As cascas de banana do censo

Na semana passada, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou os dados do nosso último censo, realizado em 2010. Em primeiro lugar, é preciso destacar a importância do censo para a elaboração de políticas públicas e a seriedade e profissionalismo com que o IBGE conduz este trabalho.

Para além disso, é preciso atenção e cuidado com a leitura do censo, a fim de evitar mitos e falácias em torno da interpretação dos seus dados. Por exemplo, a ideia de que o ciclo de grande concentração metropolitana tenha se esgotado e de que hoje são as cidades médias que lideram o crescimento do país não é verdadeira, já que entre as cidades médias que mais crescem estão justamente aquelas que compõem a periferia das regiões metropolitanas.

Uma notícia do Observatório das Metrópoles traz essa questão, promovendo uma leitura mais aprofundada dos dados e mostrando que a população continua ainda muito concentrada nas metrópoles, hoje ainda mais que dez anos atrás. A população das regiões metropolitanas representava 34,9% do total em 1991; 36%, em 2000; e hoje, 36,2%.

Portanto, a concentração da população nas metrópoles continua firme (assim como seu desgoverno), ainda que algumas regiões metropolitanas, como a de São Paulo, Rio, Porto Alegre e Recife tenham diminuído sua participação na população total do país. Uma leitura apressada dos dados por encobrir essa realidade.

Outro aspecto que necessita de uma leitura mais atenta é a proporção entre população urbana e rural. De acordo com os dados divulgados pelo IBGE, 84,4% da população brasileira seria urbana. Mas o Instituto considera como urbano as sedes municipais e ainda tudo que cada município define em lei como perímetro urbano.

O pesquisador José Eli da Veiga, da Universidade de Campinas, tem levantado esta questão: como definir como “urbana” a população de um município de mil habitantes, com características eminentemente rurais?

Me parece muito discutível classificar como população urbana moradores de cidades com, por exemplo, 5 ou 10 mil habitantes, apenas porque essa população reside na área demarcada como perímetro urbano do município.

O fato é que quase um terço da população brasileira vive em cidades muito pequenas, com escassa urbanidade. Ao não diferenciar estas realidades sócio-territoriais, corremos o risco de desenhar políticas urbanas que têm como referência as médias e grandes cidades, ignorando as especificidades deste universo composto de milhares de municípios, que concentram um terço da população do país.

Tsunamis, seca e inundações: quem sofre e quem paga pelos desastres?

Um pesquisador da McGill University, do Canadá, elaborou um interessante mapa (abaixo) sobre os impactos das mudanças climáticas no globo. Como era de se esperar, Jason Samson concluiu em seu estudo que as populações mais afetadas serão as dos países menos responsáveis por causar o problema.

Trata-se de países localizados, em geral, no hemisfério sul e nas regiões mais quentes do planeta, que concentram também as nações menos ricas e desenvolvidas.

Em 2009, apresentei à Assembleia Geral da ONU um relatório sobre mudanças climáticas e direito à moradia. Entre outros aspectos, o relatório mostra que países do sul da Ásia, um dos lugares de maior densidade populacional do planeta, serão muito afetados.

A África, que sofre sobretudo os efeitos da desertificação e de inundações, também aparece com força neste mapa.

Isso me levar a pensar, por exemplo, que se um país como o Japão, que é rico, organizado, estruturado e conta,  historicamente, com um melhor preparo para enfrentar desastres, está passando por tantas dificuldades, imaginem os efeitos de um desastre em países com menos recursos e estrutura e que têm também uma grande concentração demográfica, como parte significativa das nações que serão afetadas.

Provavelmente, um desastre como o que aconteceu no Japão teria consequencias mais trágicas se tivesse ocorrido em algum desses países.

O que dizem os números sobre São Paulo em comparação com outras cidades do mundo?

No dia do aniversário de São Paulo, resolvi buscar dados comparativos entre a nossa cidade e outras grandes metrópoles do mundo, aquelas que têm dimensão parecida em termos de população. A cidade de Tóquio, por exemplo, se levarmos em conta a sua região metropolitana, que tem 36 milhões de habitantes, ela é maior que a de São Paulo, que tem pouco mais de 20 milhões, e mesmo assim parece que a cidade japonesa funciona muito melhor que a nossa. Ou mesmo Nova York, cuja região metropolitana tem a mesma população que a de São Paulo.

Esses números me fazem pensar – para além da discussão de políticas publicas, da capacidade de implementação dessas políticas, dos recursos nas mãos das prefeituras e dos governos – sobre as diferenças entre essas cidades. Será que tem a ver com a época em que surgiu cada uma? Na verdade, não. São Paulo nasceu em 1554, uma data parecida com a de Tóquio, que não tem nem cem anos a mais que São Paulo. Nova York é mais nova, de 1624. Já a cidade do México é mais antiga, se a pensarmos a partir da ocupação asteca de 1300. Ou seja, não é uma coisa tão significativa essa antiguidade.

Mas uma coisa é a idade da cidade, outra coisa é quando que a cidade explodiu em termos populacionais. Porque isso, sim, é muito relevante. Sabemos que São Paulo teve um crescimento muito intenso e acelerado em dois momentos importantes, um entre o final do século XIX e o começo do XX, com a migração estrangeira; outro nos anos 1950, 1960, com o processo migratório interno do Brasil. Será que as outras grandes cidades do mundo também tiveram grandes picos de crescimento populacional? Sim.

Londres e Nova York, por exemplo, também sofreram um crescimento muito intenso e acelerado no final do século XIX e depois continuaram crescendo, mas num ritmo bem mais lento. Naquele momento da explosão demográfica, essas cidades também tiveram condições urbanísticas muito precárias e precisaram enfrentar esse problema. O nosso último pico de crescimento acelerado já aconteceu há uns 30 anos, ou seja, há uma luz no fim do túnel.

Uma curiosidade que eu encontrei enquanto buscava esses dados tem a ver com a densidade populacional, ou seja, o número de habitantes por quilômetro quadrado. A densidade de São Paulo é de 7.247 hab/km². Você acha que São Paulo é densa? O número parece grande, mas corresponde à metade da densidade de Tóquio, a um pouco menos da metade da densidade de Nova York e a um terço da densidade de Bombaim ou de Dehli, que tem 30.438 hab/km2. Aliás, as grandes cidades asiáticas, em geral, são muito mais densas que a cidade de São Paulo.

De acordo com os cálculos, São Paulo é a quinta ou sexta maior cidade do mundo. Se considerarmos a região metropolitana, ela é a quinta, atrás de Tóquio, Nova York, Cidade do México e Bombaim. Se considerarmos só a cidade, que tem 11 milhões de habitantes, ela é a sexta. As cinco primeiras, com exceção de Istambul, são todas asiáticas. Para quem acha São Paulo tão grande, estamos vendo que é possível, sim, ser ainda maior.

E um último elemento que eu pensei foi a composição social da cidade. São Paulo é uma cidade bastante desigual, com uma diferença socioeconômica muito grande entre que tem mais renda e que tem menos. Essa diferença é expressa através de um índice que se chama Gini. Quanto maior esse índice, maior a desigualdade. O de São Paulo é 0.6, muito parecido com o da Cidade do México. E o menor entre essas grandes cidades é o de Londres, 0.4. Enfim, no aniversário de São Paulo, acho que esses números são muito significativos para pensarmos o que queremos para a nossa cidade.