Medida Provisória sobre preparação dos municípios para os desastres naturais chega em boa hora e precisa ser debatida

Na semana passada, o governo federal editou a Medida Provisória 547, com o objetivo de melhorar a preparação das cidades brasileiras para enfrentar desastres naturais. O texto ainda será debatido no congresso nacional antes de virar Lei. Em primeiro lugar, é importante destacar que é bastante oportuna a edição dessa MP.

De forma geral, o que a MP propõe para resolver o problema dos desastres naturais é o óbvio: planejamento urbano. O texto traz elementos importantes para aumentar a capacidade das cidades de prevenir e responder aos desastres, mas alguns pontos merecem ser aperfeiçoados no Congresso. A MP institui a criação de um cadastro nacional de municípios com áreas de risco e torna obrigatório para os municípios cadastrados a realização de mapas de risco, planos de contingência e utilização de carta geotécnica para aprovação de loteamentos. Além disso, loteamentos aprovados em áreas de maior vulnerabilidade deverão seguir normas específicas.

A novidade mais interessante, que vai além da questão do risco, é que os municípios serão obrigados a desenvolver um plano de expansão toda vez que ampliarem o seu perímetro urbano, criando uma nova zona urbana ou de expansão urbana. Nenhum loteamento poderá ser aprovado nesse novo perímetro enquanto não houver esse plano. Além de identificar as áreas de risco, esse plano precisa identificar também as áreas que devem ser protegidas do ponto de vista do patrimônio ambiental e cultural, definir todas as diretrizes e demarcar as áreas que serão utilizadas para a instalação de infraestrutura, sistema viário, equipamentos públicos etc. O plano precisa também prever zonas de habitação de interesse social nessas áreas.

Essa prática de planejar a expansão urbana nunca existiu em nosso país. Os loteamentos foram sendo aprovados sempre no caso a caso, quando o proprietário da gleba decidia loteá-la. Trata-se de um instrumento largamente utilizado em cidades europeias há várias décadas e, mais recentemente, também na Colômbia. Embora esse ponto da lei seja bem importante e positivo, da maneira como está deixa brechas para que se façam empreendimentos em forma de condomínios, sem parcelamento e, portanto, sem estar sujeito a estas regras.

Um dos pontos problemáticos dessa MP é a questão das remoções de comunidades localizadas em áreas de risco. Esse ponto precisa ser muito melhor desenvolvido. Da maneira como a questão está formulada, o direito à moradia das pessoas atingidas não está devidamente protegido. O debate no congresso será uma oportunidade para pensar sobre essa questão e desenvolver normas mais claras para os processos de remoção, já que hoje os procedimentos são os mais variados, cada município faz do seu jeito e, no mais das vezes, há grandes violações de direitos.

Outro problema da MP está no artigo 3º, que não tem relação com o resto do texto. O artigo modifica a Lei 6.766, de 1979, acrescentando um artigo que se refere ao registro de lotes de interesse social. Só que a MP não fala em identificação obrigatória de áreas de interesse social nos loteamentos. Me parece que esse ponto foi excluído do texto original da MP e que esqueceram de retirar o artigo 3º. Ainda bem.

A proposta importante que parece ter sido excluída é a obrigatoriedade de que em todo parcelamento do solo haja um percentual de lotes destinados a habitação de interesse social. Isso acontece em muitos países e é muito importante que o Brasil também avance nessa questão. Na França, por exemplo, o percentual de obrigatoriedade de áreas de interesse social em todo e qualquer novo desenvolvimento urbano é de 20%; na Inglaterra é de 30%. Na Holanda, no Canadá e na Colômbia também há percentuais obrigatórios de áreas de interesse social. Não só nos loteamentos, como também em empreendimentos.

Como eu já disse antes, a edição dessa MP é oportuna e o debate sobre o enfrentamento de desastres naturais por parte das cidades é necessário. É importante agora que o debate avance no congresso nacional e que os pontos fracos do texto possam ser melhorados. Além disso, é necessário também que esse debate envolva diversos segmentos, como o setor imobiliário, as organizações de defesa ambiental, de defesa de direitos humanos, os movimentos de moradia, e, especialmente, os municípios, já que são eles que ficarão encarregados de aplicar as novas medidas. Senão corre-se o risco de aprovar uma lei que simplesmente não será colocada em prática.

Nova Medida Provisória introduz algumas mudanças no programa Minha Casa Minha Vida

As modificações propostas pela Medida Provisória Nº 514, de 1º de dezembro, não mexem na lógica, na estrutura básica e no funcionamento do programa Minha Casa Minha Vida.

As alterações incluem: a possibilidade de utilização de térreos comerciais para viabilizar  o pagamento do condomínio dos edifícios, quando se tratar, no âmbito do programa, de requalificação de imóveis em áreas centrais; prioridade de atendimento a famílias chefiadas por mulheres; a possibilidade de utilizar terrenos em processo de desapropriação, além de várias modificações em relação à aplicação do instrumento “demarcação urbanística” na regularização fundiária.

Essas mudanças, no entanto, parecem não incidir ainda sobre a questão da disponibilidade de terra urbanizada e bem localizada para produção de moradia nas cidades, o que tem sido, reconhecidamente, um dos principais gargalos e limites do programa.

Veja o texto da MP.
Veja o texto da Lei do MCMV ( Nº11.197) com as alterações propostas na MP.

Medidas especiais para a Copa de 2014 em benefício de quem?

Duas notícias sobre a preparação para a Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016 me chamaram a atenção esta semana. Uma é da Folha Online, sobre a aprovação no Senado de duas medidas provisórias que visam facilitar a realização dos jogos. Uma delas prevê isenção fiscal na importação de materiais – para a construção e reforma dos estádios – e também de insumos – medalhas, troféus, suprimentos médicos, alimentos etc – que serão utilizados durante os jogos. A segunda medida autoriza a elevação do teto de endividamento das cidades-sedes.

A segunda notícia, publicada no portal do Governo Federal, trata da realização, esta semana, em Brasília, do 2º Encontro Técnico de Segurança Pública para a Copa 2014. Segundo a reportagem, o foco do governo é trabalhar na integração das forças de segurança pública e em como fazê-las trabalhar de forma articulada em todas as cidades-sede.

Estas notícias mostram que medidas especiais estão sendo pensadas e colocadas em prática para viabilizar a realização desses megaeventos esportivos no Brasil. Entretanto, não temos visto ainda o mesmo tratamento especial em relação, por exemplo, às comunidades que serão (ou que já estão sendo) atingidas pelas obras. Na verdade, nenhuma medida, especial ou não, vem sendo tomada neste sentido e, com isso, milhares de famílias estão ameaçadas de despejo sem nenhum diálogo e sem garantia de que terão respeitado o seu direito à moradia.

O que temos visto até agora é a ausência de uma agenda socioambiental positiva e a falta de respeito a direitos já conquistados. Portanto, é extramemente preocupante que tais formas de encaminhamento da gestão permitam o descumprimento de regras já estabelecidas e sirvam apenas para viabilizar os negócios em torno da Copa sem considerar a implementação de um plano social includente.

Preocupadas com o processo de organização dos jogos e suas consequências do ponto de vista social, diversas organizações da sociedade civil vêm realizando debates para discutir o tema. Neste fim de semana, por exemplo, a REME (Rede Megaeventos Esportivos) promove na sede do CREA no Rio de Janeiro o seminário “O desafio popular aos megaeventos esportivos”. Para mais informações, clique aqui.