Sim, queremos um parque na Augusta. Mas a desapropriação é a melhor solução?

Vista de terreno com área verde na rua Augusta (Foto: Estadão Conteúdo)

Vista de terreno com área verde na rua Augusta (Foto: Estadão Conteúdo)

No próximo domingo vence um decreto municipal de 2008 que declara de utilidade pública um terreno de cerca de 25 mil m², localizado na Rua Augusta, entre a Caio Prado e a Marquês de Paranaguá. A área tem vegetação de Mata Atlântica nativa tombada pela prefeitura, e que, portanto, não pode ser removida. De um lado, os proprietários querem vender o terreno para incorporadoras que desejam construir torres residenciais e comerciais; de outro, moradores e frequentadores da região reivindicam que este terreno seja transformado em parque público, sem torres. Se optasse por desapropriar a área, a prefeitura teria que pagar, no mínimo, R$ 55 milhões, valor avaliado do imóvel em 2009. Trata-se de um embate entre o desejo da população de destinar este terreno para um parque público e a lógica do uso mais rentável do terreno, do ponto de vista econômico.

Situações deste tipo não acontecem apenas em São Paulo. Em Bangkok, na Tailândia, milhares de pessoas reivindicam que um terreno abandonado de 80 hectares, com um lago e áreas verdes, no centro da cidade, seja transformado em parque e museu. Na área, conhecida como “Makkasan”, os proprietários querem construir grandes edifícios comerciais e hotéis. A campanha “Makkasan Hope” já reuniu mais de 20 mil assinaturas pedindo a intervenção do Estado na questão. Recentemente vimos também como uma situação semelhante em Istambul, na Turquia, foi o estopim para uma grande mobilização que tomou conta do país e repercutiu em todo o mundo. Neste caso, os manifestantes eram contra a transformação de uma das últimas praças e áreas livres da cidade em shopping center.

Não há dúvidas de que a região da Bela Vista, já superadensada, com poucas áreas verdes, e muito importante do ponto de vista sociocultural, merece um parque. Além disso, é de fato bastante discutível a construção de novas torres ali. Mas a prefeitura tem razão quando diz que pagar milhões ao proprietário para viabilizar este parque não tem sentido neste momento frente a outras prioridades urgentes de gasto na cidade. Será que a desapropriação é a única saída, colocando a conta no bolso de toda a população? Certamente não.

É importante lembrar que, ainda que sejam patrimônio de seus proprietários, os imóveis têm uma função social que diz respeito ao conjunto da sociedade. Portanto, precisamos urgentemente definir qual é a função social de cada um dos espaços da cidade. Se o critério for apenas o uso mais rentável do ponto de vista econômico, nunca São Paulo terá parques, áreas culturais preservadas e habitação social, por exemplo, em áreas consolidadas da cidade. Outros instrumentos urbanísticos podem e devem ser usados em casos como este. O momento dessa discussão é agora, já que o plano diretor – que define justamente a função social dos imóveis da cidade – está passando por um processo de revisão. Os instrumentos urbanísticos que podem eventualmente intervir em situações como estas devem ser estabelecidos no plano diretor. Fiquemos atentos, pois na próxima segunda-feira a prefeitura apresentará a proposta de revisão do plano.

Texto originalmente publicado no Yahoo!Blogs.

17 comentários sobre “Sim, queremos um parque na Augusta. Mas a desapropriação é a melhor solução?

    • E se os vizinhos desta área -certamente em gentrificação- pagamos pelo terreno com contribuição de melhoria e garantimos que o ultimo terreno da região vire o parque que tanto precisamos?
      Certo que a cidade tem outras prioridades com o orçamento, mas certo é também que podemos contribuir para garantir o Parque Augusta.
      É a nossa ultima oportunidade!

