas na imprensa este final de semana. Ora, quando foram ver o projeto do Morumbi tentaram encontrar todas as falhas possíveis. Assim ninguém entende mais nada. Como eu já disse, essa história é bastante nebulosa e me parece que ainda vai rolar muita água debaixo dessa ponte.

Sem querer defender a localização do Morumbi, porque todo paulistano sabe que a localização é ruim, que o lugar não é bom para um estádio, que não tem transporte coletivo de massa, mas, em termos de gastos para a cidade, será que não vale mais a pena termos nossos estádios e arenas muito bem cuidadas e continuar com elas?

Ou seja, embora a construção do novo estádio esteja sendo lançada como a solução definitiva, permanece a pergunta: quem vai ganhar com essa construção?

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O anúncio de que o Morumbi está fora da Copa de 2014 parece um grande jogo de pressões

O anúncio de que o estádio do Morumbi está fora da Copa de 2014 deve ser compreendido no âmbito de um grande jogo de pressões que envolve a FIFA, a CBF, a Federação Paulista de Futebol e um conjunto de interesses articulados em torno desses órgãos que, basicamente, são interesses relacionados a negócios da Copa.  Então acredito que estejamos assistindo a um enorme jogo de pressões.

Com relação aos projetos de mobilidade para São Paulo, a linha de metrô que levará até o Morumbi, passando pelo Butantã e pela região da Vila Sônia, já está desenhada e planejada há mais de 10 anos. Então ela não tem absolutamente nada a ver com a Copa do Mundo e já está licitada e em obras. Existe até uma operação urbana na Vila Sônia por conta desta linha.

O máximo que pode acontecer é que ela não seja acelerada em função do mundial. Mas não existe a menor chance de que esta linha seja interrompida para que se invente outra que leve até a região de Pirituba por conta da Copa. Até porque não dá nem tempo de construir novas linhas de metrô até 2014. Então, como eu falei, uma coisa não tem nada que ver com a outra. Isso faz parte desse jogo de pressões.

Agora, de novo, a pergunta mais correta a ser feita neste momento é: a cidade de São Paulo e sua região metropolitana ganharão mais com uma nova arena na região noroeste, em Pirituba, ou reformando e transformando um dos seus vários estádios? Existem pelo menos quatro estádios na cidade que são usados e que podem ser reformados para atingir a qualidade necessária. Para mim, não resta a menor dúvida de que construir uma nova arena em Pirituba será construir um elefante branco. Isso está longe de ser uma prioridade na cidade de São Paulo. Não me parece fazer sentido.

Para esclarecer, esta região de Pirituba é um vale bastante íngreme, que tem entre seus proprietários a Cia City, uma das loteadoras dos bairros-jardins, e como se trata de uma das últimas grandes áreas ainda vazias numa região que está em expansão, a cidade precisa discutir muito bem qual será o uso desse lugar do ponto de vista de suas necessidades e não das necessidades dos negócios articulados por FIFA/CBF e Federação Paulista de Futebol em torno da Copa.

É preciso esclarecer também que não se trata exatamente de uma área degradada. Originalmente, esse lugar era uma zona industrial que ficou pouco utilizada por conta da dificuldade de acesso às rodovias. Mas isso mudou com o Rodoanel e agora essa região de Pirituba é uma frente de expansão da cidade que acabou ganhando nova importância estratégica. Entretanto ela é muito pouco conectada com o transporte coletivo de massa e não há perspectiva de que isso seja resolvido no curto prazo.

Portanto, não me parece que a construção de uma nova arena seja o melhor destino e a melhor forma de ocupar essa área. Também não acredito que isso vá transformar e melhorar a qualidade de vida de quem já está lá e oferecer também ótimas condições para quem, eventualmente, possa ir morar lá.

Por outro lado, o estádio do Morumbi e a reforma apresentada atende totalmente ao caderno de encargos da FIFA. Isso de dizer que a proposta não atende aos critérios exigidos está me parecendo um jogo político mesmo. Acho que a questão toda da situação do Morumbi tem a ver com o valor total da obra, com o que está sendo demandado como obra para além do que o caderno de encargos da FIFA já determina.

Em qualquer circunstância, me parece muito difícil construir um estádio totalmente do zero. E me parece – isso a gente já viu acontecer no PAN, na própria história da FIFA e nesse tipo de articulação em torno do futebol no seu período mais recente – que, no fundo, a questão é quem vai estar disposto a pagar o preço que está sendo cobrado para que o projeto seja viabilizado.

Mais sobre os projetos de mobilidade de São Paulo, Rio e Brasília para a Copa de 2014

Na semana passada falei sobre a aprovação de alguns dos projetos das cidades brasileiras para a Copa do Mundo de 2014. Hoje vou falar especificamente de São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília.

