Quanto mais altos os muros e grades, mais proteção, certo? Errado!

Primeiro grades e portões cercaram prédios e casas, e guaritas foram instaladas nos limites entre os edifícios e as ruas. Depois, muros altos passaram a cercar não apenas quadras inteiras, mas, às vezes, várias delas, fechando pedaços de cidade com exclusividade para seus moradores e visitantes. O modelo — identificado principalmente com a ideia de segurança contra a violência das ruas — acabou se disseminando tanto que virou norma obrigatória em algumas cidades e até em alguns programas habitacionais.

O pressuposto de que quanto mais muros e grades são colocados, mais segurança existe alimentou, durante mais de duas décadas, a transformação dos modos de morar. A ideia, que parece óbvia, é a de que, ocultando o máximo possível o que se passa intramuros, evita-se a invasão e o roubo. Entretanto, a mais nova onda de furtos e roubos, pelo menos na cidade de São Paulo, contraria esta ideia. Já são 20 os condomínios de luxo, muradíssimos, que sofreram arrastões apenas este ano na capital paulista.

O último caso ocorreu esta semana no bairro do Itaim-Bibi e foi noticiado pelo “Estadão”. O porteiro do condomínio contou à reportagem que os bandidos entraram pelos fundos, escalando um muro de 4 metros de altura. De acordo com a Delegacia de Investigação de Crimes Patrimoniais, a cada mês são registrados, em média, dois arrastões em condomínios de luxo em São Paulo.

Recentemente, a “Folha de S. Paulo” divulgou dados de uma pesquisa realizada pela Polícia Militar do Paraná que revela que 60% das casas assaltadas em Curitiba são cercadas por muros. Apenas 15% são “abertas” para a rua. Além disso, a pesquisa colheu depoimentos de detentos com participação em assaltos. Dos entrevistados, 71% afirmaram que casas com muros são preferíveis para a realização de assaltos e 54% disseram que os muros ocultam a ação.

O fato é que transformar a lógica do modo de morar e de organizar a cidade não resolve o problema da violência nas ruas. As estratégias de furtos, roubos e assaltos também se adaptam. Uma das técnicas que vem sendo utilizadas por criminosos hoje, por exemplo, é clonar ou roubar controles remotos de portões automáticos, o que lhes permite entrar e sair de residências tranquilamente, sem alarde e, ironicamente, “protegidos” por muros.

Moral da história: os muros fragmentaram cidades, destruíram a relação dos edifícios com o espaço público, empobreceram a paisagem e, como estamos vendo, não resolveram o problema da segurança. Pra que servem então?

Texto originalmente publicado no Yahoo!Blogs.

34 comentários sobre “Quanto mais altos os muros e grades, mais proteção, certo? Errado!

  1. É claro que é uma questão mais psicológica do que outra coisa… mas gostaria de ver em termos, os números de condomínios fechados (de apartamentos e de casas) contra os números daquelas “vilas” e contra números de casas direto na rua, enfim… proporcionalmente e em números absolutos. Seria interessante, para ver se a coisa realmente dá na mesma ou até aumenta a possibilidade de alguém entrar…

    • Caro Gabriel,Boa Tarde! veja que a facilidade de o criminoso permanecer com segurança dentro de um espaço que supostamente seria para manté-lo salvo.Na realidade deixa a sensão de que sua função seja;cuidar e presevar o bem estar de todos;senhores,crianças,mulheres,adultos,animais,senhoras e mulheres grávida primeiro.Ou então seria muito egoísta de sua parte se ao menos não dizes Bom Dia ao teu vizinho.