  1. Eu tinha visto isto no Estatuto da Cidade e achei bem interessante, e nunca entendi como pode ser aplicado:
    DIREITO DE PREEMPÇÃO (ARTS. 25 A 27 do Estatuto da Cidade)
    O direito de preempção regulamentado nos artigos 25 a 27 do Estatuto da Cidade, visa a conferir ao Poder Público municipal preferência para adquirir imóvel urbano objeto de alienação onerosa entre particulares. Esta preferência é aplicável nas lienações de imóveis urbanos que, em razão da política urbana estabelecida nos municípios, sejam consideradas necessárias para atender as funções sociais da cidade, como a de criação de espaços públicos de lazer e áreas verdes.

    • vejo que vcesat bem informada pela lei, mas eu li que o local é um patrimônio tombado, como pode então haver a construção de torres? o proprietário poderia vender, mas quem comprasse não poderia usar para torres, certo? ou a lei de tombamento não esta vigorando nesta área?

  2. Segundo matéria recente de Diego Zanchetta no Estadão, Haddad deixou claro que a criação do Parque Augusta não é uma prioridade da atual gestão… “se tivesse os R$ 100 milhões necessários para desapropriar o terreno, usaria essa verba para fazer mais creches”. Está certo!
    Na mesma matéria, é dito que no projeto das incorporadoras previsto para o terreno, “haverá uma ligação do empreendimento com a Praça Roosevelt por meio de um bulevar na Rua Gravataí…. O projeto também prevê que 82% do espaço será de acesso público e que 10 mil metros quadrados de mata serão preservados e restaurados, para dar origem a um parque a ser administrado com verba privada”.
    Partindo disso, porque almejar a totalidade desse terreno contra uma indenização milionária com verbas públicas? Não será o caso de ficarmos contentes com os 82% da área, incluindo o arvoredo secular?
    Importante é saber se esse parque privado realmente se destina ao usufruto público, pois, do contrário, nem pensar!
    Quanto as duas torres para os 18% restantes da área, como pretendem as incorporadoras Setin e Cyrela (segundo a mesma matéria), está claro que fazem parte do entorno breve, se lembrarmos das 3 torres já em construção no terreno do antigo C’adoro demolido, sem contar com as outras tantas em vários pontos da Augusta, também em construção.
    O problema não estará somente na mudança da paisagem física e social da região (gentrificação na certa!), mas também ao rés-do-chão, com a pilha de carros a mais nas ruas das adjacências, bem como na própria Augusta, um fiapo de asfalto já completamente travado.
    O ideal seria prolongar essa questão por mais uns dois séculos, ficando o terreno blz para usufruirmos tal como está, sem frescuras de parque “urbanizado”, pois este é também um outro ponto importante, já que por parque “urbanizado” ou “reurbanizado” acabamos por engolir tragédias de arquitetos medíocres como o que aconteceu com a recente obra da Praça Roosevelt.
    Para quem vive defronte ao terreno, o barato (em todos os sentidos dessa palavra) é o aqui e agora: banhos de sol, caminhadas sob o arvoredo, convivência com a cachorrada e as crianças que afluem para ali diariamente naquela atmosfera de roça que tanto nos falta nessa cidade.
    Arnaldo de Melo

    • A questão é não nos iludirmos só isso…. tenho citado o fato de que em passado recente, tivemos uma outra luta nesse sentido aqui na Bl Vista. Deu até origem a uma tese do MP. Uma longa luta…. e o resultado vc pode ver. Eu chamo de bunker! o Condominio Vereda….. ruas Martiniano de Carvalho, Pio XII, Arthur Prado. Por ora oremos! O que nos resta é um milagre.