No caso específico de Brasília e São Paulo, os projetos de mobilidade para a Copa de 2014 foram apresentados à Caixa Econômica Federal para serem financiados com recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). O Rio de Janeiro, por sua vez, está apresentando um projeto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

No caso do Rio, falou-se muito, foram muitas as promessas de melhoria de mobilidade para a Copa, mas, realisticamente, e isso é positivo, o que de fato vai acontecer até lá é a implementação de corredores de ônibus, que estão sendo chamados de BRT – Bus Rapid Transit. Serão alguns corredores exclusivos e rápidos e o mais importante deles será o T5, que ligará o aeroporto Tom Jobim à Barra. Este investimento custará R$ 1 bilhão. Já aquela ideia de metrô para a Barra ainda é absolutamente nebolusa. De concreto, o que existe é o corredor de ônibus.

No caso de Brasília, a proposta apresentada foi a do chamado VLT – Veículo Leve sobre Trilhos. Não sei qual é exatamente a tecnologia que será usada em Brasília, mas várias cidades estão usando uma tecnologia que está sendo produzida em fábricas aqui mesmo no Brasil, no Estado de São Paulo e no Nordeste. O VLT parece um bonde e a ideia é que ele seja confortável e de alta performance. O que vem sendo usado no Brasil é uma espécie de ônibus que corre sobre trilhos. Em Brasília, o VLT fará a ligação do aeroporto ao final da Asa Sul, onde já existe uma estação de metrô que faz a ligação do centro de Brasília com Taguatinga. Então o VLT será um complemento do metrô.

Já em São Paulo, bateu-se o martelo na proposta de um monotrilho que fará a ligação do aeroporto de Congonhas com a linha norte-sul do metrô, na região do Jabaquara, que terá articulação com o estádio do Morumbi. Este projeto já está sendo desenvolvido e custa em torno de R$ 1bilhão. O monotrilho é um trenzinho de superfície e esta mesma opção foi adotada também na cidade de Manaus. O projeto de São Paulo inclui também a perimetral, que deverá melhorar a saída de automóveis e ônibus do estádio do Morumbi em direção à região central.

Ainda sobre o monotrilho, há uma discussão importante sobre o impacto que ele causará, já que se trata de uma espécie de minhocão de trem, um pouco mais estreito, mas de qualquer maneira uma interferência grande em uma região bastante adensada como é a que liga o aeroporto com o Morumbi.

A prioridade para a Copa de 2014 é melhorar o transporte público

A discussão sobre a realização dos jogos da Copa do Mundo de 2014 no estádio do Morumbi continua. Esta polêmica em torno do estádio não é uma questão apenas para o futebol, mas para toda a cidade. E é só eu falar neste assunto que me chegam muitos comentários e mensagens de ouvintes. Gostaria de falar sobre duas dessas mensagens que recebi.

O Luiz Antônio de Jesus diz que todo o erro na preparação para a Copa é focar no evento e não pensar o planejamento da cidade, como se outras experiências não tivessem existido. Ele é contra a construção de um novo estádio, acha que a reforma no Morumbi pode servir e é contra inclusive a desapropriação de áreas para criar estacionamentos, já que estes só seriam usados para a Copa. Ele acha ainda que seria possível usar um esquema próprio, como foi feito na França, com o Stade de France.

O Sérgio Gollnick acha que o importante é pensar como trabalhar essa questão no âmbito do planejamento da cidade. Ele cita o exemplo da Copa da Alemanha, que construiu um estádio novo, o Allianz Arena, em Munique. Aliás, a construção foi feita pela iniciativa privada, que investiu 340 milhões de euros. O estádio fica a 3 km do aeroporto, fora do centro, e fez parte da estratégia de mudar o sistema de transporte coletivo da cidade. Em função desse projeto, houve um grande investimento no sistema de transporte coletivo de massa. Então o que o Sérgio coloca é que, qualquer uma das hipóteses, reformar ou fazer outro estádio, deveria levar em consideração as necessidades da cidade.

Neste sentido, penso que há coisas mais urgentes hoje em São Paulo que precisam ser feitas. E não se trata simplesmente daquela conversa de quem é o terreno ou de quem vai ganhar ou não, que parece ser a conversa por trás disso tudo.

Eu não sou são paulina, nem tenho nada a ver com o estádio do Morumbi, mas tenho noção do que é prioridade para São Paulo. E a prioridade zero hoje é transporte coletivo de massa. Uma melhor ligação com o Morumbi, portanto, já facilitaria muito a vida dos paulistanos. Então acho que não se trata de uma questão de ser são paulino ou corinthiano, mas de bom senso e de foco nas necessidades da cidade de São Paulo.