  2. Tempos atrás saiu uma reportagem em um desses jornais (ou revistas) de grande circulação mostrando que as casas menos assaltadas em bairros residenciais como Alto de Pinheiros e Jardins eram também as menos “protegidas”. No caso, as com muros mais baixos, que não perdiam completamente a relação visual com a rua. Uma amiga minha que mora em Alto de Pinheiros reforça esse dado. A casa dela é a única com grades baixas na rua inteira e uma das únicas que nunca foram assaltadas. Pode ser pura coincidência, ou não.
    Um fato recente que tem me chamado a atenção é o novo “layout” das agências do Bradesco. Ele segue essa lógica de visibilidade e transparência total, sem nada a esconder. Como disse a Raquel, a violência se adapta às circunstâncias, mas sem tantas barreiras visuais, pelo menos o ganho de uma cidade mais agradável nós temos.

  3. O processo de fragmentação do espaço urbano muito esta ligado ao modelo de relação pessoal que tem se estabelecido desde o fim do sec. XX. Se antes as pessoas tinham convívio e relações pessoais com quem estava próximo fisicamente, hoje as relações se estabelecem muito mais por interesses e afinidades, que por proximidade física. Infelizmente é um processo irreversível, a simples eliminação dos “muros” não resolverá os problemas, é necessário repensar o espaço urbano com base nesse novo modo de vida contemporâneo. (Ainda assim os muros não devem permanecer)

    • Victor, na asia, na europa, nos estados unidos, e variso lugares da america latina, não existem os muros tão altos, as cercas eletricas, os porteiros 2hs … os arrastões. O problema não é o modelo urbano em si, nem a fragmentação, o problema é a violencia. seja ela real, seja ela percebida, seja ela vendida pela TV, seja ela um habito … mas mais que a violencia acho que o verdadeiro problema seja a pobreza e a miseria. se não concerta isso, não adianta. Abs

  4. O PIB de Sampa e a violência.

    Faz alguns dias que com minha esposa Juliana fizemos esta conta rápida. Sabemos que São Paulo tem cerca de 8.000 prédios. Hipnotizamos que em média 6 pessoas (5 porteiros) trabalhem todos os dias dentro de um
    prédio. Custo mensal (salários) cerca de 10-12mil.

    8.000×10.000R$=80.000.000R$/mês, seja 960.000.000R$/ano. Quase um bilião só de salários dos porteiros. Depois tem, câmeras, cercas elétricas, portões, carros blindados, vidros escuros, muros mais altos, instalações, manutenção… Isso só nos prédios. Depois teria que considerar as casas, a segurança particular, as vilas, os demais policiais, as demais delegacias, os seguros, as armas …

    Achamos certo que no final vamos chegar mais ou menos a um valor de 4 Biliões de Reais. Seja 1-2% do PIB da cidade.

    Sabe porque voltaram as sacolas de plastico logo depois a proibição? Porque os clientes, não tendo as sacolas disponíveis, compravam certo, seja menos…A grande distribuição ficou puta.

    Será que tem uma verdadeira vontade politica e econômica de parar com a violência ? sei lá ..

    • 4 bilhoes que poderiam ser investidos em creches e pre-escolas e que tirariam das ruas e dos trafico especialmente do craque, muitos futuros bandidos. Solucao par o futuro esta em policiamento efiente. Boas escolas e creches paras criancas nao virarem bandidos enquanto aos pais trabalham, pagar mais impostos para fazer a divisao social de bens mais igualitaria. Gerar empregos dignos para todos os jovens entrando na idade adulta e educacao de qualidade para todos. Sem estas coisitas basicas nenhum muro vai resolver o problema.

      • concordo totalmente vanise, a minha era obviamente uma provocação, pois acho que tem uns interesses, e/ou pouca vontade, em não empenhar-se a resolver o problema da violência. pois isso implicaria escolhas pouco populares e com resultados que provavelmente só chegariam no médio prazo. como europeu o que me deixa triste desta sociedade é o classismo, o elitismo, a separação e em consequência a miséria de muita parte da população. os muros são feitos para não mexer com o “povo”, para ficar longe dele e para se afastar da realidade … assim como uma certa burguesia paulistana que não quer os metrôs perto aos próprios bairros. o que falta é um verdadeiro líder politico com uma visão, com um sonho, que saiba osar .. mas já fiquei fora do assunto.

