50 Anos de Brasília: as particularidades da questão fundiária da capital federal brasileira

Brasília tem algumas particularidades com relação à questão fundiária. Para construir a capital federal, foi feito um decreto, de utilidade pública, para a desapropriação de uma área correspondente a um retângulo de 5.800 km2. Ou seja, em 1955 toda essa área, que era de fazendas e sítios, foi desapropriada. Já naquela época, quando se foi pesquisar a cadeia dominial daquelas propriedades, descobriu-se que muitas delas eram terras devolutas e que muita gente não tinha documentação. Começou então o imbróglio fundiário de Brasília.

Para se ter uma ideia, em 1996 foi feito um levantamento que mostrou que apenas metade da área do Distrito Federal tinha sido completamente desapropriada e estava realmente de posse do governo federal. Ainda havia muita coisa em processo de desapropriação e esse imbróglio permanece até hoje. Somado a isso, nós temos um fenômeno em Brasília que é muito diferente do resto do Brasil. Lá, a maior parte dos assentamentos irregulares, ilegais, é de classe média. São condomínios residenciais que foram surgindo em áreas de preservação ambiental, que não haviam sido definidas como área para ocupação. E hoje há uma pressão muito grande em Brasília para regularizar esses condomínios.

Existem hoje mais de 500 ocupações irregulares em Brasília, incluindo esses condomínios de classe média e também assentamentos populares de baixa renda. E há mais uma questão: como o acesso à terra sempre foi controlado pelo governo, este foi um grande fator de constituição de bases políticas em Brasília. O ex-governador Joaquim Roriz, por exemplo, foi um dos campeões da montagem desse processo de distribuição de lotes para famílias de baixa renda nas cidades satélites que foram criadas. E muito da confusão que se vê hoje em Brasília em torno de processos de corrupção tem a ver com a questão da terra, da grilagem, de acessos preferenciais por parte de certos grupos econômicos.

É possível resumir esta questão em três grandes linhas: primeiro, a distribuição de lotes foi, historicamente, uma grande forma de constituir bases políticas desde que o eleitor de Brasília passou a escolher diretamente seu governador e sua câmara legislativa; segundo, grandes fortunas e grandes grupos econômicos se constituíram a partir do acesso a terras públicas para fazer empreendimentos imobiliários. Neste caso, duas pessoas, o ex-governador Paulo Otávio e o ex-senador Luís Estêvão, estiveram envolvidos nesse processo. E, finalmente, há muitos condomínios irregulares que são promovidos por políticos em Brasília, que intermedeiam toda política de regularização fundiária da cidade.

Um comentário sobre “50 Anos de Brasília: as particularidades da questão fundiária da capital federal brasileira

  1. Parece que temos um enlace histórico com a questão de má distribuição de terras que, mesmo após séculos de colonização portuguesa, não deixa de ser uma realidade intrínseca ao brasileiro.

    Brasília, que foi construída muito tempo depois da conquista da Independência – quando já devíamos ter aprendido a lição – mostra o quão atrasados ainda estamos em relação à distribuição de qualquer coisa.

    Abs,
    Tiago

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