    • Não, não é o caso. A região está com cerca de 40 empreendimentos imobiliários. Não precisamos de mais NENHUM, mas sim de 100% de área verde no espaço, Não queremos um quintal de luxo, administrado por uma construtora q só visa o lucro (como todas as demais). Além de q não é verdade – através da imagem do projeto da Setin) q haverá 80% de mata. A ocupação da construtora mostra uma ocupação de 50% do espaço. Árvores MORRERÃO em função da construção, mata Atlântica NATIVA, raízes terão q ser cortadas o q as levará à morte; pássaros serão afugentados; trânsito já caótico na Rua Caio Prado será inviabilizado de vez, bem como na Rua Augusta.
      Não se trata da ‘cachorrada’ ou de quem do entorno frequenta o espaço, mas sim, de preservação da VIDA para a cidade como um todo. A cada área verde destruída, menos vida, saúde física e mental teremos. Como diz a matéria, há outros métodos de desapropriar a área, q não a transferência do potencial construtivo e outorga onerosa, pois o $ arrecadado NÃO irá pro Parque, mas prum fundo global da cidade. Uma empresa privada NÃO se interessa pela vida, mas sim por seu próprio bolso!
      Eliane Langer

  3. Sim, mas o que acontece com o terreno? Permitiremos que seja vendido para as torres ao custo da derrubada das árvores e da inviabilização do único parque possível na região?

  4. Não entendi qual seria sua sugestão, o estado retirar das mãos dos donos sem pagar nada? Ou pagar o que acha justo de acordo com o que tem em caixa? Será que mesmo com as características do projeto (preservação, 82% de área pública) , já que a prefeitura não tem dinheiro, não vale a pena? Tudo que mete iniciativa privada no meio não vale a pena pra você? São só questionamentos.

  5. Esqueçam toda a discussão urbanística-sócio-cultural-ambiental-e-cívica! Não há condição física para mais torres residenciais/comerciais no local! Pelo menos não em uma cidade com mentalidade “carrófila” como São Paulo. A cidade segue piorando sempre e os donos da grana querem que se danem todos. Acham que dá para fazer fortuna e depois se mudar para Miami e deixar para trás a terra arrasada. Parque não é luxo, é prioridade também.

  6. Acho que o mais correto seria a prefeitura adquirir o terreno trocando por títulos de CEPAC para o proprietário poder construir o mesmo volume permitido em outro local, de valor semelhante.

  7. Que seja então um parque privado por um tempo pre-definido, em que nele, os empreendedores possam preservar a mata e instalar restaurantes, ou lanchonetes, e explorar comercialmente a entrada no lugar, até que passe a ser um dia aparelho público do município.

    A prefeitura, que diz estar quebrada (será) não desembolsa nada, isenta por esse tempo o recolhimento do imposto, os donos recebem dinheiro desse empreendedor e mesmo o munícipe que não tendo dinheiro pra usufruir dele entrado ali, consiga se beneficiar do oxigênio por ele produzido (as aves continuaram a entrar no local gratuitamente 🙂 )

    Até que um dia ele seja um bem público de todos e passe a ser administrado e conservado pela prefeitura.

    Essa seria uma solução para tentar conciliar os interesses do dono do terreno, de um investidor qualquer interessado na exploração/locação do espaço, a prefeitura e finalmente o cidadão de São Paulo que não quer ver o terreno transformado em torres horrorosas e de impacto ambiental e no trânsito da região.

    • O cara possui um terreno que sozinho vale R$ 150 milhões. Fora a possibilidade dele construir duas torres somando-se a isto a publicidade que todos os protestos pró-augusta gerarão para ele. Isto tudo junto possibilitará a ele faturar algumas centenas de milhões de reais.

      Você acha mesmo que ele vai preferir trocar isto (ao menos em sã consciencia) pela “ótima” oportunidade de vender coxinha, pastel e cachorro-quente no parque?!

      Até eu que sou mais burro não faria isto na posição dele.

      A prefeitura está com problema na orçamento sim. As informações são públicas. Tudo isto graças aos precatórios da época do Celso Pitta, que fez um contrato estupido para o município e já transferiu para fora do município nos ultimos 10 anos mais de R$ 20 bilhões de reais em JUROS acima da Selic (ou seja, juros desnecessários). Pra você ter uma idéia com este dinheiro dava pra comprar 130 parques augustas pela cidade.