  5. O nosso estilo de sociedade é simplesmente suicida. Uma sociedade que promove o oposto do que qualquer sociedade precisa para sobreviver – convivência, troca, reconhecimento do outro – só pode trilhar o caminho da autoanulação.

  6. Pingback: Quanto mais altos os muros e grades, mais proteção, certo? Errado! (via Blog da Raquel Rolnik) | Beto Bertagna a 24 quadros

  7. Professora, sempre tive vontade de fazer um mestrado com essa idéia, pois em no DF até as favelas são implantadas com muros. As janelas são os olhos da rua, nas cidades antigas onde haviam janelas diretamente na rua, a criminalidade era menor.

    • Fernanda, recomendo que vc pesquise sobre o livro “A Prevenção do Crime Através do Desenho Urbano” (2007) do Cel PMPR Roberson Luiz Bondaruk. Eu o utilizei como referencia para alguns trabalhos em um curso de Desenho Ambiental e Arquitetura da Paisagem

    • Cara Fernanda, se conseguir dê uma olhada na minha tese de mestrado sobre este assunto que defendi em 1997 na UNIVAP ( São José dos Campos) e que se chama “Estudo Analítico e Fenomenológico dos Loteamentos Fechados na cidade de São José dos Campos”. Pode ser uma boa contribuição para sua pesquisa. O tema é pertinente, atual e necessário de ser visto/revisto. Sucesso!

  8. Muito bom. Nos anos 80 ainda viamos muitas grades , apos 2000 com o novo plano diretor e a reduçao do coef de aproveit as incorporadoras compraram areas maiores quase quadras inteiras para poder atingir um volume de vendas que pagasse o custo do terreno e mantivesse a margem de lucro, e entao no lugar de casas com grade veio ocondominio clube, grandes torres, muitas , e em volta um muro, sempre grudado na divisa com a rua. o gradil foi embora, as pessoas do condominio ganharam privacidade e quem esta na rua “que se f…” Lamentavel, nossa perspectiva urbana agora é esta, nos podemos sentir prisioneiros na paisagem urbana, nosssa liberdade esta atras de um muro em um lugar chamado condominio onde vc pode viver em liberdade em magestosos 5000 m2. Acho q sera dificil a mudança cultural do muro, mas no minimo a prefeitura deveria exigir uma porcentagemge gradil c visual e recuos para muros cedendo uma parte do lote para compartilhar com pedestres ou mesmo quem transita c veiculos de locomoçao. Nesse aspecto acho o plano diretor falho e acrescente se a.isso q no Brasil urbanismo e uma palavra utopica e totalmente desconhecida pelas autoridades, fazemos projetos em terrenos e nao para a cidade. Dura realidade!

  9. Falta integração entre os vizinhos e falta segurança pública. Basta escalar o muro e a bandidagem trabalha sossegadamente dentro do imóvel atacado – já que ninguem vê nada da rua: ocultando o máximo possível o que se passa intramuros é negativo certamente.

  10. Este tema é abordado de forma bastante interessante no livro “A Prevenção do Crime Através do Desenho Urbano” (2007) do Cel PMPR Roberson Luiz Bondaruk. Nunca tive oportunidade de assistir nenhuma de suas palestras mas ao menos tive a oportunidade de estudar seu livro após ler uma reportagem em que Roberto Bondaruk apresentou alguns de seus temas na revista da Folha a muitos anos atrás (acredito que seja à essa reportagem que o Paulo Takimoto se referia.

