Tragédias na Serra do Mar podem ser evitadas?

Ocupação cautelosa, sistemas de alerta e gerenciamento de emergências e planejamento urbano que inclua reserva de áreas para moradia popular em zonas fora de risco podem minimizar consequências de eventos extremos

Os desabamentos na frágil encosta da Serra do Mar fazem parte de uma história que se repete todos os meses de janeiro. É possível minimizar as tragédias, mexendo o mínimo possível nas encostas e afastando a ocupação humana do sopé e da cumeeira dos morros.

No caso de Ilha Grande, a encosta estava intacta, com cobertura vegetal original. A pousada ruiu porque estava excessivamente no sopé. Aqueles que trabalham com áreas de risco recomendam que as construções não ocupem uma faixa de dez metros no sopé e de cinco metros na cumeeira.

As regras de uso e ocupação do solo são definidas pelos planos diretores e leis locais de uso e ocupação do solo, que teoricamente deveriam incorporar determinações da legislação ambiental, como criar Áreas de Preservação Permanentes (APPs) em torno dos rios, praias e nascentes.

O Código Florestal chega a impedir que cumes e áreas com declividades acima de 40% sejam ocupadas. Mas há cidades em Minas Gerais e no Litoral que simplesmente não têm áreas com declividades menores do que esta. Isso implica aprofundar a análise dos dados geotécnicos a partir das especificidades locais, em busca de critérios que indiquem potenciais de ocupação e perigos para cada região específica.

A raiz do problema

Quando ocorrem estas tragédias, sempre se ouve a pergunta: “Por que deixaram ocupar?”. O governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, atribuiu a “décadas de populismo”. Esta afirmação, infelizmente, não toca na raiz do problema, que é: “Por que tantas pessoas no Sudeste moram em áreas de risco”?

No caso do litoral, quem conhece a situação da orla assistiu ao filme: as áreas planas, fora do mangue e da restinga e longe da encosta, foram reservadas para o mercado imobiliário de média e alta renda, e os mais pobres “sobraram”. Quem está no morro hoje na Rio-Santos ou é o caiçara que vendeu sua posse para os loteamentos e condomínios ou são os pedreiros, caseiros, jardineiros e etc. que movem este litoral e simplesmente não têm onde morar.

Infelizmente, senhor governador Sérgio Cabral, já que não é possível fazer desaparecer a população do mapa, ou o planejamento urbano incorpora no centro de sua agenda a disponibilização de terra para a produção de moradia para a maioria da população, ou veremos a repetição das tragédias.

Finalmente, algumas situações como a inundação de São Luiz do Paraitinga nada têm a ver com a ocupação de encostas e áreas de risco. O que pode ser feito, nesses casos, é melhorar muito nossa capacidade de gerenciar riscos e implementar sistemas de alerta para que, mesmo diante de eventos extremos – como inundações, escorregamentos, tufões e etc. – os sistemas de alarme e retirada urgente possam ser acionados e evitem mortes, que é o principal!