      Bom, agora o Haddad apelou ao STJ e está querendo conseguir uma renegociação destes precatórios. E também esta tentando fazer a aplicação do IPTU de modo progressivo (quer dizer quem tem pouco paga pouco, quem tem muito paga muito, quanto mais tem mais paga. Conforme é aplicado nos paises Nórdicos. Preciso explicar pq muita gente pensa que progressivo significa que aumenta todo dia até chegar ao infinito).

      Bom, a questão é simples. O município precisa conseguir orçamento, e muito orçamento pois a prioridade para o Haddad (na minha opinião) vai ser os pobres da zona leste e os sem tetos. O que também não acho necessariamente ruim. Esse pessoal também tem o seus direitos. Se ele não gastar primeiro a grana com esta galera, ele vai enfrentar muitos problemas de protestos e com razão. Depois de apaziguar esta galera, ele pode começar a gastar dinheiro com parque etc.

      Essa é a minha visão pessimista-realista.

      Mas apesar disso eu acredito que tem que continuar havendo o movimento pró-parque. Porque como a gente já sabe: Quem não chora não mama.

      Eu sou morador da zona norte, mas frequento muito a região central da cidade a lazer. E adoraria muito ver o parque se tornando uma realidade.

      Sinceramente estou pouco me fudendo para o dono. Estes filhos da p**** já roubaram muito toda a população via os conchavos que eles fizeram com o governo na ultima década. E este período já acabou. Eles vaõ se ferrar daqui pra frente.

      Espero que o parque saia, e seja um negócio que não seja muito bom pra eles (por um preço justo e baixo).

      Valeu!

  8. Nunca entrei nessa propriedade, mas amo passar na Marquês de Paranaguá e ficar olhando de fora. Sonho com um especialista que vai fazer um inventário das espécies e estágio e constatar que existe um conjunto a ser preservado … a Lei da Mata Atlântica pode ter dispositivos para proteção deste conjunto.
    Agora, qualquer coisa que o novo dono quiser construir terá que licenciar na prefeitura, que tipo de projeto pode funcionar ali e com quais compensações?

  9. Primeiro passo: conhecer o terreno, passear sob o arvoredo, sacar o potencial de tudo aquilo. Tem muita gente palpitando sem sequer pisar lá. O projeto das torres, bem como outros já aventados (torres + supermercado) NÃO estão sendo propostos com a derrubada da mata, mas para a parte onde há muito existe um estacionamento (colada à Rua Augusta, cf. foto acima, iniciando este post da Raquel). Reitero que já é consenso que o dono do terreno só poderá construir neste pedaço em que está o estacionamento, sendo o restante (a maior parte, que inclui o arvoredo) preservado e disponibilizado como parque público por ele a ser mantido, o que já é uma baita contrapartida e não custaria indenização. Porém, o movimento pró-parque quer TUDO (toda a área) e isso custa nada menos que 100 milhões! Daí que a resposta do Haddad é afirmativa no sentido de que, com esse montante, ele subsidia creches, por exemplo, sendo isso uma demanda crucial nos arredores, há décadas sem solução. Outra coisa, repetindo o que já disse, é que o parque está lá e o pessoal do estacionamento não proíbe a entrada. Dá para ter acesso ao arvoredo pela entrada do estacionamento (esquina da Augusta com a Caio Prado) ou por um portão defronte ao DP, na Marquês de Paranaguá. Entre os carros parados tem ainda uma porção de gramado onde é possível tomar banho de sol, correr com a criançada ou com a cachorrada. Alguns moradores de rua ajudam a preservar o local, na maior simpatia e respeito aos usuários. É um tipo de deleite que o paulistano capeta não enxerga, pois só quer parque “urbanizado”, com lanchonete e porcarias afins, além de estacionamento. Enquanto a sanha pelo terreno todo persiste, os proprietários defendem seu patrimônio com toda razão e podem, se quiserem, trancar as porteiras. Enfim, o parque já existe, para quem de fato gosta de árvores, caminhadas, cooper e atividades de baixo impacto ambiental, sem histeria ou aquela quebração que se dá na Roosevelt.

Deixar mensagem para Flavio Vilabs Cancelar resposta