    A questao da apropriaçao do espaço publico pela comunidade e a reaproximaçao dos cidadao sao 2 pontos citados como potenciais redutores da violência. Vale a pena dedicar algum tempo pesquisando sobre as conclusoes do cel Roberto…

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  12. Uma observação bem simples: uma casa com muros altos funciona para os dois lados, ninguém vê o que há dentro e vice-versa, o ladrão se sente mais a vontade na aproximação, além de ocultar a ação dentro do imóvel, evitando que um vizinho por exemplo perceba a movimentação suspeita. Além de ser um bloqueador de visão na hora em que o morador sai da casa, pois facilita uma emboscada, o que seria dificultado se fosse usado uma grade pro exemplo.
    Estou em BH agora, onde muros altos se espalhame pela cidade e poluem a visão terrivelmante, além de serem farto material de apoio para pixadores. Quando cheguei de Curitiba foi um dos elemetos que mais me chamou a anteção. Já não gostava de muros pela estética e também porque já partilhava da informação acima.
    Uma cidade onde podemos ver os im]oveis é muito melhor em todos os sentidos.

  13. Morei 50 anos na cidade de São Paulo e sempre achei que muros altos fossem apenas resíduo da velha ordem escravocrata racista como os quartos de empregada dos apartamentos para classe média. Agora vivo em Aracaju com índices de violência suecos para um paulistano. Aqui também proliferam muros altos e condomínios fechados. Vanise você foi no ponto: democracia sem populismo, educação, distribuição de renda, aumento de impostos, combate a criminalidade (especialmente à corrupção) enfim civilização.

  14. Ah se a gente pudesse voltar no tempo…das carroças , dos vizinhos trocando favores, das cartas longas e chorosas,do telefone que levávamos seis horas para fazer a conexão São Paulo e outra cidade,além de gritar tanto para ser ouvido que a vizinhança toda sabia do que se tratava a conversa,enfim, não adianta lamentar muros ou qualquer outra opção de gente que está desesperada porque o poder público não resolve investir na única solução para nosso problema: EDUCAÇÃO, de primeiro mundo, isso sim como antigamente…quando a USP foi pensada.

  15. Na minha rua, que é sem saída e tem aproximadamente 15 casas, 2 das pouquíssimas casas que não foram assaltadas nestes 20 anos que moro aqui não têm muros ou grades na frente… “coincidência ou não…” E elas têm uma relação muito melhor com a rua… com os jardins… com a cidade!

  16. Tambem acho certo vivermos sem muros nao servem pra nada mesmo apenas pra gasta dinheiro atoa exemplos as casas dos estados unidos sao lindas se nos fizessemos as casas plantasem gramas na frente da casa e como dinheiro do muro dava pra investir mas ainda na casa e nao teria geitos dos ladroes entrarem pq se eles entrasem o vizinho ligaria pra policia e pegava ele alem de ficar um lugar pra correr vento e lugares bonitos e nao tampariao a paisagem ainda preservaria a natureza.

  17. Moro a 22 anos na mesma casa e me sinto muito mais seguro com um muro de 2,5 altura, principalmente quandos os vagabundos passam pela ruas não tem ideia do que esta passando em minha casa, e se mesmo o meu carro esta com vidro aberto ou não, alem privacidade que é excelente, fica muito mais dificil para eles saberem se tem ou não alguem, porem é claro que quando eles querem te robar por até saber de algo , não ha prevenção que resolva. pois até delegacia eles invadem.

  18. Raquel Rolnik está “plageando” Humberto Gessinger???? Em 1991, Gessinger escreveu e cantou: “(…) Nas grandes cidades de um país tão violento / Os muros e as grades nos protegem de quase tudo / Mas o quase tudo quase sempre é quase nada / E nada nos protege de uma vida sem sentido (…)”

  19. A solução não está em construir muros altos e casas que mais parecem um cofre, distribuir renda, acabar com a corrupção, educação decente, emprego e salário dignos, diminuem significativamente a criminalidade e a violência contra o semelhante. Justiça social é questão, não adianta trancar-se a sete chaves, é preciso trabalhar e investir na prevenção para depois não chorar o leite derramado

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